Apesar da grande expectativa pela privatização da Sabesp (SBSP3), após a aprovação da proposta pelos deputados estaduais e da sanção pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) da lei que autoriza o processo, a principal dúvida é como os interesses do setor privado devem andar ao lado da universalização da oferta de serviços de água e esgoto e das mudanças tarifárias.

Sabesp
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Vale lembrar que a venda da participação acionária da Sabesp a gestoras de investimento, em especial do setor de infraestrutura, está condicionada a dois aspectos: a universalização dos serviços de abastecimento de água potável e esgotamento sanitário até 2029 e a redução tarifária para a população mais vulnerável. 

“Como o setor privado prioriza o lucro, é preciso ter clareza de que se irá evitar aumentos desproporcionais em tarifas e garantir que os investimentos sejam feitos da forma prevista”.

Felipe Argemi, fundador da boutique de M&A Santis.

De acordo com a própria empresa, os aportes esperados para alcançar a meta de universalização dos serviços de água e esgoto até 2029 são de R$ 66 bilhões. Esse montante, ajustado pela inflação oficial projetada (IPCA), deve ser de aproximadamente R$ 140 bilhões. Por isso, tais aspectos também devem ficar mais claros.

“O modelo de desestatização deve garantir que a empresa tenha condições e saúde financeira e operacional para perseguir as metas e se manter como um negócio viável”.

Theófilo Aquino, advogado do Piquet, Magaldi e Guedes Advogados.

Segundo o especialista em direito regulatório, há a necessidade de construir um arcabouço normativo robusto o suficiente para fiscalizar e cobrar o atingimento dessas metas. “Tais objetivos têm impacto, inclusive, na atratividade da empresa para investidores privados”, emenda.

Portanto, a falta de clareza nesses quesitos também interfere na previsão do mercado em relação à privatização da companhia. Aliás, o formato da operação no mercado de capitais com a oferta subsequente (secundária) de ações figura no topo da lista de incertezas entre os investidores.

O consenso é de que haja uma emissão de novas ações, com o governo do estado de São Paulo reduzindo a fatia atual na companhia de 50,3% para uma participação entre 15% e 30%. A operação deve movimentar cerca de R$ 10 bilhões, podendo ir além, em caso de lotes adicionais. As regras específicas que irão incidir sobre a alienação da participação acionária ainda precisam ser estabelecidas em lei regulamentar.

Infográfico: Sabesp privatizada em 5 pontos, com perguntas sobre o futuro da empresa segundo especialistas.

Público x privado

Mas a população também quer saber dos benefícios da desestatização da companhia de saneamento. Afinal, ao tornar-se uma empresa do setor privado, a busca por ganhos de eficiência e retorno aos acionistas não pode prejudicar a oferta de serviços nas cidades.

Portanto, mais do que a discussão sobre se a privatização é desejável, importa saber a que tipo de regras de prestação de serviço a Sabesp estará sujeita sob controle privado. Na avaliação de especialistas, há benefícios, tanto aos acionistas quanto à população. 

“Qualquer comparação tanto de nível de serviço quanto de eficiência, atendimento, manutenção, investimentos do setor privado, em geral, são melhores”.

Rodrigo Negrini, CEO da Soul Capital.

Segundo o especialista em finanças, uma das principais vantagens é o aumento do alcance da infraestrutura instalada. Ou seja, mais pessoas devem ter acesso ao saneamento básico. Outro ponto importante é se a conta de água vai aumentar. 

Nesse caso, Negrini explica que o ganho de escala é fundamental para que não haja repasse das despesas. “Com os investimentos e o aumento no atendimento das residências, a tendência é que os custos operacionais sejam diluídos por essa receita, que terá um incremento”, explica.

Competição acirrada

No entanto, a Sabesp ainda depende da adesão dos municípios paulistas aos serviços de abastecimento e saneamento, que deve ser decidido pelos vereadores até março. Recentemente, a secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende, afirmou que a Sabesp pode perder 50% dos contratos do estado nos próximos 15 anos.

Operação de dragagem: escavadeira em água turva bombeia por tubos para sacos de filtragem grandes na margem barrenta.
Máquina da Sabesp trabalha ao lado de bombas da hidrelétrica Jaguari durante estiagem em Bragança Paulista
12/02/2015
REUTERS/Paulo Whitaker

Além disso, o setor de saneamento vê a chegada de empresas privadas. Recentemente, o consórcio IgaraWater, da Uniáguas, venceu o leilão de concessão dos serviços de água e esgoto no município de Igarapava, de aproximadamente 30 mil habitantes. “Apesar de ser uma concessão pequena, demonstra o interesse privado no setor”, avalia Argemi, da Santis.

Essa maior competição pode colocar em xeque o retorno dos investimentos de longo prazo em infraestrutura. Nesse sentido, Negrini, da Soul Capital, lembra que o primeiro efeito se dá pelo ganho de escala; o segundo é no ganho de eficiência, tanto por tecnologia quanto na estrutura.

Assim, funções que são hoje executadas por funcionários tendem a ser absorvidas por inovações, permitindo uma redução de despesa fixa. Ao mesmo tempo, essas ferramentas tecnológicas oferecem maior eficiência no funcionamento das operações. 

“Esse custo menor é tão grande a ponto de haver um benefício compartilhado”, avalia o especialista em finanças. De um lado, defende ele, o setor privado se beneficiaria da rentabilidade desse projeto; de outro, a população tiraria proveito na forma de tarifas, constante ou até mais baixa, e com um serviço melhor.