Por uma medalha de ouro, atletas das Olimpíadas se endividam
Esportistas acumulam empregos e dívidas para financiar seu sonho de ocupar o topo do pódio
Na próxima semana, em Paris, Anita Alvarez vai mergulhar e se contorcer na piscina como parte da equipe de natação artística dos EUA. O que juízes e espectadores não verão são as acrobacias necessárias para manter suas finanças à tona no caminho para as Olimpíadas.
A remuneração mensal de US$ 2 mil da atleta de 27 anos, paga pelo Comitê Olímpico e Paralímpico dos EUA, não é suficiente para cobrir as despesas de moradia em Los Angeles, onde ela treina das 06h00 às 15h00, seis dias por semana.
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Ela sustentou sua carreira olímpica de uma década realizando rotinas para casamentos e videoclipes, treinando equipes juvenis e trabalhando em uma loja de artigos esportivos. Ela disse que ganhou cerca de US$ 10 mil fazendo acrobacias subaquáticas no filme de 2022 “Pantera Negra: Wakanda para Sempre”.
“Há momentos em que me sinto pressionada, o que não é bom quando você está treinando no mais alto nível”, disse Alvarez. Segundo ela, a pressão financeira vale a pena se seu objetivo é chegar às Olimpíadas.
Os milionários jogadores de basquete da equipe dos EUA e os ímãs de contratos, como a ginasta Simone Biles, são as exceções. Para chegar ao auge de seu esporte, os atletas olímpicos fazem sacrifícios financeiros, pausam carreiras e precisam garantir o sustento aliado a seus horários de treinamento. Alguns acumulam grandes dívidas.
Um relatório encomendado pelo Congresso e divulgado em março identificou barreiras financeiras significativas para os aspirantes olímpicos. Em uma pesquisa com cerca de mil atletas americanos que se preparavam para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos, 26,5% relataram renda individual abaixo de US$ 15 mil por ano.
“Alguns de nossos competidores mais talentosos dormem no carro ou não têm comida suficiente nem seguro de saúde adequado”, escreveu a Comissão sobre o Estado das Olimpíadas e Paraolimpíadas.
Conto de advertência
A vitória “milagrosa” de Rulon Gardner na luta greco-romana pela medalha de ouro em 2000 fez dele uma lenda olímpica. Ele é uma presença constante nas montagens de TV durante os Jogos e deu autógrafos em uma comemoração da candidatura bem-sucedida de Salt Lake City para sediar as Olimpíadas de 2034 na semana passada.
Para outros atletas, ele é uma advertência. Gardner contraiu uma dívida de US$ 70 mil enquanto treinava e não planejou seu futuro financeiro após o esporte.
“Coloquei despesas de viagens e de treinamentos em cartões de crédito”, contou. “Na hora, você não pensa nisso, mas está indo para o tudo ou nada.”
Sua medalha de ouro veio com um prêmio de US$ 30 mil e ganhos com palestras e patrocínios, o suficiente para saldar suas dívidas. Mas Gardner, que lutou na categoria 130 quilos, disse ser um peso-mosca no quesito alfabetização financeira. Perdeu centenas de milhares de dólares em investimentos imobiliários ruins e em um empreendimento fracassado de academia, e entrou com pedido de falência em 2012.
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O homem de 52 anos, que mora em Utah, treinava wrestling no ensino médio e dirigia empilhadeiras. Hoje, vende seguros e imóveis e disse que está financeiramente estável.
“As pessoas me reconhecem como um atleta olímpico, e eu fico tipo, ‘Sim, mas quero ser seu agente de seguros’”, disse ele.
Matemática da medalha
O relatório deste ano sobre atletas americanos de elite mostrou que eles eram, em média, mais pobres por terem competido, com um custo líquido de cerca de US$ 12 mil por ano depois de contabilizar viagens, taxas de inscrição e outras despesas.
“Uma das coisas em que muitos esportistas são realmente bons é compartimentalizar, e isso pode ser muito útil quando você tem que atuar como atleta enquanto também lida com dificuldades financeiras”, disse Han Xiao, copresidente da comissão.
Xiao fez parte da equipe americana de tênis de mesa de 2004 a 2008. Ele e seus pais pagaram a maior parte de seus custos de treinamento e competições. Ele se aposentou dos jogos internacionais após a faculdade, em parte porque não via um futuro financeiro nisso. Agora, trabalha como engenheiro de software.
