O Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos da América (EUA), inicia sua reunião de política monetária nesta terça-feira (21) e deve divulgar na quarta (22) se a taxa de juros no país se manterá no mesmo patamar ou se fará algum movimento.
Com a inflação ainda longe da meta (6% em 12 meses até fevereiro, contra o propósito de 2%) e as recentes crises de liquidez entre alguns bancos do país, agentes do mercado financeiro não têm um consenso sobre qual deve ser o rumo da taxa básica de juros norte-americana nesta reunião. Embora a maior parte do mercado precifique uma alta de 0,25 ponto percentual, há quem acredite que o Fed fará uma pausa no ciclo de aumento.
As medidas anunciadas pelo Fed, assim como outros bancos centrais pelo mundo, para conter os efeitos da crise bancária alteraram as previsões para os juros nos últimos dias. Nesta segunda-feira (20), os contratos futuros vinculados à taxa de juros refletiam uma probabilidade de aproximadamente 70% de uma alta de 25 pontos base, contra uma chance de cerca de 30% de nenhuma mudança.
Entre os especialistas ouvidos pelo InvestNews, o banco central norte-americano elevará a taxa de juros em 25 pontos base, colocando-a na margem de 4,75% a 5% ao ano, visto que a maior preocupação do Fed é que a inflação caia para a meta de 2%. No entanto, outros acreditam que as autoridades manterão a taxa de juros nos mesmos patamares, a fim de evitar que surjam novos problemas no setor financeiro.
“Eu acho que ainda não tem consenso em relação ao que o Fed deve fazer. Se por um lado a gente ainda tem a economia norte-americana bastante aquecida – o que levaria a crer que o mais correto seria manter o ciclo de alta de 25 pontos base por reunião –, por outro os problemas com os bancos regionais pode se agravar e contaminar setores que não estão mapeados pelos investidores.”
Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos.
Ainda que o cenário não esteja tão claro, Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, acredita que Fed subirá os juros, “sinalizando que os bancos regionais são um problema específico e contido, não oferecendo grandes riscos para o mercado norte-americano. Este ponto da sinalização é importante e deve ficar em linha com o que o Banco Central Europeu (BCE) fez semana passada”.
Do mesmo modo, Guilherme Morais, analista da VG Research, aponta que, de acordo com o CME Group, “a probabilidade de um aumento de 25 pontos base atualmente é de aproximadamente 80%, contra 20% de chance de não ocorrer um aumento”.
“Tão importante quanto a decisão em relação à taxa de juros, o mercado aguarda o pronunciamento que é feito por Jerome Powell, presidente do Fed. Pois o discurso até o início desta crise do setor bancário sempre foi com um tom mais austero, enfatizando a importância da manutenção do ritmo de elevação dos juros, a fim trazer a inflação para um nível mais próximo da meta de 2%.”
Guilherme Morais, Analista CNPI da VG Research.
Para Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management, o Fed vem enfrentando um dilema entre a necessidade de conter a inflação e assegurar a liquidez dos bancos. Porém, ele acredita que, neste momento, o banco central norte-americano priorizará conter novas crises do setor financeiro, ou seja, manterá a taxa de juros no mesmo patamar e encerrará o ciclo de aperto monetário.
Citando medidas do Fed para aumentar a liquidez e conter os efeitos da crise bancária, Julia Coronado, presidente da MacroPolicy Perspectives e ex-economista do Fed, disse à Bloomberg que isso é uma sugestão de pausa da elevação da taxa de juros no país.
“O fato de você estar envolvido em uma coordenação global com outras autoridades de bancos centrais para resgatar instituições e manter o fluxo de liquidez sugere apenas que uma pausa é provavelmente um melhor risco-retorno”, disse.
Ela ainda acrescentou que o banco central pode sinalizar que sua “intenção neste momento está focada em estabilizar a liquidez no sistema bancário”.
O que acontece em cada caso?
André Meirelles, Diretor de Alocação e Distribuição na InvestSmart XP, menciona que “a solução para cada um dos entraves é quase contrária”, já que os juros mais baixos tendem a assegurar a liquidez do sistema bancário, enquanto que os mais altos tendem a reduzir a liquidez da economia, “visando desaquecer a demanda por bens e, assim, controlar o avanço da inflação”.
“Existem dois cenários possíveis, a depender do teor de sua comunicação: os investidores podem interpretar com otimismo, entendendo que o patamar atual de juros é o suficiente para reduzir a atividade econômica e conter a inflação, sem causar grandes danos à economia; ou a interpretação pode ser de que o Fed está preferindo manter a inflação em um patamar mais elevado, para evitar qualquer chance de crise no sistema financeiro.”
André Meirelles, Diretor de Alocação e Distribuição na InvestSmart XP.
Komura, da Ouro Preto Investimentos, aponta para um maior risco de recessão ao aumentar a taxa de juros e, caso contrário, na condição de manutenção do indicador, uma maior necessidade de comunicação do Fed sobre o contexto e rumo da inflação.
“Com os juros subindo, mais problemas devem aparecer e aumenta o risco de recessão. Provavelmente virá algum fator que os investidores não estão olhando ou dando a devida atenção. Em caso de manutenção, é preciso fazer um grande trabalho na comunicação. Nos discursos, o Fed tem sinalizado que o problema está sob controle e que não é preciso entrar em pânico”, diz Komura.
Para Elcio Cardozo, sócio da Matriz Capital, o aumento persistente da taxa de juros poderá acarretar problemas muito maiores que a inflação já existente.
“O maior desafio para o Fed é controlar a inflação sem o aumento da taxa de juros. Algumas autoridades americanas já se pronunciaram que a população americana terá que aprender a conviver com a inflação por um período maior, uma vez que não há mais espaço para subida de juros da forma como estava precificado”, diz Cardozo, acrescentando que, antes das divulgações das crises bancária, esperava-se que o aumento da taxa de juros fosse de 50 pontos base.
Emprego nos EUA
Além da comunicação do Fed, investidores monitoram também os dados sobre o mercado de trabalho no país, em busca de pistas sobre o rumo da taxa de juros. Isso porque um mercado forte seria sinal de economia resiliente – ou seja, com mais espaço para aperto monetário (alta de juros).
Dados divulgados nos últimos dias mostram que a economia dos EUA criou empregos em um ritmo sólido em fevereiro. A abertura de vagas fora do setor agrícola norte-americano totalizou 311 mil empregos no mês passado, segundo o Departamento do Trabalho.
Economistas consultados pela Reuters previam a abertura de 205 mil empregos. Eles dizem que a economia precisa criar 100 mil vagas por mês para acompanhar o crescimento da população em idade ativa.
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