O Brasil assume a presidência do G20 a partir desta sexta-feira (1), a qual ocupará pelo período de um ano. Ao longo dos próximos meses, o país ficará responsável por organizar reuniões temáticas e setoriais do grupo – formado por 19 nações, além da União Africana e da União Europeia (UE), que juntos correspondem a 85% da economia mundial.
No entanto, o risco é de uma agenda global esvaziada. Isso porque a disputa geopolítica entre Estados Unidos e China, que parece dividir o mundo novamente em dois pólos, reduz a chance de vários atores internacionais andarem lado a lado – mesmo que seja por um caminho do meio.
Ainda mais diante das investidas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em reforçar a proposta de “criar” o Sul Global e da recente ampliação do Brics. A partir de janeiro de 2024, o bloco contará com seis novos países, que se juntam a Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
“A retomada do protagonismo internacional brasileiro traz maior expressividade para as vozes dos países periféricos e, quiçá, contribua para ampliar a margem de negociação dos países do Sul Global com os do Norte Global”.
Observatório de Política Externa e Inserção Internacional do Brasil (Opeb) da Universidade Federal do ABC, em artigo recente.
É a primeira vez que a chamada “troika” do G20 – composta pelo país que preside atualmente, o anterior e o próximo – é formada por nações em desenvolvimento. Assim, a agenda do G20 será decidida e implementada pelo governo brasileiro, com apoio da Índia, última ocupante da presidência, e da África do Sul, que assume o mandato em 2025.
Ou seja, a janela de oportunidade para o Sul Global estará aberta por mais dois anos, com permanência garantida até lá. Vale lembrar que o termo vai além da dimensão territorial e inclui tanto países emergentes mais pobres quanto mais ricos, que têm em comum a ocupação e exploração por potências estrangeiras.
Clima comum
A questão ambiental deve ser um dos poucos denominadores comuns entre os principais países – seja do Brics, do Sul Global ou desenvolvidos. O tema é central na 28º Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a COP 28, iniciada nesta quinta-feira (30) em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, onde acontece até o próximo dia 12.
Porém, ao assumir o papel de líder do G20 a partir deste mês sob o lema “Construindo um mundo mais justo e um planeta sustentável”, o Brasil realça a importância de uma ação coletiva para combater a crise climática. Aliás, o assunto tem sido recorrente em discursos oficiais do país em eventos internacionais.
Na Assembleia-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em setembro, o presidente Lula ressaltou a necessidade de medidas práticas contra as mudanças climáticas, como a transição energética e a bioeconomia, enfatizando também a responsabilidade dos países ricos, em especial do G20, nesses problemas.
Estimativas recentes apontam que, combinados, os países do G20 correspondem a aproximadamente 70% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE). Por isso, acordos de cooperação econômica internacional feitos em fóruns do grupo têm potencial significativo para ajudar a alcançar as metas previstas no Acordo de Paris.
Multilateralismo
Daí porque o Brasil também tem valorizado a ideia de multilateralismo. Segundo o Opeb, formado por docentes e discentes de graduação e pós-graduação em Relações Internacionais e áreas afins da UFABC, na visão de Lula, um mundo multipolar vai além da ONU e é “onde o poder e a influência são compartilhados entre várias nações”.
Em evento na semana passada para a comissão nacional do G20, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, falou que é preciso recuperar o multilateralismo e a perspectiva de integração entre as nações. “Por uma nova globalização socioambiental”, disse, na ocasião.
Na avaliação de Haddad, o Brasil tem a oportunidade de pautar a economia mundial nos próximos 12 meses, atendendo aos interesses do Brasil, da América Latina e do Sul Global. “É a nossa chance de botar a mão na massa e usar essa oportunidade para avançar nossa visão de um mundo mais integrado”, destacou o ministro.
Essa visão do governo federal pode significar maior apoio ao projeto de reforma no Conselho de Segurança da ONU. Trata-se de uma demanda de longa data da diplomacia nacional, que visa a inclusão do Brasil como membro permanente com poder de veto.
Ainda segundo o Observatório da Universidade Federal do ABC, a intenção do Brasil é tornar o CS das Nações Unidas “mais democrático, representativo e eficiente”, como forma de contornar falhas de atuação do órgão que carece de representação geográfica.
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Agenda
O mandato brasileiro no G20 começa a partir de 1º de dezembro de 2023 e vai até 30 de novembro de 2024. No período, o país deve organizar mais de 100 reuniões oficiais, que incluem cerca de 20 encontros ministeriais, 50 de alto nível e demais eventos paralelos.
As primeiras reuniões terão início já nos próximos dias, em Brasília, no Palácio do Itamaraty. Depois, somente em janeiro e fevereiro do ano que vem, serão realizadas 19 videoconferências do G20, discutindo textos que vão em seguida para reuniões ministeriais.
A primeira grande reunião ministerial será a de chanceleres nos dias 21 e 22 de fevereiro no Rio de Janeiro. Mas o ponto alto da presidência brasileira no G20 será durante a 19ª Cúpula de chefes de Estado e governo, em 18 e 19 de novembro de 2024, também na capital fluminense, onde Lula receberá Joe Biden, Xi Jinping e outros líderes mundiais.
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