É possível encontrar um método para se tornar um empreendedor profissional com menos “achismo” e preparo profissional. Esse é um dos tópicos importantes no livro “Empreenda Agora”, do brasileiro Fábio Rodrigues, que mora em Lisboa e é um empreendedor vitorioso com sua empresa US Marketing – Designers as a Service. Fábio é escritor, mestre em Ciências Empresariais pela Universidade de Lisboa.
Em 2019, encontrei Fábio Rodrigues pela primeira vez em Lisboa numa palestra que dei na Lispolis – um centro de empreendedorismo. Conversamos muito sobre gestão de negócios e, posteriormente, na pandemia, participamos de lives sobre finanças e negócios. Com alegria, reencontro Fábio Rodrigues como escritor.
Neste livro, Rodrigues nos ensina a ser um empreendedor profissional. Recomendo a leitura e me identifico com suas ideias também como empreendedor, executivo e professor. Em um trecho de sua obra, o autor sugere que “um empreendedor não deve começar sua primeira atividade em uma área em que não conheça ou não tenha um mínimo de afinidade”.
Ou seja, ele pontua que é preciso identificar suas áreas de conforto. Naquilo que você é bom e recebe elogios pelo que faz. Desenvolver negócios a partir da sua área de conforto, essa é a grande sacada de Fábio para o sucesso de empreendedor profissional sem achismos e chutes. Aprendi muito com esse insight!
Quando ele fala, “não confundir zona de conforto com área de conforto” é de extrema importância estarmos atentos para não confundir com a famosa expressão “sair da zona de conforto”, que se refere às pessoas acomodadas, aquelas que, por qualquer razão, não querem nenhum desafio adicional. Estão satisfeitas com a situação atual e não querem explorar novas possibilidades.
O autor, ao citar a “área de conforto”, se refere àqueles assuntos que você já conhece bem, se identifica, tem vocação, já foi treinado e é capaz até de ensinar para outras pessoas.
“A sua área de conforto é aquela que pode conversar ou discutir com qualquer pessoa de igual para igual, entendendo o que está certo ou errado, avaliando ideias, discordando, agregando ou simplesmente se divertindo.”
Como descobrir suas áreas de conforto
“Empreenda Agora” é um guia para um bom começo. Façamos as perguntas, provoca Fábio: “No que eu sou bom? O que eu faço há bastante tempo? Qual é o assunto que eu domino? Pelo que eu sempre recebo elogios?”.
Ele sugere alguns caminhos a serem guiados:
- Suas profissões: “Quais tipos de trabalhos você já fez? Quais carreiras teve e em que áreas profissionais é capaz de discutir perfeitamente sobre o assunto com qualquer pessoa? Quais são as áreas em que você conhece os jargões, as dificuldades, as piadas internas, os entraves, os valores, os principais fatos, as pessoas consideradas ícones da profissão, em que possui amigos e conhecidos que ainda trabalham no segmento, conseguiria contatos de clientes parceiros e possíveis fornecedores?”.
- Seus hobbies: “Que interesses o acompanham há bastante tempo e dos quais você conhece detalhes como preços, dificuldades, fornecedores, artigos raros, artigos sem reputação e assim por diante? Neste grupo, entram as ações como cozinhar, costurar, tocar instrumentos musicais, consertar carros antigos, frequentar bares, ler livros, escrever artigos, fazer mapa astral, criar itens de decoração, fazer scrapbook, preparar encontros e festas da família ou do trabalho, e ainda tudo aquilo que você executa frequentemente como um passatempo e faz bem.”
- Suas paixões: “Assuntos que você acompanha com entusiasmo e procura absorver qualquer informação, mesmo durante as férias, fins de semana e feriados. São temas sobre os quais você lê e assiste conteúdos relacionados, inclusive como forma de descansar a cabeça e se refugiar num mundo à parte.”
- Seus elogios: “Quais são aquelas atividades ou assuntos pelos quais você sempre recebe elogios? É pelo seu brigadeiro, pelo seu churrasco, pela sua feijoada? Ou pelo seu bom gosto com arranjos? O jeito como você se comporta perante as dificuldades, seus conselhos, as suas invenções, a sua criatividade, seu comprometimento?.”
