O investidor estrangeiro alterou o alvo de seus aportes em ações brasileiras, com o setor de materiais básicos, que inclui mineradoras e siderúrgicas, deixando de ser o preferido desde o ano passado e virando foco de venda, enquanto o segmento financeiro mostrou tendência contrária, de acordo com dados inéditos da Neoway e da B3.
Entre 11 setores definidos pelo estudo, o de materiais básicos, que também engloba ações de empresas do setor de papel e celulose e petroquímicas, foi o único a ver um saldo líquido negativo de investimento estrangeiro tanto em 2022 (- R$ 5,5 bilhões) quanto neste ano até o fim de junho (- R$ 13,7 bilhões).
O movimento marca uma completa inversão de tendência frente a 2021 e 2020, quando o setor foi um dos únicos dois – junto ao setor de tecnologia da informação (TI) em 2021 e ao de petróleo, gás e biocombustíveis em 2020 – a ter desempenho positivo, de R$ 31,5 bilhões e R$ 28,7 bilhões, respectivamente.
Setor preferido
Com a saída de materiais básicos, quem parece ter assumido a cadeira de preferido dos estrangeiros foi o setor financeiro, que conta com papéis de bancos, operadoras de shoppings centers e seguradoras.
Após registrar o maior saldo negativo entre os segmentos analisados de 2019 a 2021, o setor teve a segunda maior entrada líquida no ano passado, com R$ 20,8 bilhões – atrás apenas de petróleo, gás e biocombustíveis, com R$ 22,5 bilhões, e exibia o maior saldo deste ano até o fim de junho, de R$ 11,3 bilhões. O estudo da B3 analisa os volumes a partir de 2019.
“Não acho que seja conjuntural”, disse Lika Takahashi, estrategista do Fator, sobre o setor de materiais básicos ter mostrado saldo inverso ao financeiro e à grande maioria dos setores na bolsa nos últimos quatro anos.
Ela afirmou que papéis ligados a commodities costumam apresentar certo descasamento de fluxo frente a outros pela forte influência da China – grande consumidora desses insumos -, e que um balanceamento pelos investidores entre diferentes setores é comum.
Presença do estrangeiro na B3
Investidores estrangeiros, representados por gestoras de ativos, bancos e outros agentes internacionais, representam mais de metade do volume de negociação anual na bolsa brasileira, segundo o estudo da B3, o que indica forte influência nas oscilações do mercado local.
Na bolsa como um todo, o saldo estrangeiro em ações foi negativo em 2020 (R$ 39,2 bilhões) e 2021 (R$ 6 bilhões), e positivo em 2022 (R$ 102,6 bilhões) e em 2023 até o fim de junho (R$ 17,3 bilhões), de acordo com o estudo.
O saldo líquido da entrada de recursos estrangeiros é calculado subtraindo-se as vendas das compras realizadas por investidores não residentes, em dado que não inclui recursos empenhados em ofertas de ações ou aberturas de capital (IPOs e follow-ons).
Empresas maiores fluxo maior
Embora os dados da B3 e da Neoway não revelem os saldos de investimento estrangeiro por ação, apenas setorial, Takahashi afirmou que são as empresas maiores que mais atraem os recursos externos.
“O estrangeiro vem primeiro para as empresas grandes, para as ‘large caps’, depois ele vai fazendo, digamos, um garimpagem melhor”, disse ela.
“Vale, Petrobras, grandes bancos realmente são a grande porta de entrada para o mercado brasileiro.”
A liquidez dos papéis e o fato de estarem incluídos no Ibovespa, o que gera demanda por parte dos ETFs (fundos de índice) que buscam replicar o índice, são alguns dos motivos que justificam esse movimento, segundo a estrategista.
Motivos
A saída de capital externo do setor de materiais básicos parece refletir, principalmente, o cenário ao longo dos anos para o minério de ferro, de acordo com Lucas Laghi, head de mineração e siderurgia, papel e celulose e bens de capital na XP Investimentos.
“É China e minério de ferro”, disse ele. A commodity é o maior negócio da mineradora Vale , cujos papéis representam quase 15% da carteira do Ibovespa.
Os preços do minério de ferro tiveram um salto entre 2019 e 2020, mas perderam força em meados de 2021, apresentando oscilação desde então, influenciados por fatores contrastantes como a expectativa de retomada da economia da China e, do outro lado, fraqueza no setor imobiliário chinês.
O estudo é resultado de um novo produto da B3 com a empresa de big data Neoway, que compila informações de mercados e possibilita que agentes de mercado realizem diferentes análises dos movimentos. A B3 comprou a Neoway em 2021 por cerca de 1,8 bilhão de reais.
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