O pacote fiscal do governo nem foi aprovado e parece que já foi pelo ralo. Somente com o aumento dos juros feito pelo Banco Central na última quarta-feira (11), de 1 ponto percentual, o custo da dívida subiu cerca de R$ 50 bilhões ao ano, numa tacada só. E, se realmente houver mais duas doses desse tamanho, como o BC já indicou no comunicado da decisão, a conta chega a R$ 150 bilhões. A economia que o governo pretende ter com as medidas de corte de gastos soma R$ 70 bilhões em dois anos.
Esse cálculo foi feito pelo próprio Banco Central, e consta de um documento publicado no dia 29 de novembro sobre estatísticas fiscais. Segundo esse estudo, a cada um ponto percentual de aumento da taxa Selic, a Dívida Bruta do Governo Geral – que engloba o governo federal, o INSS e os governos estaduais e municipais – cresce R$ 50 bilhões.
Segundo o economista-chefe da ARX, Gabriel Barros, o impacto pode ser ainda mais alto. O Banco Central já disse, no comunicado da última decisão, que pode manter o ritmo de alta de juros por mais duas reuniões. Ou seja, ele praticamente “contratou” uma Selic de 14,25%. Só que, segundo o economista, a expectativa do mercado é de que o juro suba um pouco mais, para 15%. Se essa previsão se confirmar, o custo para a dívida pode chegar a R$ 190 bilhões ao ano.
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Se a gente olhar apenas o estoque de dívida mobiliária, que é a dívida financiada por meio da emissão de títulos públicos do Tesouro Nacional, o impacto é de R$ 32,7 bilhões a cada ponto percentual de aumento da Selic. Aqui, a conta é fácil: essa dívida hoje soma R$ 6,748 trilhões. E, desse total, 48% (ou R$ 3,238 trilhões) são pós-fixados, ou seja, variam junto com a Selic. Então, usando a mesma lógica, só a política monetária mais apertada vai gerar um custo fiscal de mais de R$ 95 bilhões ao ano.
Por que o juro sobe?
Mas é bom lembrar que o Banco Central sobe os juros porque seu trabalho é controlar a inflação. E foi por causa da alta da inflação corrente e das expectativas de inflação que ele optou por acelerar o ritmo de aumento da Selic.
O que está preocupando é que, segundo as projeções dos especialistas, a dívida pública caminha para atingir um volume equivalente a 90% do PIB até o fim de 2026. É muita coisa. E por isso investidores estão buscando ativos mais seguros, como o dólar – o que explica a cotação estar acima de R$ 6,00. O câmbio desvalorizado faz a inflação subir. E, sem uma resposta rápida do governo sobre as contas públicas, as projeções de inflação e juros vêm em franca deterioração.
Esse aumento de juros parece mais um paliativo, porque não resolve o problema central da economia neste momento, que é o fiscal. Mas, para o economista-chefe do Citi, Leonardo Porto, essa é a melhor estratégia que o BC pode tomar neste momento, sob o risco de perder o controle da inflação – foi o que aconteceu no Brasil no período pré-plano Real.
“O Banco Central tem que fazer o trabalho dele mesmo que o problema, na verdade, não seja dele, sob o risco dos problemas se multiplicarem”, afirma.
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