O ex-operador de mesa do Credit Suisse em Nova York, Luiz Gustavo Mori, foi condenado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no processo em que foi acusado de usar a avó nonagenária, Mituco Haga, como laranja para lucrar com operações de “front running” (sair na frente, em tradução livre) na Bolsa brasileira entre junho de 2012 e abril de 2014. O esquema levantou R$ 1,84 milhão, distribuídos entre os envolvidos.
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Mori foi multado em R$ 500 mil. Além dele, foram condenados Rafael Spinardi Marques e sua empresa, a Catarsis Investimentos, em R$ 250 mil cada. Segundo a CVM, eles foram coniventes com as operações irregulares em troca de vantagens financeiras. Todos podem recorrer ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional.
No “front running”, um operador de mercado usa informações sobre uma ordem de compra ou venda de ações em bloco, capaz de influenciar o preço, em proveito próprio. A CVM considera essa uma prática não equitativa no mercado financeiro.
Operações atípicas de day trade
O esquema foi identificado pela área de Supervisão de Mercados da BM&FBovespa, que constatou operações atípicas de day trade – compra e venda de papéis no mesmo pregão – realizadas de forma sistemática pela idosa. Ao todo, foram 432 operações day-trade, com lucro em 311, no total de R$ 450,7 mil, uma taxa de sucesso de 72%.
Segundo o inquérito, Mori se valia do conhecimento prévio sobre operações realizadas por clientes do Credit Suisse Brasil para se antecipar a elas e ganhar na outra ponta.
Entre as evidências de irregularidades apontadas está o perfil incompatível da senhora Mituco com o grau de sofisticação das operações. Estreante na bolsa aos 92 anos, algo por si só atípico, a avó de Mori realizou operações arrojadas com small caps (papéis de baixa liquidez), usando tecnologias como home broker, celular e tablet.
Além disso, as ordens rastreadas eram dadas a partir dos Estados Unidos, onde vivia o neto de Mituco, e a improvável concentração de ordens tendo como contrapartes clientes do Credit Suisse.
Cruzamento de dados
Na investigação, a CVM cruzou dados bancários que revelaram a transferência de recursos e depósitos realizados por Spinardi na conta de Mori, de sua avó, de seu pai e de outros funcionários do grupo Credit Suisse. A Catarsis era usada para movimentar o dinheiro entre as contas de Spinardi e de terceiros.
Para a diretora da CVM, Flávia Perlingeiro, relatora do caso, as provas diretas e indiciárias comprovaram que Mori tomava conhecimento de grandes ordens dos clientes no exercício de sua função e executava estratégias de “front running”, dando ordens em nome da avó, de Spinardi e da Catarsis.
Para evitar escapar do monitoramento de seu computador na corretora, Mori usava seu telefone celular. Sobre Spinardi, ela disse em seu voto que “ficou evidenciado que ele atuou com Mori na concepção do ilícito, ao permitir uso de conta de sua titularidade e de sua empresa”.
A CVM absolveu Bruno Guisard, suspeito de ser informante de Mori em operações semelhantes com clientes do fundo Deutsche Bank AG London.
A defesa de Mori afirmou no processo que o termo de acusação não foi capaz de comprovar a existência de irregularidades concretas contra seu cliente, nem que o mesmo operou em nome da avó ou que teve acesso a informações privilegiadas.
No julgamento, o advogado Caio Rossetti afirmou que após uma “exposição midiática fervorosa” do caso, seu cliente foi “demitido, expulso e escorraçado do mercado financeiro” e teve que se mudar para os Estados Unidos, onde passou a atuar no mercado de seguros. Segundo a defesa, um inquérito instaurado pela Polícia Federal sobre o caso foi arquivado.
O Broadcast questionou por e-mail se Mori recorreria, mas não recebeu resposta até o fechamento dessa reportagem. Spinardi e Catarsis não constituíram advogado.