Economia
Argentina lança dólar ‘Vaca Muerta’; entenda como funciona
Objetivo, segundo a imprensa local, é garantir estabilidade cambial e financeira; país já conta com seis taxas de câmbio.
O ministro da Economia da Argentina e candidato à presidência do país, Sergio Massa, anunciou na terça-feira (26) a criação do dólar “Vaca Muerta”, informou a imprensa local.
Trata-se de um câmbio especial destinado aos exportadores de hidrocarbonetos. O objetivo, informou o veículo La Nacion, é tentar lançar US$ 1,2 bilhão no mercado cambial, que servirá para aumentar as reservas do Banco Central e dar “poder de fogo” ao governo para garantir a estabilidade cambial e financeira.
De acordo com a publicação, segundo fontes oficiais, a medida anunciada por Massa vai vigorar até 25 de outubro e poderá ser prorrogada até 25 de novembro, dependendo do sucesso do programa. Em contrapartida, as petrolíferas deverão respeitar o acordo de preços para o mercado local até 30 de novembro.
Objetivos
Segundo o jornal argentino Clarin, o dólar “Vaca Muerta” vai funcionar para:
- Promover olhar para o setor, para que feche o ano com investimentos recordes;
- Agregar liquidação cambial, para evitar nova corrida cambial no meio da eleição presidencial.
O benefício, noticiou o Clarin, para as empresas do setor de hidrocarbonetos significará que elas poderão liquidar 25% das suas exportações à taxa de câmbio de liquidação financeira, sem perder o acesso ao Mercado Livre e Único de Câmbio (MULC).
Tipos de câmbio
A economia argentina convive há anos com crise financeira, hiperinflação e câmbio desvalorizado. Na tentativa de evitar uma desvalorização ainda maior e a evitar a fuga de dólares do país, o governo argentino criou regras de câmbio.
Veja a seguir algumas das taxas mais usadas, segundo levantamento da Bloomberg publicado em 11 de agosto:
Oficial
Taxa: 287 pesos por dólar
A taxa de câmbio oficial é altamente restrita. Pessoas físicas só podem comprar US$ 200 por mês legalmente à taxa oficial, devem pagar três impostos que adicionam cerca de 80% ao custo.
Dólar blue
Taxa: cerca de 600 pesos por dólar
É taxa mais usada, com cotação diária, para transações em dinheiro vivo, nos fundos de lojas, bancas de jornal ou em escritórios discretos, ou algum conhecido disposta a vender seus dólares.
Blue chip
Taxa: 595 por dólar
A Argentina também tem taxas de câmbio flutuantes para investidores que compram ações e títulos. Para transações locais, é usada uma taxa de câmbio conhecida como “dólar MEP”, enquanto a blue-chip swap é utilizada para operações que terminam no exterior.
Cartão de crédito
Taxa: 523 por dólar
Usado para compras mensais abaixo de US$ 300, uma taxa de câmbio implícita que combina a taxa oficial com os três impostos cobrados nos cartões de crédito para compras em moeda estrangeira.
Dólar Qatar
Taxa: 598 por dólar
Para compras mensais acima de US$ 300 por mês, uma taxa de câmbio implícita que combina a taxa oficial com dois impostos e um terceiro tributo novo, de 25%. Ela surgiu quando milhares de argentinos viajaram ao Qatar para a Copa do Mundo, para assistir sua seleção ganhar seu terceiro mundial.
Dólar Coldplay
Tarifa: 374 por dólar
Os promotores de shows que contratarem artistas que cobram em moeda estrangeira pagarão um imposto de 30%, que é repassado aos fãs além do custo do ingresso. O nome pegou depois que a banda britânica fez 10 shows com ingressos esgotados em Buenos Aires no ano passado.
Dólar Malbec
Taxa: 340 por dólar
O dólar Malbec, também conhecido como dólar agrícola ou dólar da soja, refere-se a uma série de programas de câmbio fixo, implementados por períodos limitados no ano passado. O programa começou como uma tentativa de incitar os produtores a venderem seus estoques de soja para trazer dólares para o banco central. Atualmente, aplica-se aos produtores de sorgo, cevada e girassol, bem como os famosos vinhos.
