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Planejamento sucessório: o que é e lições da série ‘Succession’

Além do conhecido testamento, existe um conjunto de vários instrumentos jurídicos que podem evitar transtornos para as famílias; confira.

Pôster da série norte-americana "Sucession", que trata sobre o planejamento sucessório de uma família fictícia e rica.

O planejamento sucessório, tema central da série “Succession”, pode ser uma estratégia essencial para evitar a briga pelo terreno dos avós, por exemplo. Montar um planejamento pode parecer trabalhoso, mas com a ajuda de profissionais, a tarefa pode tornar-se mais simples e prevenir problemas futuros com partilha de herança, por exemplo.

Tratar do futuro, especialmente post mortem (após a morte), pode ser assunto desagradável para alguns, mas é necessário àqueles que querem manter o patrimônio dentro da própria família.

Quer saber o que é planejamento sucessório, como funciona o planejamento sucessório familiar, conferir algumas das lições da série “Succession” e ainda receber dicas de livros sobre o assunto? Confira a seguir.

O que é e como funciona planejamento sucessório?

Créditos: Freepik

O planejamento sucessório é uma estratégia jurídica utilizada para a organização e transferência de bens e patrimônios do titular para outros, especialmente membros da família, em caso de morte ou incapacidade.

Rafael Stuppiello, advogado da área de Planejamento Patrimonial e Sucessório do Machado Meyer Advogados, explica que o planejamento sucessório é um conjunto de providências jurídicas que visam adotar medidas para preservar o patrimônio e manter a harmonia familiar, bem como mitigar riscos e conflitos familiares em situações de crise e de grande impacto emocional, como divórcios, falecimentos e incapacidade civil.

Diferentemente do processo de inventário, o planejamento sucessório ocorre ainda em vida.

“Ele funciona por meio do entendimento dos desejos e necessidades da família, tanto pessoais como patrimoniais, e da adoção dos instrumentos jurídicos para o atingimento desses objetivos.

Rafael Stuppiello, advogado de Planejamento Patrimonial e Sucessório.

Segundo ele, o planejamento tem início com uma análise da estrutura e da organização patrimonial já existente (forma de detenção de bens) e suas consequências societárias, fiscais e sucessórias para verificar a necessidade de reestruturação, bem como pela verificação da situação jurídica pessoal e familiar dos envolvidos no planejamento (estado civil, filiação, etc.) para identificar riscos patrimoniais decorrentes de questões familiares e sucessórias.

O advogado cita que, além disso, são realizadas reuniões com os integrantes da família para que os desejos sejam atendidos e as expectativas alinhadas para que a sucessão, tanto nos negócios como na transferência de bens, seja feita com o menor impacto possível nas relações e nos negócios familiares.

Vantagens do planejamento sucessório

Segundo Stuppiello, uma das principais vantagens de fazer um planejamento sucessório é a garantia do controle das decisões e de suas consequências, de forma que a família consiga determinar seus rumos patrimoniais e antever os efeitos de situações extremas, como falecimentos e rupturas.

Além disso, dada a transparência necessária para o processo, há mitigação do risco de litígios (termo jurídico para quando há divergência entre as partes) e conflitos.

“Há também a transmissão patrimonial e sucessão empresarial eficiente e organizada, sem comprometer relações pessoais e os negócios, além de benefícios e economia fiscal, de forma a garantir a perenização e manutenção do patrimônio e das relações familiares”.

Temos, portanto, como já mencionado no início do texto:

  • Uma amenização de conflitos familiares, como a famosa briga pelo terreno da família; 
  • Maior garantia de controle das decisões que entrarão em vigor, principalmente após a morte do titular; e 
  • Economia fiscal, devido a redução de custos com tributação, como com o ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), incidente em bens herdados.

Como fazer um planejamento sucessório

Imagem de xvector/Freepik

Primeiramente, é importante buscar a ajuda de um profissional qualificado para auxiliar, visto que são utilizados instrumentos jurídicos e estratégias que necessitam do acompanhamento de um especialista da área.

É importante começar o planejamento com antecedência, ter em mente quem serão os beneficiários, manter os familiares a par e organizar toda a documentação necessária. 

Como já mencionado, inicialmente, ocorre a análise da estrutura e da organização patrimonial já existente e suas consequências; a verificação da situação jurídica pessoal e familiar dos envolvidos no planejamento e a realização de reuniões com os integrantes da família para expor e alinhar desejos e expectativas.

