Não haveria o que mais tarde seria chamada de economia comportamental, a combinação de psicologia e economia, não fossem os estudos de Daniel Kahneman e de seu colega mais frequente, Amos Tversky. Junta, a dupla desvendou que muitas das decisões até então consideradas racionais pelos economistas na verdade são influenciadas pelo inconsciente. Por vieses cognitivos e mecanismos como aversão ao risco, entre outros.
Grande parte da pesquisa do ganhador do Nobel de Economia está reunida no best seller “Rápido e Devagar”, lançado em 2011. Dez anos depois, Kahneman está lançando um novo livro. “Noise: A Flaw in Human Judgment” (Ruído: Uma Falha no Julgamento Humano, sem previsão de lançamento no Brasil), escrito em parceria com Cass Sunstein, professor de Direito em Harvard, parte de uma pergunta central: por que cometemos erros?
Todos somos capazes de julgar mal uma situação, mesmo sendo um especialista. Pior ainda no caso de juízes, médicos e consultores financeiros. São profissionais cuja capacidade de decisão pode ter impacto na vida de outras pessoas. Fatores inconscientes, eventos aleatórios, preconceitos ou mesmo o clima – o tal “ruído” do título do livro – turvam nossa capacidade de julgamento, muitas vezes prejudicando nossos objetivos.
Juízes condenam mais os réus quando estão com fome, perto da hora do almoço, do que no começo da manhã ou no meio da tarde. Médicos prescrevem mais medicamentos no final do dia do que no começo, assim como consultores financeiros exageram na confiança sobre seus próprios conhecimentos. É ainda mais provável que você queira vender ações em um dia chuvoso do que quando o sol está brilhando do lado de fora da janela.
Ruído não é a mesma coisa que um viés, mecanismo psicológico que nos leva a agir de determinada maneira, um elemento central nos estudos de psiconomia. A aversão à perda, por exemplo, torna investidores mais cautelosos. Também existe a propensão a olhar mais favoravelmente para informações que concordam com nossas opiniões do que as informações negativas. Estes são efeitos que produzirão um resultado semelhante.
Já o ruído é um fator aleatório, seja um acidente leve de trânsito, uma noite de sono mal dormido ou o tempo estar chuvoso, que leva a decisões nem sempre iguais. Nas palavras do próprio Kahneman, um viés é como um defeito numa balança que marca sempre os mesmos cem gramas a mais. Já um ruído é como subir na balança e a cada vez o peso estar errado, mas não com o mesmo erro.
Entre programadores, segundo estudos citados no livro, as respostas variam 71% de um dia para o outro sobre o tempo para concluir determinada tarefa. Já numa seguradora as análises sobre determinado cliente variavam 55%, dependendo do funcionário. E patologistas foram incapazes de analisar com a mesma precisão o diagnóstico sobre a gravidade do resultado de uma biópsia.
Seja um médico, um consultor de investimentos ou um analista experiente, a condição de especialista pode tornar até mais difícil perceber um erro, sugerem os autores do livro. Não é que determinado fator torna todas as decisões erradas, mas algumas vezes, sim. Só que quanto maior a experiência, mais dificuldade para aceitar o equívoco, com o risco de danos piores dependendo da capacidade de afetar quem depende das suas decisões.
Combater o ruído, segundo o livro, envolve vários métodos, que Kahneman e Sunstein batizam de “higiene das decisões”, como dividir cada decisão em partes para evitar erros de avaliação e injustiças. Vale para uma empresa contratar um funcionário ou uma decisão de investimentos ou outra qualquer. Criar protocolos, como fazem os pilotos de aviões, para decisões recorrentes é outra dica para evitar as más decisões.
Não confie tanto em seus instintos – é a mensagem de “Ruído”. Temos a tendência a acreditar que tomamos as melhores decisões. Mas é saudável desconfiar de que não é bem assim.
*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico. |
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