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Finanças

Gestores e traders precificam risco de turbulência em eleição brasileira

Número crescente de agentes do mercado começou a se posicionar para cenário semelhante a invasão do Capitólio.

22/10/2018 REUTERS/Rodolfo Buhrer

Pode não ser o cenário-base de ninguém, uma possibilidade remota no máximo. Mas um número crescente de traders e gestores começou a se posicionar para a chance de alguma turbulência na esteira da eleição presidencial de outubro no Brasil.

A preocupação, parcialmente alimentada pelos protestos e invasão do Capitólio nos Estados Unidos por eleitores do ex-presidente Donald Trump em janeiro de 2021, é a de que o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores poderiam contestar o resultado das urnas caso ele seja derrotado por uma pequena diferença, levando a algum tipo de tensão social violenta.

A ideia circula há meses entre brasileiros comuns, particularmente o contingente social progressista que se opõe de maneira mais estridente a Bolsonaro. Agora, passou a aparecer em mesas de operações da Faria Lima e escritórios de gestoras no Leblon, especialmente com as pesquisas apontando que Bolsonaro está reduzindo sua desvantagem em relação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sugerindo uma disputa mais acirrada do que o que o mercado esperava anteriormente. 

Stuhlberger: alerta para riscos

Luis Stuhlberger, uma lenda nos círculos de investimento no Brasil por conta dos ganhos de mais de 20.000% de seu fundo Verde ao longo das últimas décadas, pode ter sido o primeiro gestor proeminente a citar o risco publicamente. Stuhlberger chamou o cenário de um risco “banana republic” em um evento no mês passado. 

“O problema agora é que a gente tem um risco que eu não sei precificar nos ativos brasileiros que é o risco de o Lula ganhar por uma pequena diferença de margem do Bolsonaro”, disse Stuhlberger, em um painel em que falava a outros pares e investidores de varejo. Ele deu como exemplo um cenário de crise política que poderia durar duas ou três semanas após a eleição. 

Assim como traders que falaram com a “Bloomberg News” – pedindo o anonimato por se tratar de um assunto delicado –, Stuhlberger deixou claro em seus comentários que ele espera que a eleição ocorra de maneira ordenada. Mas o gestor acrescentou que o risco contribui para que ele segure apostas em queda das taxas de juros futuros e do dólar.

Os apoiadores de Bolsonaro dizem que a ideia não faz sentido, e sugerem que até mencionar o risco é um jeito de prejudicar o candidato que busca a reeleição. O governo não respondeu a pedido de comentário enviado para a secretaria de Comunicação da presidência. Contudo, os críticos dizem que o presidente alimentou muito desse receio após lançar dúvida sobre o sistema eletrônico de voto. Bolsonaro tem prometido que vai aceitar os resultados — “desde que a eleição seja limpa”.

Um termômetro para esse risco de cauda é o feriado de 7 de setembro, quando apoiadores do presidente planejam manifestações em diversas cidades. A data acabou ganhando uma nova proporção desde quando Bolsonaro assumiu o poder.

No ano passado, ele apareceu em uma manifestação na Avenida Paulista, em São Paulo, e criticou o juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, que havia autorizado investigações contra Bolsonaro e aliados. Os comentários bélicos — e suas implicações para o respeito a decisões do Judiciário — azedaram o humor com os ativos domésticos naqueles dias.

“Pode haver algum barulho após a eleição e as manifestações do dia 7 de setembro serão um bom teste para o quanto isso pode ser relevante para os mercados”, disse José Tovar, CEO da Truxt Investimentos, que administra cerca de R$ 18 bilhões.

Gestores protegem carteiras

Reinaldo Le Grazie, ex-diretor do Banco Central e agora sócio da gestora Panamby Capital, diz que seu fundo tem posições vendidas em bolsa brasileira em parte por preocupações sobre a inflação, mas também pelo risco de uma turbulência eleitoral.

“O Bolsonaro copiou o Trump em quase tudo, então por que o 6 de janeiro não pode se repetir aqui também?”, Le Grazie disse em entrevista. “Vai ser uma eleição tensa e os dois lados são bastante belicosos. Se a margem for pequena, o risco é maior.”

A Safari Capital está protegendo seu portfólio em bolsa utilizando opções por conta de razões similares. Uma turbulência pós-eleição “não é nosso cenário-base, mas o risco existe”, disse o sócio-fundador Marcelo Cavalheiro. 

Enquanto os investidores concordam que uma crise política seria negativa para os ativos brasileiros, assim como para o país, eles estão divididos sobre o melhor candidato para o mercado. É esperado que Lula aumente o grau de influência do estado sobre a economia, mas sua imagem mais positiva no cenário internacional poderia ajudar a atrair a entrada de recursos. 

As principais pesquisas de opinião têm mostrado que Lula mantém uma liderança significativa sobre Bolsonaro, embora sua vantagem tenha encolhido desde o início do ano. As chances de Lula vencer a disputa no primeiro turno diminuíram e um segundo turno se tornou o desfecho mais provável, segundo os gestores. A mais recente pesquisa DataFolha mostrava Lula com 45% das intenções de voto no primeiro turno, enquanto Bolsonaro tinha 32%. 

Manifestações

A Legacy Capital estará monitorando as manifestações de 7 de setembro como um teste para a popularidade de Bolsonaro. “Tem o risco de ser muito forte, o que seria positivo para Bolsonaro”, disse Gustavo Pessoa, sócio-fundador da gestora. 

Mesmo se houver algum tipo de confusão após o pleito, ainda não é exatamente claro qual seria a reação do mercado. O índice S&P 500 subiu no dia 6 de janeiro do ano passado, e nos dois dias seguintes após a invasão do Capitólio. A democracia brasileira, no entanto, é mais jovem e mais frágil, enquanto os mercados locais tendem a ser mais voláteis.  

Apesar dos riscos, os estrangeiros têm aumentado suas apostas positivas com Brasil nas últimas semanas, despejando US$ 3,2 bilhões nas ações brasileiras na B3 em agosto. Fundos locais e não-residentes reduziram posições compradas em dólar em cerca de US$ 1,3 bilhão cada no mesmo período, sinalizando o desejo de apostar em um desfecho positivo não importa o vencedor da disputa. 

Ainda assim, isso não significa que investidores globais estão alheios ao risco de turbulência. 

“Com Bolsonaro, não é apenas sobre questões econômicas, mas questões pessoais — é o jeito como as pessoas reagem a ele”, disse Richard Hall, analista de dívida soberana da T. Rowe Price, que tem US$ 13 bilhões em ativos de renda fixa emergente sob gestão. “Estou mais preocupado com o que vai vir depois da eleição neste momento.”

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