A companhia aérea Gol (GOLL4), em recuperação judicial nos EUA (Chapter 11), perdeu desde o dia 25 de janeiro até esta terça-feira (30) 53,6% de seu valor de mercado. Segundo a Economatica, a companhia aérea era avaliada em R$ 2,78 bilhões em 24 de janeiro, ante R$ 1,29 bilhão agora. Em valor nominal, a perda foi de R$ 1,5 bilhão – maior que seu valor atual.
O endividamento de R$ 20,176 bilhões da companhia é 15 vezes maior que seu valor de mercado.
Nas negociações intradia, as ações listadas na B3 recuavam perto de 27%, cotadas a R$ 2,92 por volta de 18h. Hoje é o último dia em que os papeis farão parte dos índices acionários da bolsa brasileira (IBOV, IBRA, IBXX, ICO2, IDVR, IGCT, IGCX, ITAG, IVBX e SMLL), o que tende a reduzir a liquidez. Logo, o motivo da pressão sobre a cotação.
Analistas do Bradesco BBI apontaram em relatório o risco de diluição da companhia e, por isso, recomendam a venda das ações.
Segundo a B3, os papeis da GOL seguirão sendo negociados normalmente, mas passarão a ser listados sob o título de “Outras Condições”.
A New York Stock Exchange (“NYSE”) também suspendeu a negociação das American Depositary Receipts da Companhia (as “ADSs”), assim como fez pedido de cancelamento da listagem dos papeis à Securities and Exchange Comission (SEC).
Segundo Fabrício Gonçalvez, CEO da BOX Asset Management, vale ressaltar que a situação da Gol não é inédita entre companhias aéreas. “Em 2020, a Latam entrou com o mesmo pedido no Tribunal dos EUA. Antes dela, outras companhias foram Delta e United Airlines”.
“Espera-se que a Gol apresente em seguida um plano de restruturação de dívida, com detalhes sobre pagamentos e financiamento, e cabe aos credores decidirem se aprovam ou não”.
Credores e direito dos acionistas minoritários
A companhia deve para mais de 50 mil credores, com o banco BNY Mellon, Aeronáutica, Vibra Energia e Boeing encabeçando a lista. O primeiro tem a receber o maior montante (US$ 539,9 milhões).
10 maiores credores da Gol
Credor | Valor em US$ milhões |
BNY Mellon | 539,9 |
Comando da Aeronáutica | 222,5 |
Vibra | 91,4 |
Boeing | 15,2 |
Infraero | 15 |
CFM International | 13,5 |
Concessionária Aeroporto de Florianópolis | 11,9 |
SEC | 9,3 |
Ministério da Fazenda | 7,3 |
Sabre | 5,6 |
A base pulverizada de credores pode dificultar a aprovação em assembleia geral do plano de reestruturação de dívida que a Gol deverá propor, segundo Gonçalvez, mesmo com a agilidade da Justiça americana. A aérea carece do aval de mais de dois terços da sua base, que se aprovado, a companhia terá um prazo para colocar em prática.
No caso dos acionistas minoritários, estes são também sócios da companhia e logo acabam tendo de arcar com o ônus da mesma forma que majoritários, segundo o analista. Dessa forma, pode-se perder o valor investido.
Ainda assim, nada inviabiliza que os acionistas entrem na Justiça para reaver algum valor, desde que haja saldo ou ativos restantes a serem divididos.
Segundo Luiz Deoclecio Fiore de Oliveira, presidente da OnBehalf Brasil Consultores e Auditores, as perdas dos minoritários pode ser significativa, dado o prazo indefinido para que os papeis se recuperem em bolsa. “Muitos acionistas acabam realizando o prejuízo sem aguardar um desfecho final de uma eventual valorização”.
Já quanto a possíveis diferenças entre as regras americana e brasileira em casos de recuperação judicial, o tributarista aponta que na verdade há semelhanças, uma vez que muitos procedimentos adotados na lei brasileira se baseiam no processo americano. Um exemplo é a Absolute Priority Rule – que leva a uma prioridade de credores ante os investidores em caso de falência.
Outro ponto destacado pelo jurista é o financiamento aprovado para a Gol, o “debtor in possession” (DIP), onde há uma proposta de aporte dos próprios acionistas. “Mas isso tende a diluir as ações dos minoritários, disse.
Analistas do BBI fazem corro apontando que a reestruturação de passivos na casa dos R$ 25 bilhões provavelmente deve eliminar os acionistas minoritários devido à conversão de US$ 2,3 bilhões de dívida em ações.
O valor é resultado da soma dos US$ 950 milhões de financiamento (DIP), US$ 1,2 bilhão relacionados aos títulos de dívida ESSN de 2028 e US$ 100 milhões em passivos de arrendamento de aeronaves.
Já um ponto que diferencia a Justiça americana da brasileira – e que é positivo para a Gol – é a segurança jurídica que os contratos internacionais têm. Segundo o presidente da OnBehalf, dívidas relacionadas a contratos de arrendamento tem uma espécie de “blindagem” contra a retomada das aeronaves pelos arrendadores.
“Tivemos o caso da Latam que entrou em recuperação pelo tribunal dos Estados Unidos e de certa forma teve um processo exitoso de negociação e continua operando”, disse.
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