“Após a fase de diagnóstico das situações patrimoniais e pessoais e suas consequências jurídicas, são elaborados sugestões de novas estruturas patrimoniais e de determinados documentos jurídicos, sendo apresentados os prós e contras de cada situação para que a família decida o caminho a trilhar”, comenta Stuppiello.

A partir do estudo de toda conjuntura econômica e familiar, é possível escolher qual será a forma utilizada para realizar o planejamento sucessório, visto que existe mais de um “tipo” e é preciso escolher uma modalidade para fazê-lo. Confira no subtítulo abaixo quais são.

Por fim, definidas as estruturas e documentos, tem início a fase de implementação do planejamento por meio da adoção e execução das estruturas e documentos aprovados pela família.

  • Veja que são assets e como funciona?

Tipos de planejamento sucessório

Imagem de pressfoto/Freepik

Segundo o especialista, diversas são as ferramentas jurídicas que podem ser utilizadas em um planejamento sucessório, a depender da estrutura familiar e patrimonial. 

“Temos como exemplos: contratos para regular os relacionamentos (namoro/uniões estáveis e pactos antenupciais), modificação de regime de bens dos relacionamentos, contratos de doação, com ou sem reserva de usufruto, testamento, criação de holdings, fundos de investimentos, seguros de vida, previdência, acordos de sócios/quotistas nas sociedades, protocolos familiares (documentos que cria as regras internas da família para, por exemplo, ingressar nas empresas, gerir bens, participar de conselhos)”, comenta Stuppiello.

De uma forma geral você tem os documentos que irão tratar:

(i) das questões pessoais de cada membro da família;

(ii) das empresas/negócios familiares; e

(iii) da intersecção entre família e empresa por meio do estabelecimento e implementação das governanças familiar e empresarial.

Confira abaixo alguns dos instrumentos utilizados no planejamento sucessório:

Testamento

O mais famoso e conhecido quando trata-se de patrimônio, o testamento é um instrumento jurídico que permite que o titular compartilhe os bens como quiser, no entanto, respeitando algumas regras estabelecidas pelo Código Civil Brasileiro.

Stuppiello explica que o testamento é um documento personalíssimo (individual), cujos efeitos ocorrem após o falecimento e sobre o patrimônio à época existente. Com esse documento é possível ao testador dispor sobre metade de seus bens (disponível) e destiná-los a qualquer pessoa (física ou jurídica) que ele desejar.

A outra metade dos bens representa a legítima e deve ser dividida obrigatoriamente entre os herdeiros necessários do testador (descritos no artigo 1.845 do CC, filhos, pais e cônjuge). Na ausência de herdeiros necessários, o testador terá disponibilidade sobre a integralidade de seu patrimônio, diz o advogado.

“É possível ainda determinar quais bens irão compor os respectivos quinhões hereditários, bem como estabelecer regras de gestão e proteção patrimonial, além de nomeação de testamenteiro e inventariante”, complementa.

Segundo a lei, o testamento só pode ser feito pelo próprio testador, ou por pessoa por ele designada, desde que o testador concorde por escrito”, comenta o advogado. 

Como mencionado, metade do patrimônio, ou seja, 50% dele, é obrigatoriamente destinado aos herdeiros legítimos, como descendentes (filhos), cônjuges e até ascendentes (mãe ou avó, por exemplo).

Os outros 50% podem ter o destino que o testador bem entender, seja para ONGs ou outros sem vínculo familiar.

O testamento também possui tipos:

  • I – o público;
  • II – o cerrado;
  • III – o particular.

Mas o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, “para ser considerado válido, o testamento tem que cumprir os requisitos e formalidades legais, ou poderá ser declarado nulo”. 

Seguro de vida

O seguro é uma apólice contratada que não representa parte direta do patrimônio, pois envolve apenas o dinheiro, que já é predefinido, e não outros bens materiais.

Segundo o artigo 794, o capital estipulado no seguro não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito. Ou seja, esse dinheiro não pode ser utilizado para quitar as dívidas do falecido e nem é considerado herança.

Em vida, a pessoa realiza o pagamento de uma parcela mensal à seguradora e, após seu óbito, uma indenização é paga aos beneficiários que foram incluídos no contrato no momento da assinatura.