Vencer compensa. O Comitê Olímpico e Paralímpico dos EUA, ou USOPC na sigla em inglês, paga US$ 37.500 por uma medalha de ouro, US$ 22.500 pela prata e US$ 15 mil pelo bronze.
O USOPC e os órgãos governamentais nacionais de esportes individuais também oferecem bolsas e seguro de saúde aos atletas. Em geral, porém, apenas os mais bem classificados são elegíveis. Muitos pagam as despesas de treinamento e competição do próprio bolso. O USOPC garante quase US$ 2,5 milhões em financiamento anual para custos como educação, treinamento e viagens.
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Michelle Atherley, que compete no heptatlo, treinou seis dias por semana nos últimos três anos. Ela costumava pagar despesas em equipamentos, viagens e especialistas médicos, e acumulou cerca de US$ 12 mil em dívidas de cartão de crédito.
No salto em altura, estava a três centímetros de uma viagem para as Olimpíadas de Paris.
Atherley disse que os ganhos de “uma boa competição” podem acabar com uma boa parte de sua dívida. “Parece que estou apostando minha vida, mas é assim que funciona”, disse ela.
A jovem de 28 anos afirma continuar comprometida com seu esporte. Ela está em vias de ganhar US$ 20 mil este ano com prêmios e treinando alunos do ensino médio no atletismo, passeando com cães e fazendo bicos de babá.
Cerca de 71% dos atletas olímpicos, paralímpicos e aspirantes relataram ter um emprego remunerado fora do esporte em uma pesquisa de 2024 da Global Athlete, grupo de defesa focado no bem-estar dos atletas.
Financiando o sonho
O campeão paralímpico de tênis de mesa Ian Seidenfeld, de 23 anos, trabalha das 09h00 às 17h00 como especialista em ETF no escritório da Allianz em Minneapolis. Depois, é hora dos exercícios e do tênis de mesa até as 22h00.
Seidenfeld, o atual medalhista de ouro, tem apoio financeiro — cerca de US$ 20 mil por ano pagos pelo USOPC e pela equipe americana de tênis de mesa. Seu salário na Allianz, que também é patrocinadora olímpica, é de cerca de US$ 80 mil anuais. Além disso, empresa de serviços financeiros lhe deu licença remunerada para competir em Paris.
Formado em finanças pela Universidade de Minnesota, ele disse que nunca pensou em adiar sua carreira para treinar em tempo integral. Além disso, sua mãe o encorajou a conseguir um emprego.
“Quero construir um futuro melhor para minhas finanças com investimentos mais sólidos do que apostar no meu corpo”, disse Seidenfeld.
A velocista medalhista de ouro Lauryn Williams, que se tornou planejadora financeira depois de se aposentar das competições, trabalhou com dezenas de atletas da equipe dos EUA. Ela disse que cerca de 20% de seus clientes contraíram dívidas.
O crowdfunding também é popular. Nos últimos dois anos, aspirantes a atletas olímpicos arrecadaram mais de US$ 2 milhões na plataforma GoFundMe. Cerca de US$ 300 mil desse total foram para os competidores olímpicos americanos.
As consequências
Dan Walsh ganhou uma medalha de bronze em 2008 como integrante da equipe de remo de oito homens dos EUA. Durante o treinamento, trabalhava no departamento de gramado e jardim em uma unidade da rede de lojas Home Depot, e até tarde da noite como segurança de hotel. Não foi suficiente para cobrir despesas como aluguel, contas médicas e mantimentos para manter sua dieta de dez mil calorias.
Ele treinou com a equipe nacional antes das Olimpíadas de 2012, mas não fez parte da escalação final.
“Quando deixei a seleção, estava dormindo em um colchão de ar furado e tinha dezenas de milhares de dólares em dívidas de cartão de crédito”, contou ele.
Walsh, agora gerente de vendas do escritório de Connecticut da Hudson Boat Works, disse que está torcendo pelos remadores da equipe dos EUA em Paris. E tem seu próprio motivo para comemorar agora. Mais de uma década após o término de sua carreira atlética, ele terminou de pagar sua dívida de US$ 60 mil em junho.
Escreva para Joe Pinsker em [email protected] e Callum Borchers em [email protected]
traduzido do inglês por investnews