A França busca persuadir a Polônia a unir forças para bloquear um acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul que vem sendo construído há cerca de 25 anos.
O gabinete do primeiro-ministro francês Michel Barnier tem como objetivo convencer Varsóvia a formar uma coalizão contra o pacto do Mercosul, em meio a preocupações de que a Comissão Europeia – liderada por Ursula von der Leyen – esteja pressionando as negociações para fechar o acordo até o fim do ano. Países com um forte setor agrícola, como Áustria, Hungria e Irlanda, poderiam se alinhar com a França na objeção ao acordo, apontaram fontes próximas ao assunto.
A Polônia tem um histórico de proteger seu setor agrícola da concorrência estrangeira. No ano passado, o governo anterior impôs uma proibição unilateral às importações de grãos da Ucrânia, provocando um conflito diplomático com Kiev. O governo polonês não respondeu a um pedido de comentário.
“Não somos contra o livre comércio, mas esse acordo não é aceitável como tal”, disse o ministro francês para assuntos europeus, Benjamin Haddad, à Bloomberg, à margem de uma cúpula em Budapeste. “Quando impomos normas e padrões a nós mesmos, nossos parceiros comerciais devem fazer o mesmo, caso contrário, damos um tiro no próprio pé e prejudicamos nossos agricultores e empresas.”
O pacto comercial com o Mercosul — composto por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai — vem sendo adiado há bastante tempo foi acordado inicialmente em 2019, mas desde então a sua regulamentação tem sido postergada principalmente por objeções francesas.
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Duas pessoas próximas ao presidente Emmanuel Macron disseram que a tentativa francesa de bloquear o acordo continua sendo um tiro no escuro, pois, de acordo com as regras da UE, Paris precisaria de quatro estados-membros que representem pelo menos 35% da população para formar uma minoria de bloqueio.
A Alemanha, que representa cerca de um quinto da população da UE, é uma forte apoiadora do acordo, juntamente com a Itália e a Espanha. A economia alemã, em dificuldades e orientada para a exportação, poderia se beneficiar do acordo, pois abriria o mercado protecionista da América Latina para as exportações europeias, como máquinas e automóveis.
Enquanto isso, os fazendeiros franceses se opõem ferozmente ao acordo, pois temem que os exportadores sul-americanos possam prejudicar seus resultados com produtos mais baratos.
A França tem sido o principal oponente do pacto e continua a exigir “cláusulas espelho” que garantam que as restrições de produção que pesam sobre os agricultores europeus se apliquem a seus concorrentes do Mercosul, que têm padrões de saúde e ambientais menos restritivos.
Em resposta às preocupações francesas, a comissão está considerando um pacote de compensação para os agricultores franceses afetados pelo acordo, segundo pessoas familiarizadas com as negociações.
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Pascal Lecamp, legislador do partido de Macron e ex-executivo da agência de exportação francesa Business France, alertou que qualquer compensação financeira dificilmente apaziguará os agricultores que já estão lutando contra os preços baixos e o mau tempo. Lecamp faz parte de um grupo transpartidário de 209 legisladores da Assembleia Nacional Francesa que pediu que Macron rejeitasse o Mercosul.
“Amo o Brasil e sou um forte defensor do livre comércio, mas não a qualquer custo”, disse Lecamp em uma entrevista à Bloomberg. “Nenhum compromisso é possível no curto prazo, a menos que, por exemplo, o Brasil pare de usar antibióticos da noite para o dia.”
Os sindicatos de agricultores franceses convocaram manifestações para o final deste mês, já que fontes próximas às negociações dizem que a comissão poderia ter como objetivo assinar o acordo possivelmente já nos bastidores da cúpula do G-20 no Rio, em novembro.
A iniciativa da comissão de selar um dos maiores acordos de livre comércio de todos os tempos está repleta de riscos políticos. Von der Leyen provocaria uma guerra diplomática se ela pressionasse o acordo em um momento em que negociações de alto risco sobre o orçamento estão em andamento no parlamento francês, disse uma pessoa próxima ao governo francês.
Para Macron, o ímpeto renovado da UE para concluir o acordo não poderia ter vindo em pior hora, já que seu governo enfraquecido está lutando para equilibrar o orçamento de 2025 e pode enfrentar uma moção de desconfiança antes do final do ano.
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Bruxelas também poderia propor a implementação de parte do acordo de forma provisória para evitar um longo processo de ratificação que exige a aprovação de cada parlamento nacional.
A divisão significaria que a parte comercial do acordo seria “somente da UE”, ou seja, não exigiria a unanimidade dos Estados membros e somente a aprovação do Parlamento Europeu, pois abrangeria apenas as competências em nível da UE. Bruxelas espera que isso acelere a implementação do acordo, mesmo que a aprovação final do restante do acordo permaneça pendente. No entanto, ainda há preocupações de que essa medida de Bruxelas possa alimentar ainda mais o euroceticismo.
Lecamp chamou de “truque” antidemocrático a possibilidade de Von der Leyen dividir o acordo em dois e aprovar as principais disposições comerciais em uma base provisória, apesar da oposição da França.
Um funcionário da UE disse que a comissão está trabalhando para atender às preocupações de cada estado membro e insistiu nas proteções oferecidas pelo pacto.
Um porta-voz do escritório de Barnier se recusou a comentar sobre a estratégia de Paris para obter concessões no Mercosul, acrescentando que Macron e Barnier compartilham os mesmos objetivos de garantir padrões uniformes para os agricultores de ambos os lados e garantir que o acordo não se refira apenas ao acordo climático de Paris, mas também possa ser suspenso se o acordo não for respeitado.
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