A cotação internacional do petróleo ficou negativa pela primeira vez na história nesta segunda-feira (20), na maior queda já vista em um único dia. A baixa acontece em meio ao colapso na capacidade de estocar a commodity, diante da freada abrupta na demanda com a ameaça da Covid-19 (coronavírus) sobre a atividade global.
O contrato do barril de petróleo tipo WTI para maio na New York Mercantile Exchange (Nymex), fechou em queda de 305,97%, a US$ -37,63 o barril. Com isso, os fornecedores estão sendo pagos para não se desfazer da commodity. Isso é chamado, no mercado, de “contango” – quando os contratos de petróleo ficam mais caros que os preços à vista.
Mas isso é possível? Segundo a própria CME, sim. Ele chegou a operar negativo em US$ 7,28 por barril, na esteira do que seria a pior crise econômica desde 1929, como reiterou hoje o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Com o excesso de oferta e sem ter onde estocar os barris, o petróleo despencou diante da perspectiva de que os cortes na produção não fazem mais efeito para segurar os preços. Os produtores correram para vender suas opções de compra e a cotação foi ao chão.
Essa queda vertiginosa foi vista nos contratos de curtíssimo prazo, com vencimento em maio. Os analistas acreditam que os contratos mais longos já trarão uma correção dos preços, já que os investidores transferiram os contratos que expiram nesta terça-feira (21) para os meses seguintes.
Apesar do acordo entre membros da Opep e aliados para corte na produção na última semana, a leitura é de ele chegou tarde demais e perdeu o sentido com a freada global na demanda pela commodity no curto prazo. “A demanda chegou a cair 30%, e o corte foi de apenas 15% [10 milhões de barris por dia] da produção global”, explicou o analista de investimentos da Easynvest, José Falcão Castro.
Nos EUA, muitas refinarias passaram a rejeitar os barris, à medida que elas perderam a capacidade de estocar o “ouro negro” no curto prazo. Com os produtores ao redor do mundo continuando a extrair petróleo, houve uma corrida para vender entre os negociadores que não têm acesso aos estoques.
No estado americano do Texas, por exemplo, há relatos de que as refinarias já estavam oferecendo algo em torno de US$ 2 pelo barril, aumentando a possibilidade de que os produtores precisassem pagar para conseguir se livrar do excedente. Na Ásia, os banqueiros ficaram cada vez mais relutantes em dar crédito aos players do setor, à medida que crescem os temores de calote.
O economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira, acredita que a matriz de custo do petróleo tradicional americano não se sustenta sob os atuais níveis, abrindo espaço para falências em série no setor. “O duro golpe do Covid-19 na atividade econômica global afundou a demanda por energia, em especial com a restrição generalizada de locomoção”, escreveu em relatório.
À Bloomberg, o presidente da Strategic Energy & Economic Research Inc, Michael Lynch, afirmou que o patamar psicológico da cotação do petróleo, daqui em diante, é de “uma queda massiva”. “O mercado está preocupado com tanto acúmulo de estoque que será muito difícil resolver isso no curto prazo. Estão tentando se livrar do petróleo e não há compradores”.
E a Petrobras?
Vieira, da Infinity Asset, explicou ao InvestNews que a cotação da Petrobras (PETR4; PETR3) não sofreu tanto porque o petróleo negociado pela estatal é atrelado à cotação do contrato do Brent, de Londres. O Brent encerrou o dia em baixa de 8,94%, a US$ 25,57 o barril. No começo do ano, a cotação estava acima de US$ 65.
As ações preferenciais da petroleira (PETR4) recuaram 1,12%, cotadas a R$ 15,95 nesta seção.
A queda do Brent já vinha colocando pressão sobre novos reajustes dos combustíveis pela Petrobras. Nesta segunda-feira (20), a estatal anunciou um corte de 8% no preço da gasolina e de 4% no diesel distribuído nas refinarias, a partir de terça-feira.
Hoje, a Petrobras trabalha com a paridade de preços dos combustíveis no mercado internacional. Quando os preços do petróleo caem lá fora, a estatal repassa a variação da gasolina e do diesel para as refinarias. Estas, por sua vez, decidem se reduzem ou não os preços para o consumidor final, nos postos de combustível.
Por um lado, a queda dos combustíveis no Brasil ajuda a reduzir os custos energéticos e de transportes. Por outro, isso reduz a competitividade da Petrobras, já que os custos de produção ficam mais apertados, diante de uma receita menor.