No dia em que mercados globais reagiram com força à suspensão temporária das tarifas entre Estados Unidos e China, o Brasil ficou praticamente de fora da onda de otimismo. O Ibovespa fechou com alta tímida de 0,04%, aos 136.563,18 pontos, mesmo após flertar com a máxima histórica intradia. Já o dólar avançou 0,50%, a R$ 5,6833, marcando mais um capítulo de cautela local diante de incertezas fiscais e pressão inflacionária.
A divergência chamou atenção porque o movimento de alívio foi amplo: bolsas nos Estados Unidos, Ásia e emergentes dispararam após o anúncio de que Washington e Pequim concordaram em suspender a maior parte das tarifas impostas nas últimas semanas. O acordo, que prevê um período de 90 dias para novas negociações, foi visto como um gesto pragmático da administração Trump, que até então vinha adotando tom agressivo na política comercial.
Em Wall Street, o S&P 500 subiu 3,3%, e o Nasdaq 100 voltou oficialmente ao bull market. No mercado de câmbio, o dólar global teve sua melhor performance diária desde a eleição americana, refletindo uma reprecificação nas expectativas para os juros nos EUA: agora, investidores esperam apenas dois cortes pelo Federal Reserve em 2025, ante três estimados anteriormente.
Nos mercados emergentes, o efeito foi imediato. O índice MSCI, que acompanha ações de países em desenvolvimento, avançou 2,1%, liderado por papéis de empresas asiáticas como Alibaba, Tencent e Samsung. A suspensão das tarifas reduziu o risco de uma recessão global provocada por paralisações nas cadeias de comércio.
O alívio veio também de outras frentes geopolíticas. No fim de semana, Índia e Paquistão anunciaram um cessar-fogo, impulsionando os mercados locais: a bolsa de Karachi subiu 9,3% e a de Mumbai avançou mais de 3%. O humor positivo se espalhou também para o mercado de crédito, com ganhos expressivos em títulos soberanos de países como Ucrânia.
Mas no Brasil…
Enquanto isso, no Brasil, os ruídos foram outros. O mercado local reagiu menos ao alívio externo e mais à persistência de temas internos. O reajuste dos combustíveis anunciado na semana passada reacendeu preocupações inflacionárias. O IPCA mais forte do que o esperado ainda repercute, e a percepção de que o governo tem pouca margem — ou vontade — para cortar gastos obrigatórios continua pesando nas projeções para a política fiscal.
A falta de tração do Ibovespa, mesmo em dia de rali global, expõe o distanciamento do Brasil em relação ao novo ciclo de entusiasmo externo. A bolsa chegou a subir com mais força durante o pregão, batendo 137.519,33 pontos, mas perdeu força no fim do dia, refletindo o desconforto com o cenário doméstico. Na ponta oposta, o dólar manteve sua trajetória de valorização, subindo pela terceira sessão consecutiva e acumulando alta de 0,12% no mês.

Analistas ouvidos pela Bloomberg destacaram que a trégua comercial reduz drasticamente o risco de um “choque de demanda” global, mas alertam que os danos já causados pela incerteza nas últimas semanas — como empresas retirando projeções de resultado — ainda vão aparecer. Segundo estimativas da Bloomberg Intelligence, cerca de 6,1% da receita das empresas do S&P 500 veio de vendas para a China em 2024, o que ajuda a explicar a intensidade da reação do mercado americano.
Nos próximos dias, investidores seguirão atentos às tratativas entre Washington e Pequim. Trump afirmou que pretende falar com Xi Jinping ainda nesta semana, e há dúvidas sobre o que acontecerá ao fim dos 90 dias. Por ora, o mundo parece satisfeito com a suspensão do conflito. O Brasil, no entanto, continua em modo de espera.