Foram poucas as vezes nos últimos cinco anos em que o preço do barril de petróleo esteve mais barato do que hoje. Nesta terça-feira (16), o valor do petróleo do tipo Brent, usado como referência pela Petrobras, caiu para a faixa de US$ 58, acumulando uma queda de quase 20% em 2025. Considerado baixo, o patamar acende um sinal de alerta. Ele coloca em risco os planos de investimento da estatal brasileira, mas também reduz a competitividade de fontes renováveis e, caso a desvalorização persista, pode forçar uma consolidação por meio de aquisições no setor de óleo e gás.

O cenário do petróleo de xisto americano, cuja referência é o WTI (West Texas Intermediate), também não é nada animador. Cotado abaixo de US$ 55, atingiu o nível mais baixo desde 3 de fevereiro de 2021.

Segundo especialistas, o declínio da commodity se dá por uma série de fatores: o aumento da oferta de petróleo nos últimos meses, a desaceleração da economia global, sobretudo por parte dos Estados Unidos, e a guerra comercial. A proximidade de um acordo de paz entre Rússia e Ucrânia também impacta nessa conta.

Em outubro, a Organização de Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) decidiu aumentar sua produção de petróleo em 137 mil barris por dia a partir de novembro. Foi o oitavo incremento consecutivo da aliança de produtores desde abril.

“O que a gente está vendo de alguns meses para cá é uma oferta de petróleo crescendo muito além da demanda. Isso causa uma pressão sobre o preço”, afirma Adriano Pires, sócio fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE). “Se o barril ficar nessa faixa de US$ 55 a média, vai ter muita empresa que não vai conseguir gerar caixa para pagar investimentos e empréstimos”, vaticina.

Petrobras

Com boa parte da receita e de suas dívidas atreladas ao dólar, a Petrobras deve ser impactada pelo revés da commodity. Em seu plano de investimentos para o ciclo entre 2026 e 2030, a petroleira estimou que o barril de petróleo será, em média, US$ 63 em 2026, subindo para US$ 70 já em 2027 até 2030. A média do dólar, por sua vez, estaria cotada a R$ 5,8 entre 2026 e 2030 em suas estimativas. No terceiro trimestre deste ano, a dívida líquida da companhia totalizou US$ 59,1 bilhões, mantendo-se estável em relação ao período anterior.

“A esse nível de US$ 55, a Petrobras pode ver a dívida dela crescendo porque ela não vai gerar o caixa suficiente para investir e para abater dívida. E vai ter de pegar mais grana para manter o nível de investimento que ela se propôs a fazer. Então, a esse patamar, a dívida dela pode chegar até a US$ 100 bilhões no final de 2026”, analisa Pires.

A empresa projeta a destinação de US$ 91 bilhões (R$ 485 bilhões) a projetos que serão implantados nos próximos cinco anos e outros US$ 15 bilhões (R$ 80 bilhões) que serão alocados em uma carteira de avaliação, composta por oportunidades com menor grau de maturidade. Com a redução do patamar do barril, esses valores poderão, no entanto, ser revisados.

“No cenário global, poderemos ver, num primeiro momento, as empresas do setor tendo que puxar o freio de mão na produção e nos investimentos. No entanto, no curto prazo, os países que dependem muito do petróleo para as suas divisas podem querer compensar a queda do preço com aumento de volume. Aí você pode entrar numa espiral de mais queda [do preço] ainda”, diz David Zylbersztajn, professor da PUC-RJ e ex-presidente da Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP).

A ação ordinária da Petrobras terminou o pregão desta terça-feira (16) cotada a R$ 32,31, queda de 2,74% no dia. Já o papel preferencial da estatal fechou o dia cotado a R$ 30,74, declínio de 3,03%.

O movimento de desvalorização foi seguido por outras gigantes do setor de óleo e gás no mundo. Saudi Aramco (-1,04%), ExxonMobil (-1,6%), Chevron (-3,27%), Shell (-2,89%) e TotalEnergies (-1,80%) também registraram recuos com o maior temor por parte dos investidores.

Barril em queda pode aquecer M&As no setor

O cenário de queda do barril pode fazer com que empresas menores desse mercado (as chamadas junior oils), que costumam ter custos de extração mais altos, tornem-se alvos das gigantes do setor em busca de consolidação. Para Pires, o próximo ano vai exigir muita “disciplina de capital” por parte das companhias de óleo e gás.

“Acho que 2026 vai ser um ano que vai exigir muita disciplina de capital das petroleiras e pode ser até que você tenha alguns eventos de fusão e aquisição, como empresas maiores comprando menores”, afirma o especialista.

Para diminuir as incertezas no radar, especialistas defendem que a Opep+ proponha uma diminuição no nível de produção global. Até isso, no entanto, seria complexo. “Só quem produz onshore (na terra) consegue reduzir rápido. Isso vale para Estados Unidos, Argentina, Canadá e para a própria Opep. Brasil e Guaiana já teriam mais dificuldade, porque as plataformas offshore (no mar) estão contratadas, estão descomissionadas. Não é tão simples essa política de reduzir oferta”, complementa Pires.

“As empresas podem reduzir a produção para aumentar o preço, mas elas vão topar perder volume? Não é uma decisão muito fácil”, conclui Zylbersztajn.