Vista como uma poupança a longo prazo, a previdência privada é uma opção para quem quer assegurar uma aposentaria no futuro. Mas, e se o titular morrer antes de fazer o resgate de todo o dinheiro aplicado? A previdência privada entra no inventário?
Os planos de previdência privada, como o PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) e o VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre), geralmente não integram o inventário porque são considerados produtos de natureza securitária, semelhantes a seguros de vida.
“Isso significa que os valores são pagos diretamente aos beneficiários indicados pelo titular, sem necessidade de sua inclusão no processo de inventário”, explica Morvan Meirelles Costa Junior, sócio fundador do Meirelles Costa Advogados.
Marco Antonio Frabetti, coordenador do curso de direito da Strong Business School, destaca que o processo de inventário é um procedimento judicial ou extrajudicial utilizado para apurar, descrever e partilhar os bens, direitos e dívidas deixados por uma pessoa que faleceu para seus herdeiros.
“Estes herdeiros ou beneficiários podem acessar os valores acumulados em um plano de previdência privada (PGBL ou VGBL) do titular falecido de acordo com as condições previstas no contrato estabelecido com a instituição de previdência privada”, diz Frabetti.
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Quem deve receber?
Os recursos da previdência privada devem ser pagos diretamente aos beneficiários indicados no contrato pelo titular, sem necessidade de sua inclusão no processo de inventário.
Se não houver beneficiários designados, os valores podem integrar o inventário e ser distribuídos aos herdeiros legais.
Meirelles explica que não é necessário seguir a ordem de herdeiros legais. “No entanto, não é incomum que sob a alegação de fraude e desvio de finalidade, como tentativa de evitar a partilha de bens, haja contestação judicial da sua não inclusão no processo de transmissão de herança”, afirma.
Herdeiros necessários (como filhos e cônjuge) que se sintam prejudicados podem questionar judicialmente a destinação dos recursos. “Se for comprovado que o titular utilizou o plano de previdência para burlar a legítima [parte da herança reservada por lei aos herdeiros necessários], a Justiça pode determinar a inclusão dos valores no inventário para partilha”, diz João Henrique Gasparino, sócio do Grupo Nimbus.
Os beneficiários designados nos planos de previdência privada têm o direito de receber os recursos diretamente da entidade previdenciária, sem necessidade de aguardar a conclusão do inventário, segundo Gasparino. Para isso, devem:
- Notificar a instituição financeira sobre o falecimento do titular, apresentando a certidão de óbito e documentos pessoais
- Fornecer a documentação exigida, que pode incluir RG, CPF, comprovante de residência e outros documentos solicitados pela instituição
- Aguardar o processamento do pedido pela instituição, que efetuará o pagamento conforme as regras do plano
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Pode constar em testamento?
E se, por decisão do titular, os recursos da previdência privada forem listados em testamento?
A previdência privada poderá constar em testamento, porém, dependerá do tipo de plano e das disposições contratuais, explica Frabetti. “A possibilidade está vinculada à distinção entre beneficiários indicados no plano e os bens que compõem o espólio.”
Gasparino reforça que, de maneira geral, a previdência privada não deve constar em testamento, pois os beneficiários são designados diretamente no contrato do plano, e o pagamento é feito independentemente das disposições testamentárias. “Incluir a previdência privada no testamento pode gerar conflitos, uma vez que o contrato prevalece sobre o testamento nesse aspecto.”
Se o titular deseja alterar beneficiários ou modificar a forma de distribuição dos recursos, deve fazê-lo diretamente junto à instituição gestora do plano, atualizando o cadastro de beneficiários.
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Casos na Justiça
É importante ter cuidado para não utilizar a previdência privada como meio de prejudicar herdeiros necessários, pois isso pode ser considerado fraude à legítima e ser contestado judicialmente.
Gasparino lembra que em decisão recente, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, em um caso específico, o VGBL tinha caráter de investimento financeiro e não securitário.
“Nesse caso, a titular, em idade avançada, vendeu seu único imóvel e aportou quase todo o patrimônio em um plano de VGBL, indicando o marido como beneficiário único, excluindo a filha, herdeira necessária”, relata. “O STJ determinou que o valor aportado no plano deveria integrar o inventário, por reconhecer indícios de burla à sucessão.”
A corte, no caso específico, entendeu que houve indícios de tentativa de fraude à sucessão e determinou que os valores do VGBL integrassem o inventário.
Portanto, embora a regra geral seja a exclusão dos planos de previdência privada do inventário, é possível que os recursos sejam incluídos no inventário em situações específicas que indiquem tentativa de fraude aos direitos dos herdeiros necessários.
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