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Finanças

Falência da FTX: quais são os direitos do investidor e como proceder

Corretora de criptomoedas fez solicitação de falência nos Estados Unidos em novembro.

No início de novembro, investidores foram pegos de surpresa com o pedido de falência feito pela segunda maior corretora de criptomoedas do mundo, a FTX. De acordo com advogados consultados pelo InvestNews, quem tinha valores alocados na plataforma tem direito judicial ao ressarcimento, porém, pelo momento da corretora, pode ser difícil conseguir reavê-los. 

criptomoedas

Uma publicação da CoinDesk revelou que os fundos dos investidores na FTX estavam sendo usados para a realização de operações alavancadas na Alameda Research, braço de investimentos do mesmo grupo da corretora FTX.

Quando essa informação chegou ao conhecimento dos investidores, junto a um balanço patrimonial da Alameda que revelava que cerca de US$ 14,6 bilhões eram mantidos em FTT,  token nativo da plataforma, com receio de perderem seus valores depositados na plataforma, os clientes da corretora iniciaram uma corrida para sacar os recursos. 

Pelo fato de não possuir dólares suficientes para arcar com todos os saques, a FTX entrou com pedido de falência nos Estados Unidos do Capítulo 11. Nestes casos, ele acontece quando a empresa espera poder reestruturar suas operações e pode continuar com elas no dia a dia em vez de liquidar os ativos. 

Direitos dos clientes da FTX

Rodrigo Caldas de Carvalho Borges, sócio do Carvalho Borges Araújo Advogados, explica que, considerando que os clientes não foram informados das práticas da FTX e não estavam cientes dos riscos envolvidos por manter ativos na plataforma, eles têm o direito de buscar judicialmente a restituição dos valores perdidos.

Caldas alerta, no entanto, que, pelas informações divulgadas até o momento, a FTX protocolou pedido de falência perante à justiça americana, demonstrando a insolvência da FTX, o que pode dificultar que todos os investidores sejam ressarcidos.

Na mesma linha, o advogado André Portugal, sócio do Klein Portugal Advogados, destaca que o processo da FTX equivale a uma recuperação judicial tramitando nos Estados Unidos, em que os credores podem, em tese, habilitar-se e passar a integrar a lista de credores oficiais da empresa, que promete pagá-los, mas, no entanto, tende a ser custoso e os seus resultados serão dependentes da solvência da FTX, isto é, da capacidade de que ela pague todos os credores. 

“As evidências que atualmente se têm indicam que não há patrimônio para pagar todos. Então, a estratégia deve se concentrar em obter a responsabilização no Brasil. E, para isso, há um conjunto de regras jurídicas que tornam viável a responsabilização em virtude desses ilícitos praticados pela FTX contra investidores”, explica Portugal.

Medidas legais

Crédito: Freedomtumz

Caldas explica que os investidores podem propor medida judicial em face da FTX, contudo, é necessário observar os termos dos contratos e as situações específicas, sobretudo diante das diferentes jurisdições que podem estar envolvidas.

Portugal aponta que uma opção seria a habilitação como credores nos autos da recuperação judicial em trâmite nos Estados Unidos, mas que essa medida parece, no entanto, muito custosa e desprovida da segurança necessária quanto ao recebimento.

“A alternativa seria o ajuizamento de ação no Brasil visando a reparação dos valores pelos responsáveis. É importante que, em qualquer caso, hajam o quanto antes, pois se sabe que esses casos são marcados por operações de ocultação patrimonial e por uma concorrência exponencial entre credores”, orienta o sócio do Klein Portugal Advogados.

Expectativas para o caso FTX

Na avaliação de Caldas de Carvalho Borges, pelas notícias divulgadas, é muito provável que a FTX não tenha recursos suficientes para restituir todos os investidores prejudicados. Dessa forma, segundo o advogado, a adoção das medidas judiciais no âmbito cível para ressarcimento dos valores perdidos enfrentará a dificuldade de encontrar patrimônio da FTX para fazer frente à dívida com seus clientes, além da discussão quanto à competência territorial para analisar a questão. 

Caldas destaca ainda que, em paralelo às medidas no âmbito cível, investidores estão buscando a responsabilização criminal dos gestores da FTX pelas práticas fraudulentas e prejuízos aos investidores.

O advogado André Portugal, sócio do Klein Portugal Advogados, explica que é preciso, ao mesmo tempo, agilidade e paciência, pois a recuperação dos valores, caso aconteça, não acontece do dia para a noite. 

Qual é mais seguro: wallet ou exchange?

 É por meio de uma wallet (carteira) de criptomoedas ou exchange que investidores de ativos digitais podem fazer o gerenciamento de suas criptomoedas.

No caso das wallets, elas servem para o armazenamento e gestão das chaves públicas e privadas que dão acesso a qualquer criptomoeda na blockchain. São dois os tipos de wallets para criptomoedas: as chamadas hot wallet (carteira quente) e cold wallet (carteira fria).

