Após anos turbulentos, marcados por volatilidade nos preços e críticas, as criptomoedas conquistam espaço como uma classe de ativo financeiro. Porém, pode ser um pouco difícil para investidores iniciantes investir em moedas digitais, já que há milhões de opções disponíveis no mercado, os termos e conceitos da indústria cripto são complexos e ainda há golpes por aí.
Neste guia, o InvestNews explica detalhadamente como navegar de forma segura nessa indústria repleta de oportunidades e perigos. Entenda como as criptomoedas funcionam, quais são as formas de investir, o que pesquisar na hora de escolher uma plataforma para se expor a moedas digitais e como armazenar de forma adequada os ativos.
O que são criptomoedas?
As criptomoedas são uma forma de dinheiro digital. Diferentemente de moedas fiduciárias, como real, dólar e euro, elas não são emitidas ou controladas por governos e bancos centrais. Elas são criadas e funcionam dentro de uma tecnologia chamada blockchain, uma espécie de banco de dados virtual descentralizado e semelhante a um livro contábil. Esse sistema é controlado por meio de algoritmos de computador (sequências de regras e instruções).
Há milhares de criptomoedas no mercado. Até meados de 2024, segundo o agregador de dados cripto CoinGecko, havia cerca de 2,5 milhões. As duas principais são o Bitcoin (BTC), lançado no final de 2008 por Satoshi Nakamoto, cuja identidade ninguém descobriu até hoje, e o Ethereum (ETH), idealizado pelo programador russo-canadense Vitalik Buterin em 2013, mas lançado em 2015.
Como investir em criptomoedas?
Há várias maneiras de investir em criptomoedas. As mais comuns e populares são via exchanges (semelhantes a corretoras de valores), por meio de ETFs (fundos de índice) e fundos de investimento com exposição a criptomoedas ou ainda comprar diretamente de outros investidores. Confira abaixo algumas delas e os prós e os contras de cada uma:
Exchanges
As exchanges são a maneira mais popular de investir em criptoativos. Elas fazem o intermédio entre vendedores de ativos digitais e compradores. Para negociar por meio delas, basta entrar em seus sites e criar uma conta. As empresas normalmente solicitam dados como nome completo, data de nascimento, telefone e CPF. Para aumentar a segurança da conta ou mesmo limites, algumas pedem fotos dos usuários ou de documentos.
Normalmente, as exchanges operam 24 horas por dia e 7 dias por semana, diferente da bolsa de valores, que funciona de segunda a sexta em horários definidos. O investimento mínimo começa a partir de R$ 1. As exchanges costumam cobrar taxas para saques e negociações. No Brasil, há tanto corretoras locais, como Mercado Bitcoin, Foxbit, Coinext e Bitso, como internacionais, a exemplo de Binance, Coinbase, OKX e Bitget.
ETFs
Os ETFs de criptomoedas são fundos negociados na bolsa de valores, assim como ações de empresas. Eles seguem índices de referência — indicadores que servem como parâmetro de comparação. Até novembro de 2024, havia 17 ETFs ligados a ativos digitais na bolsa brasileira, tanto com exposição direta ao preço do Bitcoin e demais criptomoedas como a contratos futuros de moedas digitais. O primeiro deles, o HASH11, da gestora Hashdex, foi lançado no início de 2021.
Na B3, também há BDRs (títulos emitidos no Brasil, mas com lastro em papéis de empresas negociadas no exterior) de ETFs dos EUA. A Blackrock, maior gestora de ativos do mundo, lançou o BDR de seu ETF iShares Bitcoin Trust (IBIT39), o maior do planeta, em fevereiro de 2024. Tanto os produtos locais como os estrangeiros cobram taxas de administração, que variam de 0,3% a 1,30% ao ano. Como são negociados na bolsa de valores, há também taxas de custódia e corretagem para corretoras de valores, além dos encargos de negociações.
Fundos de investimento
Os fundos de criptomoedas são como os fundos de investimento “tradicionais” — ou seja, são produtos financeiros que reúnem recursos de investidores, tanto de pessoas físicas como jurídicas, para aplicar em ativos.
A diferença é que esses fundos direcionam o patrimônio — ou parte dele — para moedas digitais. Há tanto fundos direcionados para investidores de varejo como para qualificados (com mais de R$ 1 milhão aplicados) e profissionais (com mais de R$ 10 milhões aplicados).
Os fundos podem ter gestão ativa (quando há um gestor que busca superar o desempenho de algum benchmark, como o CDI, por exemplo) e gestão passiva (quando replica o desempenho de um índice de referência). As gestoras normalmente cobram taxas de administração, que variam de 1% a 2% ao ano, e taxas de performance conforme o desempenho.
