O mercado financeiro proporciona diversas oportunidades aos investidores, mas existem muitas práticas que podem ser realizadas de má fé e alterar seu funcionamento, como o insider trading.
Quem trabalha em uma empresa de capital aberto e tem acesso às informações da companhia antecipadamente, por exemplo, deve tomar cuidado ao negociar suas ações, pois a prática de insider trading é considerada um crime financeiro.
O que é insider trading?
O termo insider trading refere-se às negociações feitas com uso de informações privilegiadas, ou seja, quando alguém de dentro do negócio, o “insider”, as utiliza para obter vantagem sobre o mercado financeiro e, assim, obter lucro.
Este crime financeiro é definido, conforme a Lei nº 13.506, de 2017, como a utilização de informação relevante de que tenha conhecimento, ainda não divulgada ao mercado, que seja capaz de propiciar, para si ou para outra pessoa, alguma vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiros, de valores mobiliários.
Resumindo, isso ocorre quando alguém que tem acesso antecipado a um fato importante de determinada empresa, por exemplo, que torne possível ter uma previsão sobre a possibilidade de a ação cair ou subir, e se beneficia disso investindo no mercado.
O que é considerado informação privilegiada?
Para compreender o significado de informação privilegiada, é preciso relembrar como funciona o mercado de ações.
Existem diversas variantes que determinam se uma ação pode subir ou cair, mas os investidores fazem suas apostas com base em suas expectativas, positivas ou negativas, nas companhias listadas na bolsa de valores.
No dia a dia, existem algumas informações que afetam diretamente essa compra e venda de ativos, como a aquisição de uma concorrente ou o lucro da empresa, por exemplo.
Esses acontecimentos precisam ser divulgados ao mercado pelas companhias. Mas, até que isso aconteça, essas informações ficam disponíveis, primeiramente, para um número limitado de pessoas, como controladores ou administradores. O fato, então, configura uma informação privilegiada.
O que é considerado crime é o momento em que determinada pessoa utiliza essa informação privilegiada a seu próprio benefício financeiro, ou de outros.
Confira alguns acontecimentos que, antes de amplamente divulgados ao mercado, podem ser considerados informações privilegiadas:
- Fusões e aquisições que envolvam a empresa
- Resultados operacionais e financeiros, como o valor do lucro ou prejuízo
- Implementação de novos projetos
- Fechamento de novos contratos
- Mudanças no controle acionário
- Processos sob sigilo
Quem pratica o insider trading?
Geralmente o insider trading é praticado por profissionais ligados diretamente à empresa, como funcionários e conselheiros, que são os primeiros a saber dos eventos.
De acordo com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os profissionais que podem ser considerados insiders são:
- Administradores – conselheiros e diretores da companhia
- Membros de quaisquer órgãos, criados pelo estatuto da companhia, com funções técnicas ou destinadas a aconselhar os administradores
- Membros do Conselho Fiscal
- Subordinados das pessoas acima referidas
- Terceiros de confiança dessas pessoas
- Acionistas controladores
Mas outras pessoas também podem ter acesso a essas informações. A prática não fica restrita somente a esses profissionais.
“É vedada a utilização de informação relevante ainda não divulgada, por qualquer pessoa que a ela tenha tido acesso, com a finalidade de auferir vantagem, para si ou para outrem, no mercado de valores mobiliários”, segundo a Lei nº 10.303, de 2001.
Quais os tipos de insider trading?
Existe mais de uma forma de utilizar a informação privilegiada em benefício próprio e, por isso, o insider trading pode ser classificado de duas maneiras: primário e secundário.
Insider trading primário
Esse tipo de insider trading ocorre quando o crime financeiro é cometido por um indivíduo que possui acesso natural direto à informação privilegiada – ou seja, é normal que ele tenha esse conhecimento devido ao seu cargo ou função na empresa.
Podem ser administradores, acionistas ou até prestadores de serviços, como advogados ou auditores contábeis.
Insider trading secundário
Nem sempre o “insider” é o que pratica o crime financeiro. O insider trading secundário acontece quando o crime é cometido por alguém que recebe a informação confidencial de um agente primário.