Dólar lujo
Taxa: 575 por dólar
Os argentinos mais ricos que compram produtos de luxo como jatos particulares, carros esportivos, iates, relógios e álcool de primeira linha precisam pagar impostos adicionais de quase 100% sobre o preço dos produtos importados.
Dólar tech
As empresas de tecnologia podem reter 30% dos dólares de vendas adicionais no exterior em vez de ter que trocar por pesos, conforme a lei anterior. Os dólares são destinados aos salários dos funcionários.
Vale a pena investir na Argentina?
Com taxas de juros elevadas para 118% ao ano em agosto e as eleições se aproximando, Danielle Lopes, sócia e analista de ações da Nord Research, explica em relatório que o mercado financeiro, que naturalmente se antecipa aos movimentos futuros, aposta na mudança de política econômica positiva, o que justifica as fortes altas da bolsa de valores local.
O Índice Merval, também conhecido como Merval 25, principal índice de mercado de ações da Argentina, acumula alta de mais de 170% em 2023, ante mais de 9% do Ibovespa.
Lopes lembra ainda que, com um índice bastante concentrado em ações que ficaram descontadas ao longo do tempo, que sofreram bastante com a economia ruim, elas se recuperam antecipadamente com uma sinalização de melhora de mercado.
De acordo com a analista, a bolsa de valores da Argentina se tornou uma das melhores defesas contra a inflação no país e que as maiores altas estão concentradas nos setores que sofreram estímulos do governo.
“O mais interessante é que as empresas que contemplam o ranking estão em setores com alto grau de impacto na economia ruim da Argentina, como energia, e o restante bastante concentrado em commodities (alumínio, aço, petróleo e gás)”.
DANIELLE LOPES, ANALISTA DA NORD RESEARCH.
Com resultados mais impactados e/ou mais voláteis, “nos parece bem claro que essa alta não é nada sustentável”, complementa a analista.
Diego Hernandez, economista e especialista em investimentos e diretor da Ativo Investimentos, avalia que é possível realizar investimentos para capturar ganhos com juros e inflação na Argentina, entretanto, salienta que, além dos riscos de variação cambial, oscilação de mercado, há, sobretudo, o risco de crédito com uma grande possibilidade de inadimplência – seja do emissor soberano, seja de emissores privados.
“Para que esses riscos sejam mitigados, a melhor maneira de realizar esses investimentos é via fundos que tenham posições na América Latina e consequentemente na Argentina, assim o investidor se expõe ao risco de forma mais diversificada e com o suporte de um gestor profissional”, orienta o economista.
Olho nos resultados
Para a analista da Nord Research, investir na Argentina atualmente é buscar as “cigar butts” (bitucas de cigarro) de Warren Buffett, estratégia em que o investidor busca comprar ações a preços baixíssimos de empresas em dificuldade que deveriam valer mais do que o preço atual.
“Parece simples, mas é bastante arriscado, visto que as empresas que podem ser selecionadas não serão necessariamente as que possuem bons fundamentos, bons resultados. Boa parte das empresas possui dívida em dólar, o que gera mais imprevisibilidade quanto à solvência consequente da instabilidade da moeda”.
DANIELLE LOPES, ANALISTA DA NORD RESEARCH.
Investir na renda fixa argentina segue a mesma lógica, segundo a analista. Lopes explica que uma taxa de juros capaz de dobrar o patrimônio tão rapidamente parece atraente, mas o poder de compra é dilacerado com a alta inflação local.
“Kit Brasil”
Lopes avalia que o “kit Brasil” é bastante interessante e ainda mais seguro que o da Argentina: “manter uma parcela do seu patrimônio em CDI e aproveitar as barganhas locais da bolsa”, recomenda a analista da Nord Research.
“A filosofia de escolha fica mais simples quando isolamos de certa forma um risco cambial, político, fundamentalista. Ainda encontramos oportunidades de empresas que entregaram ótimos resultados e estão bastante descontadas, com um risco muito abaixo do que entendemos que correríamos ao investir em empresas argentinas”, destaca Lopes.
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