P2P
É uma forma de negociar criptomoedas diretamente entre duas pessoas, sem intermediários, como bancos ou exchanges. Os termos da negociação e os preços são decididos pelos interessados. Por isso, a transação pode ser mais barata quando comparada a exchanges. Nos primeiros anos do mercado, compradores e vendedores de criptomoedas se conheciam em redes sociais ou grupos, o que deixava esse tipo de negociação arriscada, visto que não havia garantia de transferência. Mais recentemente, no entanto, plataformas que conectam interessados em compras e vendas foram criadas. Algumas oferecem retenção das criptos negociadas até a finalização da transação.
Como escolher exchanges e fundos confiáveis?
Umas das “máximas” do mercado cripto é Do Your Own Research (Faça sua própria pesquisa, na tradução para o português). Na prática, significa que o interessado em ativos digitais deve analisar bem não só as plataformas escolhidas para investir ou armazenar suas criptos, mas também as moedas digitais adquiridas.
“É importante que o investidor tome alguns cuidados antes de fazer seu primeiro investimento, como estudar sobre o mercado e o ativo digital desejado, pesquisar o histórico da empresa antes da compra e, principalmente, começar de forma gradual”, recomenda Bernardo Srur, CEO da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABcripto).
Veja algumas dicas:
Pesquisa na internet: O investidor deve começar verificando a reputação da plataforma ou fundo nas redes sociais, fóruns especializados e sites de avaliação, segundo a ABcripto. Google, Reclame Aqui e tribunais de Justiça dos estados podem ajudar.
Registro: É fundamental verificar também, segundo a associação, se a exchange ou o fundo cripto estão registrados e regulamentados pelas autoridades financeiras locais.
Liquidez: Na hora de escolher uma exchange, vale também averiguar o volume de negociações, pois isso mostra a liquidez (capacidade de conversão da cripto em dinheiro) da plataforma. Em agregadores populares de dados sobre moedas digitais, como CoinGecko e CoinMarketCap, é possível verificar essas informações.
“Prefira exchanges com maior volume de negociação, mais tempo de mercado e trajetória consolidada. Também é importante observar quem são as pessoas envolvidas”, orienta Hudson Bessa, especialista em mercado financeiro da FIPECAFI.
CNPJ e selo: Segundo a Anbima, em sua plataforma “Se Liga na Fraude”, vale também conferir se a empresa tem CNPJ. Por serem empresas formalmente registradas no Brasil, elas seguem as regulamentações locais. É possível conferir no site da Receita Federal. Presença de selo de garantia de segurança também é um indicativo positivo, de acordo com a associação.
LEIA MAIS: O que é Bitcoin e o que é Ethereum?
Como encontrar boas criptomoedas?
Assim como no caso das plataformas, escolher criptomoedas também exige pesquisa. De acordo com especialistas, o investidor precisa verificar bem o que é a criptomoeda, quais seus fundamentos, quais os casos de uso, a segurança de sua blockchain e qual a idoneidade das pessoas ou empresas por trás do projeto.
Fundamentos e equipe: As informações sobre as moedas digitais podem ser encontradas no whitepaper (espécie de manual). No caso das equipes, pesquisas em fóruns, Linkedin, redes sociais e notícias de jornais também podem ajudar.
Casos de uso: Cada ativo digital tem um caso de uso específico, o que impacta em seu valor. “O Bitcoin, por exemplo, é uma tese de investimento de escassez, enquanto Ethereum é de (desenvolvimento) de aplicações que poderão ser feitas em cima de sua blockchain”, diz Bessa.
Blockchain: Vale também verificar a segurança e a escalabilidade da tecnologia por trás das criptomoedas. Normalmente, sistemas mais antigos e com mais usuários costumam ser mais seguros. “As transações realizadas com criptomoedas são registradas de forma imutável na blockchain, o que garante um alto nível de segurança e torna as operações rastreáveis”, diz Srur.
Como montar carteira de criptomoedas diversificada?
Bessa diz que a diversificação é essencial no mercado e não é recomendado concentrar todo o seu capital em um único ativo. “Se faz sentido incluir criptos no seu portfólio, elas devem compor apenas uma fatia da sua carteira, que precisa ser balanceada com outros tipos de investimentos mais estáveis”, explica o especialista.
Luiz Calado, planejador financeiro CFP da Planejar, sugere que para investidores iniciantes ou com aversão ao risco, uma alocação entre 2% e 5% do portfólio total é suficiente para explorar as oportunidades dos criptoativos sem comprometer a saúde financeira. Já para investidores mais experientes e tolerantes ao risco, essa alocação pode chegar a 15% ou, em casos muito específicos, até 30%.
Calado fala que, embora o Bitcoin seja o ativo mais consolidado e amplamente reconhecido, outras moedas, como Ethereum (ETH), Solana (SOL) e projetos ligados a finanças descentralizadas (DeFi), também apresentam oportunidades promissoras. “Cada uma dessas criptomoedas tem características e casos de uso específicos, o que pode ampliar o potencial de retorno e reduzir a exposição a riscos relacionados a eventos adversos de um único ativo”.
