Colunistas
Projeções para a bolsa em 2022 servem para alguma coisa?
Entre projeções fadadas a não se realizarem, minhas (poucas) certezas sobre o ano que vem.
Final de ano tem seus chavões. Ceia com o “tio do pavê”, amigo secreto da firma, show do Roberto Carlos… E por aí vai. Pois tenho para mim que o “arroz com passas” do mercado financeiro são as famigeradas “projeções para o Ibovespa”: ninguém faz muita questão, mas elas inevitavelmente estão lá.
Eu aprendi uma coisinha ou outra sobre essas previsões ao longo dos meus 15 anos de caminhada. E é sobre isso que eu quero falar hoje. Para já tirar a questão da frente, esclareço que elas não vão se concretizar. E você sequer deveria esperar por isso…
Explico.
Existem basicamente duas formas de se construir uma projeção de Ibovespa: a mais simples consiste em estimar um múltiplo (tipicamente preço/lucro) para o índice e depositar fé na premissa de que, ao longo daquela exata janela de duzentos e cinquenta e poucos dias úteis, os mercados convergirão para aquilo.
A maneira mais elaborada é construir valuations para cada uma das empresas que compõem o índice, estimar preços justos para todas elas e ponderar a que nível o indicador deveria ir caso todas elas alcançassem aqueles alvos teóricos, ao mesmo tempo, no último pregão do ano vindouro.
Em outras palavras, em maior ou menor medida, o exercício de projeção do índice pressupõe que todas as vicissitudes inerentes ao mercado, que separam preços de fundamentos, desaparecerão até 31 de dezembro do ano que vem. É assumir que o mercado deixará de ser o mercado, sublimando todos os fatores que levam à subestimação ou superestimação passageira do valor dos ativos.
É mais ou menos como aqueles exercícios de física do Ensino Médio, onde calculávamos a velocidade de uma partícula sem massa que se deslocava num tubo de vácuo: um exercício teórico que pode oferecer algum insight, mas do qual não se deve esperar uma reprodução fidedigna no mundo real.
Então pare – simplesmente pare – de contar com isso.
Dito isto, esses exercícios têm alguma serventia?
Olha… até tem. Ajudam a entender em que nível se encontram as expectativas do mercado, para o próximo ano, para as empresas mais representativas do índice.
Grosseiramente falando, um eventual grande potencial de valorização no ano seguinte pressupõe ou uma melhora substancial nos resultados para além da expectativa média do mercado (caso contrário, pelo menos parte já estaria no preço e o upside remanescente não seria tão grande assim…), ou – em teoria – uma queda do prêmio de risco que, também, o restante do mercado não está vendo.
Em outras palavras, eu olharia com mais atenção para a dispersão das expectativas – e tentaria entender o que os mais otimistas ou pessimistas estão manifestando de substancialmente diferente da média – do que para o nível em si.
Nível, aliás, que por vezes parece condenado a ser sempre o fechamento do ano anterior mais 30%…
Mas não paro por aí. Insisto na minha eterna cantilena de que a bolsa é tão somente um mecanismo por meio do qual compramos e (às vezes) vendemos participações em negócios – e todo o resto é distração.
Se assim é, a não ser que a sua cesta de negócios muito se assemelhe ao Ibovespa, essas tais projeções importam muito pouco. É assunto de apostinha de churrasco de domingo com as sobras da ceia de Natal.
Não perca o seu tempo com isso. Foque em entender as empresas nas quais você investe.
Você deve estar se perguntando qual é minha aposta para 2022, não é mesmo?
Simples: aposto que vai continuar tendo gente dando mais atenção a preço do que a fundamento, comprando caro e vendendo barato porque ainda não entendeu que o mundo real vem antes da bolsa… Enquanto uma minoria silenciosa seguirá fazendo a lição de casa e colhendo, no tempo certo, os resultados dos seus esforços.
A qual grupo você quer pertencer?
*Ricardo Schweitzer é analista CNPI, consultor CVM e investidor profissional. Twitter: @_rschweitzer; Instagram: @ricardoschweitzer |
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