A hot wallet fica na internet, podendo ser acessada de qualquer lugar. Já no caso da cold wallet, ela permanece offline. Dessa forma, precisa ser baixado e instalado, não sendo possível acessar as criptomoedas a partir de outro local. 

Felipe Medeiros, analista de criptomoedas e sócio da Quantzed Criptos, explica que, no caso de wallet, se tem uma custódia que ainda não é muito fluida e oferece riscos relacionados ao manuseio, como em relação à senha da conta.

“Essa questão de usabilidade ainda muito complexa é a grande desvantagem das wallets, sendo a maior vantagem delas a custódia própria”, diz Medeiros.

Rodrigo Cohen, analista CNPI e co-fundador da Escola de Investimentos, destaca que as vantangens que  o investidor tem com a wallet é não ficar exposto a uma possível quebra da exchange. Já a desvantagem estaria no caso de a senha da wallet ser hackeada.

No caso da exchange, Medeiros aponta que a vantagem é que ela elimina o risco de uso e o investidor tem uma experiência mais facilitada. No caso de desvantagem, segundo o especialista, está o risco de custódia, por possível fragilidade em questão de liquidez.

O advogado André Portugal acrescenta que é necessário que o investidor confira se a exchange adota políticas de transparência e responsabilidade com a custódia de valores, assim como se tem regras de compliance, inclusive, para aceitar investidores. 

Helena Margarido, co-founder e head de research da Monett e Advisor da Kodo Assets, orienta que, para o investidor depender o mínimo possível de exchanges para não perder dinheiro em caso de falência, a primeira coisa é guardar as criptomoedas em uma carteira digital onde só ele possua a chave privada e, se negociar dentro de uma corretora centralizada (exchange), fazer a negociação e transferir para a carteira digital própria.

Rodrigo Cohen, analista CNPI e co-fundador da Escola de Investimentos, recomenda que, se o prazo de investimento for longo, vale a pena colocar as criptomoedas em wallet, especialmente em uma física. Já se o prazo for menor, e caso o investidor tenha necessidade de mudar de uma exchange para outra, Cohen recomenda que vale a pena colocar em uma exchange.

Empresas regulamentadas: a regra muda?

Em maio deste ano, por exemplo, o Nubank anunciou o lançamento do Nubank Cripto, para comprar e venda criptomoedas direto no aplicativo do banco digital.

O advogado André Portugal, sócio do Klein Portugal Advogados, explica que a diferença legal principal de ter criptomoedas em uma exchange e em uma instituição financeira regulamentada é que a regulação estabelece as regras, tendo a função de trazer segurança aos investidores e ao mercado em geral. 

“Em um mercado regulado, como acontece com o mercado financeiro, o investidor tem a segurança de que toda empresa autorizada a operar teve que seguir determinadas regras, sujeitou-se a uma fiscalização prévia e deve, permanentemente, seguir regras de transparência que, se corretamente aplicadas, deverão impedir algum tipo de colapso. No caso dos mercados bem regulados, o investidor tem a segurança de que, em último caso, haverá uma autoridade reguladora para mitigar os danos”, diz Portugal.

Marco regulatório dos criptoativos no Brasil: mais segurança?

A Câmara dos Deputados aprovou no dia 29 de novembro o texto-base do Projeto de Lei que regulamenta o setor de criptoativos no Brasil.

O projeto aprovado estabelece diretrizes gerais para a prestação de serviços de ativos virtuais, como a livre concorrência e atenção às regras de prevenção à lavagem de dinheiro e para a regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais. O projeto ainda inclui os crimes relacionados à negociação de criptoativos no Código Penal.

Hoje, a negociação de criptomoedas é permitida no Brasil, mas não há nenhuma legislação específica sobre o tema.

Caldas explica que o Marco Legal das Criptomodas é um grande passo para o desenvolvimento do setor, estabelecendo os pilares para desenvolvimento do mercado e colocando o Brasil na vanguarda em termos de regulação dos criptoativos, com possibilidade de atrair investidores institucionais que buscam por mercados regulados.

O sócio do Carvalho Borges Araújo Advogados acrescenta ainda que, como a lei estabelece apenas as diretrizes gerais de funcionamento do mercado, deixa muitas questões em aberto que ficarão a cargo da regulamentação específica, portanto, os investidores não deverão sentir efeitos imediatos pela simples publicação do Marco Legal. 

“Aprovação do Marco Legal encerra um capítulo muito importante, mas não coloca fim ao processo regulatório do setor de criptoativos. É fundamental colaborarmos e acompanharmos de perto as regulações que serão editadas pelo Banco Central”, diz Caldas.

O advogado Felipe Américo Moraes diz entender que, apesar de a lei não prever a “segregação patrimonial”, ou seja, que o patrimônio do investidor não seja confundido com os ativos da empresa, isso não significa que ela não existirá. 

“Nesse contexto, entendo ser possível que essa autoridade reguladora determine, mediante instrução normativa, que os provedores de serviços de ativos digitais devam realizar a ‘segregação  patrimonial’. Ou, ainda melhor: preveja exatamente quais as classes de provedores que necessitam dessa segregação, considerando suas particularidades”, diz Moraes.

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