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PIB no 2º tri surpreende com alta de 1,4% e dá força à aposta em alta de juros

Cenário foi positivo graças ao setor de energia e até à importação de carros elétricos, com o recorde de ocupados de pano de fundo

O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 1,4% no segundo trimestre, na comparação com o trimestre anterior. Com indústria (1,8%) e serviços (1%) compensando o recuo da agropecuária (-2,3%), o resultado ficou acima da mediana de 0,9%, segundo pesquisa do Valor feita com 80 instituições financeiras e consultorias.

Esse crescimento mais vigoroso se deve, em grande medida, à queda dos juros que aconteceu nos primeiros meses deste ano. E ao mercado de trabalho, que passou por uma firme recuperação. Embora seja um dado “de retrovisor”, que fala sobre o passado, o número acima do esperado deve dar força à aposta de que o Banco Central vai voltar a subir os juros ainda este ano.

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Arte: Daniela Arbex

Em valores correntes, o PIB totalizou R$ 2,9 trilhões entre abril e junho, segundo os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na manhã desta terça-feira (3).

É a 12ª alta consecutiva do PIB na comparação com o trimestre imediatamente anterior. O valor de 1,4% foi duas vezes maior que o dos Estados Unidos para o mesmo trimestre, e o segundo mais alto em uma comparação feita pela OCDE com 35 países.

Na divulgação desta terça, o IBGE também revisou a alta do PIB do primeiro trimestre de 2024, de 0,8% para 1%, em relação ao último trimestre de 2023.

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Serviços ajudou no crescimento do PIB no segundo trimestre de 2024, diz IBGE. Foto: Adriano Machado/Reuters

Surpresa com a indústria

Para Claudio Considera, coordenador de Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Economia (FGV Ibre), o fator surpresa no PIB foi a indústria de transformação, que mostrou um resultado bem mais forte do que se esperava.”

Um dos destaques foi o setor elétrico, Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE, explica que várias áreas dentro da indústria contribuíram para o bom resultado:

“Com o fim do protagonismo da Agropecuária, a Indústria se destacou nesse trimestre, em especial na eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e na construção.”

Rebeca Palis, coordenadora de Contas Nacionais do IBGE

Segundo ela, “o maior consumo de eletricidade, principalmente nas residências, e a manutenção da bandeira tarifária verde ajudaram o setor. Além disso, a Construção cresceu 4,4%, as Indústrias de Transformação tiveram sua segunda alta consecutiva (3,6%) e as Indústrias Extrativas cresceram 1,0%”.

Vista de unidades industriais da refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar).
Vista de unidades industriais da refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar). Crédito: Agência Petrobras

O impacto do mercado de trabalho

A resiliência do mercado de trabalho, fenômeno que tem desafiado os prognósticos, teve grande influência sobre o desempenho da economia no segundo trimestre. Isso fica claro quando se olha o crescimento dos componentes relativos à demanda. Segundo o IBGE, tanto o consumo das famílias quanto o consumo do governo avançaram 1,3% cada um.

O instituto diz que os resultados positivos dos três componentes foram “incentivados pelas condições do mercado de trabalho, pelos juros mais baixos e pelo crédito disponível, entre outros”.

Para Renan Pieri, professor de economia da FGV EAESP, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Trimestral) que o IBGE divulgou na semana passada já antecipavam esse quadro favorável: desemprego em baixa, renda em alta, com direito a recordes da série histórica e patamares que não só recuperaram o prejuízo do período da pandemia, mas já superam os indicadores do “antigo normal”.

“Todas as perspectivas e projeções eram de desaceleração da geração de vagas nesse semestre, mas isso não tem ocorrido. É um fenômeno novo. Os movimentos anteriores de geração de emprego não tinham toda essa pujança.”

Renan Pieri, professor de economia da FGV EAESP

No primeiro semestre do ano, o Brasil alcançou a marca de 102 milhões de pessoas ocupadas, um recorde desde 2012. O rendimento mensal superou a marca de R$ 3.200, o pico da série histórica.

Além disso, a taxa de desemprego ficou em 6,9%. Foi a primeira vez em uma década que ela fica abaixo de 7%:

Pessoas caminhado para o trabalho
Mercado de trabalho aquecido ajudou na alta do consumo das famílias. Foto: Getty Images

Água no chopp

“Não é que a economia esteja muito forte. A gente é que errou mesmo”, resumiu José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator. Por “a gente”, ele está se referindo aos economistas que se dedicaram a projetar o resultado do indicador. E que, depois de conhecer os dados, tentam entender para qual direção esses números estão apontando.

Dizem que os economistas são aqueles que, em uma festa, avisam que a cerveja vai acabar. De certa forma, a análise de Gonçalves sobre o PIB tem esse mesmo tom. E o ponto central desse alerta é que foi a queda dos juros que abriu caminho para o crescimento da economia no segundo trimestre. A Selic começou 2024 em 11,75% e terminou o segundo trimestre em 10,50%, e essa queda ajudou bastante o consumo e também a indústria.

Mas o juro deve voltar a subir, diz Gonçalves. “E toda a ajuda que a Selic deu para a economia ela vai parar de dar”, explica. A alta do juro tem a ver com a inflação, que está mais alta. E com as expectativas para o IPCA, que também apontam para uma piora no futuro.

Gonçalves chama a atenção para outros pontos:

  • A taxa de investimento, “que já era baixa”, teve uma leve desaceleração em relação ao primeiro trimestre, de 16,9% para 16,8%, o que sugere condições mais restritas de oferta no futuro;
  • O comércio também cresceu menos: 1,4% ante 2,5% no primeiro trimestre;
  • O crescimento das transferências — conjunto dos benefícios sociais concedidos pelo governo —, que contribuíram em grande medida para o avanço do consumo, também tem perspectiva de ser menor, tanto neste ano como no próximo.

De todo modo, o economista diz que o quadro mostrado pelo PIB é, ainda, positivo. “Ele não é maravilhoso, mas é a confirmação de que a demanda ainda está forte”, resume.

Alta da demanda x queda dos juros

O resultado do PIB é um dos indicadores monitorados pelo Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central. E os números conhecidos hoje apenas corroboram a leitura que o comitê tem feito sobre o efeito do mercado de trabalho sobre o crescimento econômico e a inflação.

“Se você ler as atas do Copom das reuniões desde o começo do ano, eles [os diretores do BC] constantemente mencionam que o mercado de trabalho aquecido é a principal razão para os juros não continuarem caindo”, afirmou Renan Pieri, da EAESP.

Considera, do Ibre, explica que, em suas decisões sobre a taxa de juros, os resultados do PIB aparecem pelo espelho retrovisor. “O que interessa para o Copom, na verdade, não é o presente, é o futuro. Ele olha para o PIB preocupado com o que vai acontecer lá na frente.”

Na opinião dele, porém, a taxa não deve subir na próxima reunião, mas ser mantida no mesmo patamar.

Veja abaixo os trechos das cinco atas de reuniões do Copom realizadas em 2024 mencionando o mercado de trabalho:

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Infografia: Ana Carolina Moreno e Daniela Arbex

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