Economia
Eleições nos EUA: veja como o resultado da disputa pode influenciar a economia
A depender de quem sair vitorioso do dia 3 de novembro, entenda o que pode mudar no cenário global e no rumo dos seus investimentos.
Passado o último debate presidencial dos Estados Unidos, os postulantes ao mais alto cargo da república entram na reta final da disputa eleitoral. Só que — diferentemente de 2016, quando as pesquisas de intenção de voto feitas pela “CNN” mostravam uma liderança de apenas quatro pontos da candidata democrata Hillary Clinton sobre seu oponente, o então candidato Donald Trump —, em 2020, neste mesmo instante da campanha, Joe Biden aparece com uma vantagem de até 10 pontos sobre seu rival.
Além disso, a posição de Trump se inverteu em relação à disputa que o elegeu. De oposição com fortes características de outsider político, agora ele precisa defender o legado político dos últimos quatro anos no comando da Casa Branca. Ainda sem revelações capazes de reverter a tendência das pesquisas, como aconteceu no passado no caso dos e-mails de Hillary, o mercado passou a precificar maiores chances de uma vitória democrata.
Mercado aposta na onda azul
“Para nós, o cenário base é o Joe Biden ganhar”, explica Daniel Weeks, economista-chefe da Garde Asset Management. Embora os agentes do mercado financeiro façam suas apostas, as eleições americanas são mais imprevisíveis do que se possa imaginar. As pesquisas que apontavam vitória de Hillary Clinton em 2016 são difíceis de esquecer.
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Uma das incertezas repousa no fato de que as votações pelo correio, que já estão acontecendo e surtindo resultados a favor de Biden, possam ser contestadas judicialmente pelo presidente americano. Cabem também movimentações pela Suprema Corte, com maioria conservadora, com possibilidade de interferir no placar final. Trump já se mostrou disposto a confrontar o resultado caso saia derrotado das urnas.
A instabilidade é grande, uma característica marcante da gestão atual. Mas para além da eleição presidencial nos EUA, os investidores estão preocupados com qual partido conquistará maioria nas casas legislativas federais. Hoje com maioria na Câmara dos Representantes, os democratas têm a chance de roubar o protagonismo dos republicanos também no Senado.
“É o que chamaríamos de onda azul”, define a pós-doutora em Política Econômica Internacional, Neusa Maria Pereira Bojikian. Ela faz parte do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre os Estados Unidos (INCT-INEU), que congrega uma equipe multidisciplinar de pesquisadores de 17 universidades brasileiras.
Segundo Bojikian, a virada democrata é um processo mais longo e gradual que uma rejeição pontual ao presidente Trump. Ela usa o exemplo do estado do Texas, marcado pela produção de petróleo e gás, mas que agora se preocupa com uma transição energética sustentável e, por isso, vem mudando o perfil dos seus empregos junto da preferência partidária.
Já Weeks, que inclusive aposta na aceleração da transição energética em um futuro governo Biden, interpreta a onda azul como uma boa chance de governabilidade. Ele espera que com as duas casas alinhadas com Biden, seria possível aprovar um pacote fiscal ainda mais encorpado que o proposto pelo governo Trump, no valor de US$ 1,8 trilhões, para recuperar a economia norte-americana. Nas últimas semanas, a disputa política por trás do pacote tem cansado os investidores de Wall Street, assim como a economia global que espera uma retomada forte dos EUA.
Aumento de impostos?
Segundo Bojikian, é aceitável fazer um paralelo entre as eleições americanas, definida sempre entre democratas e republicanos, e a velha polarização das eleições brasileiras entre os partidos PSDB e PT. Apesar do embate agressivo, os apoiadores financeiros das campanhas distribuem para os dois lados.
Wall Street pode ter amado as renúncias e deduções de impostos sobre empresas feitas na reforma tributária de Trump, e ao mesmo tempo, ter horror a um eventual aumento de impostos na gestão Biden, mas no fim, os investidores apostam nas duas candidaturas.
Nesse contexto, não dá para enxergar Biden como o monstro que irá destruir o livre mercado. Por isso, Bojikian espera que se houver aumento de impostos, não será de imediato. “Ele [Biden] esperaria pelo menos uns dois anos para a economia se reestabelecer.”
De certa forma, Weeks percebe a mesma tendência. Perguntado se achava que Biden iria aglutinar propostas de outros candidatos democratas derrotados na prévias, como Bernie Sanders e a taxação de grandes fortunas, ele respondeu que seria pouco provável. “Durante a campanha com Trump, Biden só fez concessões ao centro”, aponta Weeks.
Sobre outro tema sensível, como as ações antitruste contra big techs como Google, Amazon, Apple e Facebook, Weeks acredita que não importa muito quem seja o vencedor da disputa, já que esses monopólios iriam se tornar um problema em qualquer governo. O que preocupa, sim, é no caso da vitória de Biden, surja uma movimentação para amarrar o sistema financeiro com regulamentações.
O que muda na relação com a China
Todos têm a expectativa de que a diplomacia com a segunda maior economia do mundo terá um tom mais ameno na possível gestão democrata, embora seja impossível negar a bipolaridade pela qual passam as relações internacionais sob a gestão de Trump, na concorrência por tecnologia, influência e domínio territorial.
Como uma voz do mercado, Weeks vê a provável saída de Trump como o fim de tweets da madrugada feitos pelo celular pessoal do presidente gerando fortes impactos nos negócios pela manhã. “Sem dúvida, vai trazer mais estabilidade”, diz.
Já Bojikian defende que a tensão entre EUA e China continuará inevitável e, portanto, aposta em uma mudança de estratégia em um eventual governo democrata. “Vivemos em um mundo globalizado, mas com forte atuação dos blocos econômicos”, explica. Para ela, Biden usará os blocos aliados, como a Europa, para fazer um contraponto ao chineses, diferente do isolacionismo de forte conteúdo nacionais de Donald Trump.