Estou sendo muito contactado por bancos para cumprimento das novas regulações do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional referentes às mudanças em suas políticas de sustentabilidade. O que me assusta é que os investidores, empresas e bancos ainda não compreenderam o alcance das novas normas de ESG do Sistema Financeiro Nacional que vão mudar completamente os seus negócios e investimentos.
Indo direto ao ponto, o Brasil assinou durante a 26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26) um tratado para a redução na emissão de carbono em 50% até 2030. Consequentemente, os órgãos reguladores nacionais começaram a alterar as políticas de sustentabilidade de suas supervisionadas não somente no que tange aos aspectos ambientais, mas também aos sociais e de governança.
O Sistema Financeiro Nacional foi o primeiro a fazer as alterações nessas políticas, já que em setembro de 2021 foram publicados seis normativos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e Banco Central tratando de aspectos ambientais, sociais e climáticos do sistema financeiro, em linha com as tendências internacionais de incorporação de fatores ESG na sua regulação. Por conta destes normativos, os bancos terão até dezembro de 2022 para implementarem toda a nova política de sustentabilidade que altera completamente a estratégia e direcionamento de seus negócios porque impacta diretamente as suas matrizes de risco e controle: o Sistema de Controles Internos (SCI) e a Gestão de Controles de Risco (GIR).
E por que isso importa para o investidor?
Os bancos estão sendo obrigados a alterar as suas matrizes de controle e risco observando assim todos os riscos ambientais e sociais associados – o que impacta diretamente a geração de crédito para as empresas e pessoas. Se no Brasil, os juros de financiamento já eram altos, agora ficarão maiores para aqueles com histórico ambiental, social ou de governança ruim. Suas ações listadas em bolsa vão ruir ao longo do tempo se nada fizerem.
Imagine aquela empresa poluidora que é reticente em mudar sua matriz de energia para uma energia limpa, a exemplo da solar. No curto prazo, essa companhia não deve conseguir financiar sua operação, ficando exposta ao risco de não sobreviver em tempos difíceis. De novo, suas ações podem vir a ser impactadas ao longo do tempo assim como suas debêntures terão taxas mais caras de forma a impactar no financiamento da sua expansão.
Em um outro cenário, imagine uma empresa com histórico de demissão em massa. Tempos atrás o investidor só avaliava se o produto ou serviço estava vendendo bem ou não ou se tinha lucro a distribuir ou não antes de apostar em uma ação. Porém, quando os bancos param de financiar tais organizações por conta de sua exposição aos riscos sociais, a capacidade dessa empresa continuar de pé vai ficar cada vez mais comprometida. E isso só ficará claro quando os investidores precificarem as ações com base nas premissas ESG. Logo, salvar o mundo se tornou obrigatório.
A mentalidade das empresas e dos seus executivos também vai ter que mudar por conta das novas normas do Banco Central. Outro dia, ouvi de um gerente de uma gigantesca empresa brasileira, que um novo diretor financeiro foi contratado e apesar do lucro de bilhões recorde em toda sua história, uma de suas metas é a de demitir parte do seu pessoal em alinhamento com a necessidade constante de aumento de sua eficiência produtiva.
Se esse diretor olhar com cuidado as novas normas do Banco Central e do Conselho Monetário Nacional pensará muitas vezes se vale a pena gerar esse risco social de desemprego para atender um alinhamento que era normal no passado e hoje já não é mais tolerado, ainda mais em um momento de bonança em suas finanças. Seu risco de crédito aumentará só para atender uma meta descabida de eficiência além do risco de o investidor olhar para aquela ação de uma forma depreciativa – algo normal para os novos tempos.
Agora, investidores, empresas e bancos terão não apenas que dizer que são ESG, mas sim, cumprir obrigatoriamente a agenda ambiental e social para continuarem com crédito “na praça”.
Alexandre Furtado é Diretor de Relações Institucionais e ESG da Grant Thornton e presidente do CIESG – Comitê de Informações ESG – do Centro de Pesquisa em Contabilidade e Análise de Dados ARC A&A da Fundação Getúlio Vargas.
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