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TikTokers reinventam a forma como os jovens americanos consomem notícias sobre política

A audiência de alguns deles no TikTok supera a de grandes veículos de comunicação

Por NATE RATTNER The wall street Journal
Publicado em
7 min
traduzido do inglês por investnews

“É oficial”, declarou a reportagem no TikTok. “O presidente Biden postou uma carta no X dizendo que não concorrerá à reeleição.”

Apesar do tom noticioso, a figura diante das câmeras não era repórter da CNN, nem da Fox News, nem de uma TV regional. Vitus “V” Spehar é uma TikToker cuja conta, @underthedesknews, tem mais de três milhões de seguidores, superando os principais meios de comunicação, como MSNBC, New York Times e Wall Street Journal.

Spehar faz parte de um grupo de influenciadores de notícias políticas que se conectam com grandes audiências em plataformas como o TikTok, tendo um papel significativo na mudança do modo com que os americanos recebem suas notícias.

Entre as 200 contas do TikTok com foco político com as postagens mais virais criadas em junho e julho — aquelas com 25 mil ou mais visualizações —, um quinto era de influenciadores de notícias, de acordo com uma análise conduzida pelo WSJ dos dados da empresa de pesquisa de redes sociais CredoIQ.

As contas foram responsávfeis por quase três mil vídeos que viralizaram, gerando mais de 700 milhões de visualizações em um ciclo noticioso que incluiu o primeiro debate presidencial, a tentativa de assassinato do ex-presidente Donald Trump e a saída de Biden da disputa. 

Embora as postagens de contas da mídia tradicional de maior destaque ainda tenham um alcance geral mais amplo, com mais de 1,2 bilhão de visualizações, elas foram menos frequentes e tiveram menos vídeos que viralizaram do que o grupo de influenciadores de notícias, segundo a análise do WSJ. 

Os influenciadores ampliaram seu papel no cenário político. Pela primeira vez, ao lado da mídia tradicional, participaram da Convenção Nacional Democrata deste ano. Já a campanha de Trump recebeu criadores em um hotel perto de onde se daria o debate Harris-Trump do mês passado, onde eles puderam assistir e postar sobre o evento, de acordo com um funcionário da campanha.

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Esses influenciadores trazem novas perspectivas e envolvem o público mais jovem com notícias de uma forma que os meios de comunicação tradicionais muitas vezes não conseguem igualar, dizem os pesquisadores de mídia e desinformação. Mas sua ascensão levanta questões sobre como se adequam à ética e aos padrões jornalísticos. E isso também ocorre em um momento no qual a confiança americana na mídia de massa está em um nível baixo recorde, de acordo com o Gallup.

“Ao contrário de uma redação jornalística onde muitas histórias são frequentemente verificadas uma, duas ou três vezes por editores e outros para garantir que sejam comprovadas e precisas, o mesmo não é necessariamente verdadeiro com os influenciadores de notícias políticas”, disse Josephine Lukito, professora de jornalismo da Universidade do Texas em Austin que estuda comunicação política. 

A informalidade e a ruptura com a tradição estão entre as chaves para a crescente proeminência dos influenciadores de notícias. As pessoas querem “alguém com quem se identificam e em quem confiam” para interpretar e selecionar suas notícias, disse Laura Manley, diretora executiva do Centro Shorenstein de Mídia, Política e Políticas Públicas da Escola Kennedy de Harvard.

Spehar, do “@underthedesknews”, não disse nada sobre a ausência de um processo jornalístico ou de orçamento, comuns na grande mídia, o que torna seu trabalho inerentemente menos ético. 

“Busco todos os dias conquistar repetidamente a confiança do meu público”, disse ela. “Há momentos em que a história muda e eu acabo errando, e serei honesta sobre isso.”

Nenhum criador focado em notícias apareceu com tanta frequência nos últimos meses quanto Harry Sisson, mostram os dados do CredoIQ. O veterano da Universidade de Nova York, de 22 anos, teve mais de cem milhões de visualizações de posts virais em junho e julho por meio do que chama de “uma mistura de notícias e defesa de Kamala Harris e do Partido Democrata”.

O vídeo de julho no qual ele relata a saída de Biden da disputa, a quem chamou de “presidente fantástico”, tem 1,3 milhão de visualizações — mais do que os vídeos da CBS News, MSNBC e C-Span no TikTok abordando o mesmo tópico.

“Muitas pessoas se informam pelas redes sociais”, afirmou Sisson, que disse agregar notícias para seus mais de um milhão de seguidores de várias fontes, incluindo o New York Times e o Washington Post. “Se eu puder ser uma fonte confiável aos olhos das pessoas, quero ter esse papel.”

Joey Contino, de 33 anos, que mora em Nova Jersey e administra uma conta focada em política e na guerra Rússia-Ucrânia, diz que seus seguidores são atraídos por sua abordagem despojada e informal às notícias.

“Quando se trata da mídia convencional, entendo que ela tem uma certa maneira de fazer sua transmissão, na frente das luzes e das telas”, disse Contino. “Acho que estamos querendo ouvir coisas vindas de seu melhor amigo, mais do que da TV.”

Ele raramente dá sua opinião, afirmou, apenas diz que a Ucrânia deve ser apoiada em sua guerra contra a Rússia. As 240 postagens virais de Contino em meados deste ano atraíram mais de 35 milhões de visualizações.

“Faço o que posso para tentar permanecer imparcial, especialmente quando se trata da política dos EUA”, disse ele. “Se tenho minha própria opinião sobre o assunto, vou dá-la no final.”

A análise do WSJ incluiu as 200 contas com as postagens políticas que mais viralizaram, excluindo as inativas ou em outra língua que não o inglês. O WSJ categorizou as contas como influenciadores de notícias, veículos tradicionais ou outros, como políticos e comediantes, com base em critérios elaborados junto com vários pesquisadores de mídia.

Como um todo, os feeds dos influenciadores têm propensão de se inclinar para o lado progressista ou para o conservador, descobriu o WSJ, e 80% deles foram classificados como tendenciosos pelo CredoIQ. As contas da mídia tradicional, por outro lado, eram mais politicamente independentes, de acordo com o CredoIQ, que atribui tendências partidárias com base nas opiniões expressas pelos criadores e nos tópicos que estes cobrem.

Alguns repórteres e âncoras da mídia tradicional têm suas próprias contas individuais do TikTok, que podem ampliar o alcance do conteúdo de seus empregadores e até, como mostram os dados do CredoIQ, superar as contas principais. 

As motivações dos criadores de notícias variam. Alguns disseram que fazem isso como um projeto pelo qual são apaixonados, ou por razões ideológicas, e ganham pouco ou nenhum dinheiro com esse trabalho. Sisson contou que ganha uma quantia “significativa” com o TikTok. Spehar apresenta um podcast com a empresa de mídia Betches Media e dá palestras.

Alguns criadores se veem como concorrentes diretos das principais organizações de notícias. Outros disseram que não seriam capazes de fornecer informações e compartilhar suas ideias sem que as redações publicassem as histórias primeiro. 

“A mídia tradicional tem muito a aprender com os influenciadores de notícias, mas os influenciadores de notícias também têm muito a aprender com a mídia tradicional”, disse Samuel Woolley, pesquisador de desinformação e professor da Universidade de Pittsburgh. “Um público exigente deve estar ciente de que nenhum dos dois pode atender a todas suas necessidades quando se trata de informação.” 

Escreva para Nate Rattner em [email protected]

traduzido do inglês por investnews