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‘Efeito Sideways’ e as mudanças irracionais nos mercados

Estudo ressalta como os mercados reagem as mudanças súbitas e irracionais nos hábitos dos consumidores.

Imagem ilustrativa | Freepik

Uma das frases que mais gosto de repetir é que economia é vida. E é mesmo. Além dos números do Produto Interno Bruto, da inflação e do desemprego, que chamam muito mais atenção, as relações econômicas envolvem rotinas que seguimos diariamente. Podem, por exemplo, servir para falar de cinema e de vinho.

O pinot noir é a base da indústria de vinhos do Vale de Napa, na Califórnia. É um vinho reconhecido pela sofisticação e que, segundo especialistas, nas uvas crescidas no solo do estado americano, ganha tons únicos. Mas boa parte da fama não se deve às suas qualidades etílicas, mas ao chamado Efeito Sideways. Um curioso caso em que um filme teve impactos econômicos para uma indústria inteira.

Sideways – Entre umas e outras é um filme de 2004 ganhador do Oscar de melhor roteiro adaptado. O roteirista, Rex Pickett, adaptou o romance que ele mesmo havia escrito sobre dois homens de meia idade que fazem uma viagem de uma semana sobre o Vale de Napa, na Califórnia, para beber.

Mas as opiniões de um deles, Miles, um escritor fracassado, deprimido e obcecado por vinhos, foi muito mais longe do que as salas de cinema. O termo “Efeito Sideways” foi usado pela primeira vez para explicar a queda na preferência pelo merlot. Segundo um estudo da universidade californiana Sonoma State, as vendas do vinho, popularíssimo até então, caíram 2% a cada 12 meses nos três primeiros anos depois do filme.

Só vieram a se recuperar no começo da década passada. Mas o Efeito Sideways é ainda mais acentuado com relação ao pinot noir. Miles, afinal de contas, é apaixonado por esta variedade de vinho, declarando seu amor em diversos momentos. Desde o lançamento do filme, as vendas do vinho saltaram 170%.

E, claro, é difícil atribuir a alta ou queda nas vendas apenas a um filme. No caso do merlot, alguns especialistas apontam que o mercado já vinha saturado e com queda nos preços quando o filme foi lançado. Outro ponto que costuma ser notado é que os vinhos deste tipo de uva foram muito populares nos anos 90. O mercado andava saturado e os consumidores andavam em busca de novidades. Sideways teria sido responsável por parte da queda nas vendas, mas não toda.

Já o pinot teria sido beneficiado pela maneira simpática como é tratado no filme, mas também pelo surgimento, anteriormente, de um público em busca de um vinho mais sofisticado. Ou seja, nos dois casos, mais do que terem sido causadas por Sideways, seriam mudanças naturais do mercado.

Será? Um estudo recente, publicado no Journal of Wine Economics, se propõe a responder de uma vez por todas. Com dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos entre 1999 e 2012, o economista e professor da Universidade da Califórnia Travis Lybbert demonstra que, de fato, houve uma mudança na produção das uvas do pinot noir (aumentando) e do merlot (caindo). E que a virada ocorreu em 2005, um ano depois do filme.

O trabalho ressalta como os mercados reagem as mudanças súbitas e irracionais nos hábitos dos consumidores. Mas como aponta o podcast americano Planet Money, que aborda o Efeito Sideways em uma de suas últimas edições, há uma ironia final. A uva do pinot noir hoje ocupa 75% dos vinhedos na Califórnia, mas a maioria dos terrenos não oferece as condições ideais de temperatura, levando a safras em que a qualidade é inferior.

E, ironicamente, sendo produzido em menor quantidade, o merlot, segundo especialistas, é hoje o melhor vinho americano.

*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico.

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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