Aqui, o segurado pode escolher quem bem entender como seu beneficiário

“Art. 789. Nos seguros de pessoas, o capital segurado é livremente estipulado pelo proponente, que pode contratar mais de um seguro sobre o mesmo interesse, com o mesmo ou diversos seguradores”, estabelece o CV.

Plano de previdência privada

Diferentemente da Previdência Social, em que a aposentadoria é passada como pensão por morte para os herdeiros do previdenciário falecido que atendam aos critérios, a previdência  privada permite que os beneficiários sejam escolhidos no momento da contratação

Na previdência privada também não há a regra de 50% dos bens aos herdeiros legítimos, como deve ser com o testamento. Aqui, são efetuados depósitos mensalmente e, após o falecimento do titular, os herdeiros recebem suas cotas do valor arrecadado.

Doação

Também é possível que haja a doação e, ainda em vida, a pessoa transfira o seu patrimônio, bens ou vantagens para outros, lembrando que também existem regras para as doações.

Segundo Stuppiello, esse é um contrato por meio do qual o doador (titular do patrimônio) transfere ao donatário a propriedade do bem.

“É possível ao doador manter direitos sobre o bem doado (usufruto) de forma que ele ainda faça a administração/gestão do bem e receba os frutos e rendimentos. O usufruto pode ser estabelecido por tempo determinado ou de forma vitalícia (em relação ao doador)”.

Conforme citado, o doador também pode incluir cláusulas no contrato de doação que restrinjam a utilização do donatário que evitem transferência, doação ou venda, por exemplo, de quem recebeu o bem.

São elas as cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade, incomunicabilidade e reserva de usufruto.

Aqui há incidência de Imposto de Transmissão Causa Mortis ou Doação (ITCMD), que como o nome sugere, é um tributo estadual, portanto, cada estado possui suas próprias regras, cobrado na transferência de bens e/ou direitos de herança ou doação.

Holding familiar

Planejamento sucessório e holding familiar são termos que estão ligados à série “Succession“.

Holding, como você já deve ter ouvido, é um termo utilizado para uma empresa controladora de outras empresas.

Já a expressão holding familiar é utilizada para nomear uma empresa criada para organizar e cuidar do patrimônio de uma família, promovendo o planejamento sucessório para os sucessores.

Neste caso, os bens da família ficam concentrados na empresa por meio da integralização no capital social, sendo transferidos para ela. Assim dá-se a divisão do patrimônio e cada membro da família/sócio tem suas ações/quotas na empresa.

“Podem trazer benefícios fiscais e a sucessão irá ocorrer nas quotas das empresas e não nos bens que ela possui. Também permite a elaboração de acordo de quotistas e regras/requisitos e até vedação) do ingresso de terceiros (inclusive herdeiros)”, argumenta Stuppiello.

Lições de Succession sobre planejamento sucessório

Siobhan (Shiv), Roman e Kendall Roy – personagens da série Succession (da esquerda para a direita)/Reprodução Instagram Succession

*Alerta de spoilers*

Primeiramente, a série de drama “Succession”, da HBO, apresenta a história da poderosa família Roy, controladora do 5º maior conglomerado de meios de comunicação do mundo. 

Na trama, temos Logan, o criador do império multibilionário, seus quatro filhos e, como o próprio nome sugere, toda a série gira em torno da sucessão ao “trono” dele na Waystar Royco.

Logo no começo da série, quando o patriarca, já aos 80 anos, decide que quer incluir sua atual esposa, Marcia, no fundo da família, o que daria o poder de decisão a ela, que teria dois votos após a morte de Logan, encontra resistência dos filhos, que não querem “sair perdendo”.

Além disso, Logan decide desfazer o acordo com seu o filho do meio, Kendall, a quem havia prometido a vaga de CEO, e decide manter-se como presidente da empresa, mesmo já tendo certa idade e não estando em seu juízo perfeito. 

Kendall se sente traído pela quebra da promessa e trama retirar o pai do controle, especialmente quando Logan acaba tendo um grave problema de saúde e fica incapaz de continuar no comando, mas seus planos não saem como esperado, causando brigas e tensão entre os irmãos e também entre o alto escalão da empresa.

Explicada a premissa da série, podemos observar o quão importante se faz o planejamento sucessório aqui.