O insider pode repassar a informação diretamente e propositalmente, ação conhecida como tipping, que traduzindo do inglês, pode ser interpretado como “dar a dica”, mas também é possível que o vazamento da informação pelo agente primário tenha ocorrido de forma indireta e, possivelmente, acidental.
Conversas ouvidas por terceiros ou vazamento de informações via e-mail são exemplos desse acesso indireto.
Qual a pena para insider trading?
No Brasil, insider trading é considerado crime financeiro, passível de punição, que pode ser mais severa em alguns casos.
De acordo com a o artigo 27-D da Lei nº 10.303, de 31.10.2001, “a pena é reclusão, de 1 a 8 anos, e multa de até 3 vezes o montante da vantagem ilícita obtida em decorrência do crime”.
Em casos mais graves também podem haver punições administrativas, como suspensão do exercício do cargo de administração em companhias ou entidades ligadas ao mercado de capitais, ou suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades das quais a lei trata.
Além disso, a lei prevê que a pessoa prejudicada com a compra e venda de valores mobiliários mediante informação privilegiada tem direito de ser reparada pelo infrator. Isso significa que ela pode buscar uma indenização por perdas e danos.
Efeito do insider trading para o mercado
Existem duas principais consequências do insider trading. A própria CVM entende que esses casos representam práticas não equitativas no mercado, tendo em vista que o uso da informação relevante não divulgada, juntamente com a compra e venda de ações, gera um desequilíbrio de posições aos participantes da operação, aos terceiros investidores, e à eficiência e credibilidade do mercado.
Todos os investidores possuem igual acesso tanto à informação quanto às ações da empresa, mas quando alguém recebe uma informação privilegiada, pode se antecipar aos outros investidores e corromper esse sistema de igualdade.
Além de abalar a democracia presente no mercado, o insider trading pode gerar um grande problema de reputação para a empresa envolvida.
Quando seu nome é mencionado em um escândalo, a companhia tem sua imagem denegrida e pode perder a credibilidade com os investidores.
Casos de insider trading no Brasil
Caso Joesley Batista
Um dos casos mais famosos de insider trading no Brasil envolve os irmãos Batista, donos da FB Participações, controladora da JBS (JBSS3).
Dias antes de vir a público uma delação premiada fechada pelos irmãos (o que afetaria drasticamente a empresa e a valorização da moeda estrangeira), eles realizaram operações milionárias em dólar e ações da própria companhia, lucrando milhões.
Em setembro de 2017, ambos foram presos, acusados pelos crimes de insider trading e manipulação do mercado financeiro.
O dia da divulgação das delações foi tão impactante para o mercado que ficou conhecido como “Joesley Day”.
Casos de insider trading nos EUA
Caso Walt Disney
Outro caso marcante para o mercado financeiro envolveu o nome de uma das maiores empresas do mundo, a Walt Disney (DISB34).
Em 2010, Bonnie Jean Hoxie, secretária de uma alta executiva da empresa, e seu namorado, Yonni Sebbag, foram presos por tentar vender informações confidenciais e privilegiadas sobre os resultados da companhia para gestores de fundos nos EUA e na Europa.
Os supostos compradores eram, na verdade, agentes disfarçados do FBI.
Mais crimes financeiros
Qual a diferença entre front running e insider trading?
Ambos os crimes são cometidos com uso de informação privilegiada, mas a principal diferença entre os dois está em quem os pratica.
No insider trading, geralmente, quem realiza a operação são pessoas que trabalham diretamente em uma empresa listada na bolsa.
Já o front running, o “correr na frente”, é praticado pelo corretor ou intermediário financeiro, que, ao ter acesso a determinada informação, coloca seus interesses à frente dos interesses do cliente, realizando a operação antes dele e de outros participantes do mercado.
Exemplo: um profissional do mercado financeiro recebe a ordem de um cliente para realizar determinada compra milionária de ações. O correto seria apenas realizar a operação, mas em vez disso, ele se antecipa ao cliente e compra as ações primeiro, “saindo na frente”, o que vai encarecer o ativo e resultar em lucro para o suposto profissional.