No mesmo dia em que a 28º Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), a COP 28, terminou sem decretar o fim dos combustíveis fósseis, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realiza leilão para ofertar 38 blocos exploratórios.
Os lances acontecem em sessões públicas nesta quarta-feira (13), no Rio. Horas antes, em Dubai, 195 países assinaram um acordo no qual o mundo concorda que é preciso fazer uma transição energética para a redução do uso de combustíveis fósseis. No entanto, o texto não cita a eliminação dos mesmos, mas concorda que é preciso se afastar deles.
A meta é que isso ocorra até 2050. Porém, como observa o colunista de ESG do InvestNews, Alexandre Furtado, “o texto não deixou muito claro se até esta data os países terão de abandonar completamente a dependência de energias fósseis ou se ocorrerá uma redução gradual até que as energias limpas se tornem predominantes nas matrizes energéticas”.
A questão é que, aos olhos dos investidores, é preciso tornar os negócios em torno da “agenda verde” lucrativos. O comentário foi feito pelo bilionário Ray Dalio, fundador da Bridgewater Associates, durante a COP 28, nos Emirados Árabes Unidos. Segundo ele, o capital privado só pode financiar soluções climáticas “se os retornos fizerem sentido”.
Considerando-se a expectativa de que o leilão da ANP seja um sucesso, mesmo após a Petrobras (PETR3; PETR4) não declarar interesse pelos blocos do regime de partilha no certame, a exploração e produção de petróleo e derivados continua atraente. Para os blocos sob regime de concessão, 87 companhias se inscreveram.
Destas, 21 apresentaram declaração de garantia de que farão oferta. Gigantes do setor como BP, Shell, Qatar Energy, Chevron, TotalEnergies e Petronas apresentaram declaração de interesse, o que reforça o apetite estrangeiro por áreas de exploração no Brasil. Afinal, há dúvida sobre como ficam as petroleiras com a própria transição energética.
Transição de negócios
Trata-se de um desafio que as empresas do setor enfrentam, diante da necessidade de tornar suas operações menos poluentes, transformando-se cada vez mais em uma empresa de energia e deixando de ser apenas uma petrolífera. Aliás, essa transição se dá em nível global, em um movimento liderado justamente pelas potências no Golfo Pérsico.
O rumo tecnológico e estratégico escolhido pelas maiores empresas de energia do mundo foi seguido por suas equivalentes estatais de outros países. É o caso da ADNOC, do próprio Emirados Árabes Unidos, e da Saudi Aramco, da Arábia Saudita. Ambas se tornaram exemplo no mundo árabe – colosso das reservas naturais de hidrocarbonetos.
A abordagem dessas empresas se apoia em dois pilares. O primeiro não é nada ecológico e envolve investimentos pesados para expandir a produção de petróleo e gás natural até o fim desta década. Já o segundo pilar envolve o investimento de parte do lucro nas tecnologias de energia limpa, como o hidrogênio e a amônia “verde”.
Assim, em uma jogada estratégica, essas empresas do mundo árabe também pretendem ser os produtores mais limpos de combustíveis não-fósseis. Portanto, a guinada de negócios das petroleiras em meio à transição energética é uma questão de sobrevivência, à medida que o mundo caminha em direção ao desenvolvimento sustentável.
Aliás, a meta de triplicar os investimentos anuais em energias renováveis foi um dos destaques do texto final da COP 28. “Este compromisso parece refletir em grande parte as tendências atuais”, avalia o chefe de economia e pesquisa do Julius Baer, Norbert Rücker.
Para ele, a energia solar e a eólica tornaram-se uma fonte de eletricidade alternativa na maior parte do mundo, graças à redução dos custos e à melhoria da tecnologia.
“A realidade é que as soluções necessárias para atingir as emissões líquidas zero já existem hoje. Os obstáculos à sua aplicação muitas vezes não são os custos, mas sim hábitos de consumo rígidos e estruturas de mercado incrustadas”.
Norbert Rücker, chefe de Economia e Pesquisa do Julius Baer.
No Brasil, a Petrobras lidera essa transição. Depois de passar o período entre 2016 e 2022 com foco no petróleo, a estatal definiu, sob nova direção, que a entrada no segmento de energias renováveis é uma questão estratégica. Tanto que, recentemente, a empresa assinou acordos para estudos e projetos na área, entre eles com a Weg (WEGE3).
Talvez, por isso, a empresa tenha ficado de fora do leilão da ANP. Ainda assim, a expectativa é de que sejam concedidos 38 blocos para concessão, onde vence quem paga maior bônus de assinatura, e por partilha, que oferecem áreas do pré-sal e vencem quem oferta mais óleo à União.
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