Saiba escolher seus sócios
Outro ponto simples, mas delicado, no ponto de vista do autor, é a fonte de equívocos e destruição de valor ao escolher os sócios errados. Lembra Rodrigues: “Saiba como escolher seus sócios”. Confesso que já cometi esse erro e “perdi dinheiro” e criou uma fonte de mal estar para mim.
Você certamente já ouviu a expressão “sócio é igual a casamento”. É mais que isso. É mais complexo, pois não há amor envolvido. No livro, Fábio Rodrigues esclarece que o sócio não deve ser alguém que lhe ofereça apenas conforto, segurança ou alegria.
Não deve ser aquela pessoa de que você “gosta muito” e com a qual “se dá bem”. Tudo isso é interessante, mas não é suficiente. O importante mesmo é que ele ou ela complemente as suas competências e compense as suas falhas. Que só entre no negócio se for absolutamente necessário e quando for necessário, nem antes e nem depois.
Além disso, as funções e o nível de trabalho de cada sócio devem estar muito claros desde o início. Você deve se perguntar e responder em apenas três segundos: “por que eu preciso dele(a)?”. A resposta deve ser claríssima, por exemplo: “eu sou do marketing e ele é financeiro”; “eu tenho a grana e ela vai tocar o negócio”; “eu sei fabricar e ele sabe vender”; e assim por diante.
No entanto, o que mais acontece é o oposto: “eu trabalho na área de marketing e me dou muito bem com um colega que faz a mesma coisa que eu. Daí nos perguntamos: por que não abrir uma empresa juntos?”. Daqui a seis meses a empresa vai ter dois diretores de marketing e nenhum financeiro.
Entendeu a confusão? Outra coisa que também acontece muito é: “ele é meu irmão”, ou “ela é minha amiga querida”, ou “ele trouxe a boa ideia”, ou “eu confio nele”. Se não houver uma complementaridade clara entre os conhecimentos e atividades dos sócios, nem comece.
O período de entrada dos sócios adicionais também é muito importante. Se a sua empresa não tem necessidade imediata daquela competência ou do dinheiro que o novo sócio vai aportar, espere mais um pouco e encontre primeiro as soluções para os seus problemas mais urgentes. Seu primo pode ser ótimo em marketing, mas se o seu problema mais urgente for a fabricação do produto, resolva-o primeiro.
Lembre-se: cada pessoa ou organização que entra como sócia na empresa deve ter uma ou mais funções extremamente necessárias e bem definidas, ser responsável por elas e não precisar utilizar o tempo de nenhum outro sócio.
O modelo de negócio
O conhecimento do modelo de negócio a ser implantado é um grande segredo quando for abrir seu negócio. Segundo o autor, é importante saber quem são seus concorrentes.
“Saiba como funciona a entrada e saída dos recursos do seu caixa, isto é, o seu fluxo de caixa”. Neste ponto, tenho um alinhamento com as ideias de Fábio, onde conversamos várias vezes sobre esse tema. Sem caixa, a empresa morre pelo seu endividamento.
Faturar não é lucrar. Acrescento aqui algumas observações em finanças às ideias expostas pelo Fábio Rodrigues: evitar gastos desnecessários e saber medir a margem de seu negócio e o tempo que recebe e pagar suas contas. Isso é relevante!
Essa é a mais fácil de explicar, afinal, o que nós iniciantes mais fazemos de errado é gastar dinheiro que não era necessário, diz Rodrigues.
“Quando a U5 Eventos começou, aluguei uma sala comercial dentro de um famoso escritório compartilhado (e caríssimo!), porque eu achava importante estar perto dos meus clientes. Mas eu precisava mesmo? Na sequência, convidei diversos amigos para almoçar com a intenção de explicar meu novo negócio e acabei pagando muitas dessas contas. Será que eu precisava pagar o almoço para os meus amigos, uma vez que todos tinham vale-refeição e eu não? Contratei uma internet super veloz, mas será que aqueles megabytes fizeram mesmo grande diferença para a minha utilização? O dinheiro vai embora muito rápido e nem percebemos onde ou quando gastamos. É como se você comprasse uma caixa daquele chocolate que você adora de valor exorbitante e comesse ‘só um pouquinho’ todos os dias. Em pouco tempo, a caixa estará vazia e você vai se perguntar: ‘cadê meus chocolates?’.”