Por fim, segundo Calado, é essencial que a inclusão de criptomoedas seja alinhada a uma estratégia de longo prazo e balanceada com ativos tradicionais, como ações, renda fixa e fundos imobiliários, para construir uma carteira mais resiliente e diversificada. “Embora as criptomoedas possam oferecer retornos surpreendentes, sua volatilidade exige um investidor que esteja preparado para enfrentar períodos de queda acentuada, o que pode ser desafiador para quem não possui experiência ou tolerância ao risco.
Quais os riscos de investir em criptomoedas?
Antes de investir em criptomoedas, o investidor precisa estar ciente dos riscos, segundo especialistas. Por se tratar de uma uma tecnologia relativamente nova — o Bitcoin, por exemplo, foi criado no final de 2008 — ainda há uma série de desafios e incertezas no mercado
Volatilidade: Os preços das criptomoedas ainda são voláteis. Estudo publicado pela Fidelity Digital Assets mostra que, entre o início de 2020 e o começo de 2024, o Bitcoin foi de três a quase quatro vezes mais volátil do que vários índices de ações, como S&P 500.
“Criptos são investimentos de alto risco e volatilidade. O investidor precisa verificar se suporta essas oscilações e se seu fluxo de caixa permite manter o ativo em períodos de baixa, quando pode ser necessário aguardar uma recuperação no mercado para vender sem prejuízo”, destaca Bessa.
Golpes: O mercado cripto ainda é um campo fértil para golpes. Um dos motivos é a facilidade de criar tokens no mercado – há sites que, após cadastro, permitem a emissão. Outro é a existência de golpistas que alegam criar empresas de investimento de criptomoedas, mas que, na verdade, operam pirâmides financeiras.
“Existem sinais claros de que algo pode ser um golpe. Promessas de retornos garantidos e acima da média do mercado são um grande alerta. Desconfie também de projetos com pouca ou nenhuma transparência sobre sua equipe ou operação. Esquemas de pirâmide frequentemente utilizam táticas de recrutamento, onde você ganha com base em trazer novos participantes”, alerta Srur.
Regulação: A regulamentação do setor cripto, tanto no Brasil como no restante do mundo, ainda está sendo debatida por governantes. As decisões tomadas podem respingar nos preços. “A regulação das criptomoedas está em evolução, com o avanço de um marco legal e decretos que buscam proporcionar mais clareza e segurança jurídica para os investidores”, diz Srur.
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Como armazenar as criptomoedas?
Após investir em criptomoedas, é preciso guardá-las com segurança para evitar perdas ou mesmo ataques de hackers. A escolha do método depende do objetivo dos investidores (se quer manter por um bom tempo ou fazer trade) e do conhecimento a respeito da indústria cripto. Aqui estão as principais opções:
Custódia de terceiros: Normalmente as exchanges oferecem esse serviço. É uma opção mais prática para usuários menos experientes. A principal vantagem é que facilita a negociação de criptomoedas. A desvantagem é que o investidor não tem acesso às chaves privadas das criptomoedas.
Carteira quente (hot wallet): É uma carteira digital para armazenar criptomoedas. Ela fica conectada à internet, o que a torna mais vulnerável a ataques cibernéticos. O usuário é responsável por cuidar de suas chaves de acesso, assumindo total responsabilidade pela segurança.
Carteira fria (cold wallets): É um tipo de carteira digital que não está conectada à rede mundial de computadores. Portanto, fica menos vulnerável a ataques cibernéticos. É recomendada para armazenamentos de longo prazo. O ponto negativo é que dificulta as transações rápidas.
“No caso das carteiras digitais, prefira soluções que ofereçam recursos de segurança avançados, como autenticação multifatorial e armazenamento offline. Além disso, nunca compartilhe suas chaves privadas e tenha cuidado com links e e-mails suspeitos que possam tentar roubar seus dados”, sugere Srur, da ABcripto.
Qual a tributação das criptomoedas?
Segundo a Receita Federal, investidores com mais de R$ 5 mil em criptomoedas devem declarar o valor no Imposto de Renda. Só existe tributação, no entanto, sobre o lucro em vendas acima de R$ 35 mil por mês. Há um tabela progressiva: ganhos até R$ 5 milhões (15%), de R$ 5 milhões até R$ 10 milhões (17,5%); de R$ 10 milhões a R$ 30 milhões (20%); e, por fim, acima de R$ 30 milhões (22,50%).
No caso dos fundos de investimentos em criptomoedas e ETFs com exposição a ativos digitais as regras de tributação são diferentes. Em ambos, há uma uma alíquota de 15% sobre o ganho de capital — ou seja, a diferença positiva entre o valor da venda e de compra da cota do produto financeiro.