Logan resiste a abrir mão do comando e não estabelece diretrizes para a transferência de poder e patrimônio, o que além de criar mais conflitos na família disfuncional e gananciosa, gera problemas para a própria empresa.

Aqui fica claro que há riscos em deixar o planejamento sucessório para a última hora, ainda mais visto que Logan também já não estava tão bem de saúde, ou sequer fazê-lo.

A falta desse planejamento patrimonial e sucessório gera uma rivalidade e competição tóxica entre a própria família e, inclusive, quando todos acham que Logan irá morrer, causa uma boa queda nas ações da Waystar Royco e uma tensão nos membros do conselho.

Ademais, mesmo que 2 dos filhos interessados em controlar o império: Kendall e Roman tenham passado pela empresa em algum momento, e Siobhan (Shiv) tenha embarcado na carreira política, nenhum deles foi realmente treinado para adquirir as habilidades e conhecimentos para assumir o controle da companhia, já que Logan parecia não pensar em deixar o comando tão cedo, apesar de já não estar em sua melhor forma. 

Connor, o primogênito, é o único que parece se importar menos com a competição.

Não houve a preparação de uma transição de liderança ou administração do patrimônio, tampouco um “treinamento” para o (os) sucessor (es), tanto que, em meio à acirrada disputa pelo poder, o desfecho da série e quem acaba virando o “sucessor” de Logan é surpreendente.

Após tudo que os irmãos passaram, quem acaba na cadeira de SEO é Tom, genro de Logan, marido de Shiv. 

Não por ter sido escolhido pelo patriarca, mas porque, após sua morte, Tom acabou sendo nomeado, já que os irmãos Roman e Shiv não confiavam o bastante no irmão do meio, Kendall, para manter o controle da empresa e acabam votando para a aquisição da Waystar Royco pela GoJo, que resultava na mudança de poder.

Apesar de todos continuarem muito ricos no final e Shiv estar grávida do possível herdeiro do império, vemos que a estrutura da empresa muda e não fica claro se os irmãos continuarão a trabalhar na Waystar, o que poderia ter sido evitado caso a família fizesse o planejamento sucessório.

Lições de Succession sobre investimentos

Logan Roy (personagem da série Succession)/ Reprodução Instagram Succession

Primeiramente, pelo que já vimos, a série Succession mostra o quanto planejamento é importante, seja na vida pessoal ou nos negócios.

A falta de planejamento, ações e decisões tomadas de maneira impulsiva, ou deixadas de serem tomadas, geraram problemas tanto na família Roy quanto na Waystar Royco.

Caso o patriarca da família não tivesse deixado todos no limbo sobre os detalhes da sucessão, muitos conflitos e a perda de dinheiro teriam sido evitados.

Também, já nos primeiros episódios, a ganância, obsessão por poder e excesso de confiança acabam levando os próprios personagens a se prejudicarem, bem como podemos observar os cuidados que as empresas familiares devem ter, já que, entre outros, os assuntos pessoais e corporativos podem se misturar e gerar atritos. 

Além disso, a série também aborda os impactos que as fusões e aquisições têm nas empresas. 

No primeiro episódio, Kendall tentar comprar uma empresa, a Vaulter, no intuito de diversificar o portfólio da empresa tradicional que é a Waystar Royco, algo que Logan considera praticamente desnecessário quando fala que as pessoas continuam usando os meios tradicionais de comunicação.

Pouco depois, quando Logan sofre de um grave problema de saúde, o CEO da Vaulter ameaça Kendall dizendo que colocou “uma raposa dentro do galinheiro”, agora que seu pai não estava mais lá para defender a empresa.

Inclusive, no final da série, a aquisição da Waystar pela empresa GoJo é o que acaba “tirando a família da jogada”, apesar de resultar em uma transação bilionária, os Roy perdem o controle do império, mostrando o poder que essas operações exercem sobre os negócios.

A série também aborda o cuidado que as empresas precisam ter com as dívidas.

Além disso, em determinado momento, descobre-se que Logan solicitou um empréstimo de uma enorme quantia e no documento havia como termo que o banco poderia buscar o reembolso do empréstimo caso as ações da companhia ficassem abaixo da marca de US$ 130, resultando na entrega das ações dos filhos de Logan ao credor, reduzindo significativamente sua participação.

Esses são apenas alguns dos ensinamentos da série, mas é possível encontrar vários outros. 

Procurando mais lições deixadas pela série “Succession”? Confira:

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