O veneno dos pequenos gastos
A verdade é que diversos gastos são pequenos e irrelevantes até o momento em que você soma todos. O susto fica ainda maior quando você multiplica esses pequenos gastos pelo ano todo. Por isso, quando você abrir sua empresa, esteja muito atento a esses pequenos custos somados e repetidos.
Quero ficar rico
Desculpe a sinceridade, mas isso provavelmente não vai acontecer na sua primeira empresa, nem nos primeiros anos do seu negócio, opina Rodrigues. “Investir, seja dinheiro ou tempo, visando apenas ganhar dinheiro, ou mesmo entrar numa tendência de mercado, só trará frustrações e suas chances de sucesso serão bem menores”, assim também nos lembra o Caito Maia, o fundador da Chilli Beans, no prefácio desse livro.
Todas as estatísticas mostram que grande parte das empresas recém-abertas quebram em poucos anos. E, daquelas que não quebram, a maioria consegue apenas sobreviver, remunerando o seu time de sócios de maneira satisfatória e crescendo devagar. Raras são as que conseguem gerar lucro suficiente para os empresários ficarem ricos de maneira rápida (o que depende também do seu conceito de rico).
Quero ter mais tempo para mim e para a minha família
Também não vai ser exatamente assim. Pelo contrário. Quando você abre um negócio novo e precisa tirar dele o seu sustento e o de sua família, precisa trabalhar muito mais horas do que o normal apenas para compensar o fato de o negócio ser novo e você ter pouca experiência e recursos disponíveis. Tenha em mente que todos os iniciantes cometem erros e são naturalmente lentos em evoluir em suas novas atividades. Isso é normal e melhora com o passar do tempo.
Quero abrir um negócio meu
Esse é outro conceito interessante, mas pode ser um problema, segundo o autor. O que significa exatamente um negócio ser seu? A maioria dos negócios são apenas transacionais: a empresa está no meio de uma transação de compra e venda de algum produto ou serviço criado por outras empresas, movimentando itens ou serviços de um lado para o outro. Imagine uma farmácia, ela compra remédios dos laboratórios e vende para os consumidores.
Um restaurante compra matéria-prima, transforma em comida e vende para os clientes. Um açougue compra carne dos frigoríficos, que, por sua vez, compram dos criadores de animais. Em quase todos os negócios montados pela primeira vez, apenas uma pequena parte do processo é realmente sua.
Até porque se essa parcela for muito representativa, também significa que você está vendendo o seu tempo e a sua própria força de trabalho e não gerindo um negócio com chances reais de crescimento.
Quero ter mais segurança
A expectativa de não poder ser demitido por algum chefe ou de não precisar mais procurar emprego é sempre muito encantadora, mas não corresponde exatamente à realidade da “segurança” que se adquire ao se tornar um empresário.
Quem vai contratá-lo ou demiti-lo todos os dias são os seus clientes e, portanto, existe ainda menos segurança do que em um emprego formal. Além do mais, fatores externos e inesperados sempre são capazes de colocar o seu negócio em risco.
Para finalizar, recomendo a leitura de um capítulo especial sobre a “Grande Sacada”, onde o autor descobre os erros clássicos de empreendedor amador, que trouxe lágrimas e frustrações, e tornou o grande insight desse seu livro e levou-me a mudar de negócios e até de país.
Agradeço ao Fábio esse reencontro com suas idéias e insights poderosos.
Auguro uma boa leitura e descubra como se tornar um empreendedor profissional.
*Aloisio Sotero é Mentor em Finanças e Matemática Comercial. Estrategista em Modelos de Negócios. Vice-diretor da Faculdade Central do Recife e membro associado do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). |
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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