Que o Brasil é um país desigual, não há dúvida. Mas o estudo Mapa da Riqueza de 2023, elaborado por Marcelo Neri, diretor do FGV Social, aponta que as diferenças podem ser ainda mais impactantes quando se analisa com lupa o patrimônio e a renda dos mais ricos e se compara à dos mais pobres.
O levantamento, realizado em fevereiro de 2023, reuniu a base de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) e também do Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF) referente ao ano de 2020.
Para se ter uma ideia de como o abismo financeiro pode ser ainda maior, em Brasília, unidade da federação mais rica do país, a renda média declarada por habitante, que é de R$ 3.148 por mês, salta para R$ 12.627 entre quem presta contas ao Leão.
Neri explica que os estudos domiciliares existentes sobre pobreza e desigualdade não conseguem captar com clareza a renda e o patrimônio de quem está no topo da cadeia de distribuição. Isso porque a fatia mais abastada da sociedade tem certa resistência em falar sobre sua situação financeira quando são abordados por essas pesquisas.
“O Imposto de Renda é uma obrigação legal e com ele é possível captar o topo da distribuição de maneira melhor do que outras pesquisas”, explica.
MARCELO NERI, DIRETOR DO FGV SOCIAL E RESPONSÁVEL PELA PESQUISA MAPA DA RIQUEZA.
Entretanto, o estudo revela que mais de 80% da população não fez a declaração do Imposto em 24 das 27 Unidades da Federação e em 16 das 27 capitais brasileiras em 2020, o que
indica que a maioria das pessoas nessas localidades tinha renda inferior a R$ 2.000.
O levantamento também mostra que São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, é a cidade com maior proporção de declarantes do IRPF, com 43,87% da população.
Desigualdade de renda
Para se ter uma ideia da diferença social captada pelo estudo, ao levar em conta as cidades com mais de 50 mil habitantes, o município de Rurópolis, no Pará, registra a menor renda média do país entre as pessoas que declaram imposto de renda no país: R$ 3.929.
Já Nova Lima, em Minas Gerais, ocupa o topo do ranking entre as cidades com maior renda do país. Entre quem presta contas ao Leão, o valor chega a R$ 27.017– quantia quase 7 vezes maior do que a contabilizada em Rurópolis.
Neri lembra que Nova Lima abriga uma sede da mineradora Vale (VALE3), mas além da força produtiva, as cidades mais ricas costumam atrair pela qualidade de vida local.
“A população rica vai para lugares onde tem mais qualidade de vida, não necessariamente a riqueza é originalmente gerada nesses lugares, mas ela migra para esses lugares “, explica.
MARCELO NERI, RESPONSÁVEL PELA PESQUISA MAPA DA RIQUEZA.
Desigualdade de patrimônio por habitante
Além da renda, o estudo mostra quais estados e cidades registram o maior e o menor patrimônio do país. A Unidade da Federação com a menor declaração de patrimônio por habitante é o Maranhão: R$ 6.300 (sem levar em conta os declarantes do Imposto de Renda).
Em contrapartida, o Distrito Federal registra a maior quantia: quase R$ 95.000, montante 1.400% maior se comparado ao Maranhão.
Mesmo dentro de uma mesma localidade, a pesquisa aponta uma enorme concentração de riqueza. No Distrito Federal, por exemplo, a região de Lago Sul, o patrimônio por habitante chega a R$ 1,4 milhão – quantia quase 15 vezes maior do que a registrada no próprio Distrito Federal.
Já a renda média de quem declara Imposto de Renda no Lago Sul é de R$ 23.241, três vezes maior que o município mais rico do Brasil que é Nova Lima, que tem rendimento médio de R$ 8.897.
Entre os declarantes de Imposto de Renda, Sao Paulo lidera com um patrimônio liquido médio de R$ 411.448, enquanto o Maranhão aparece na última posição com patrimônio de R$ 52.548.
Recorte da pandemia
O Mapa da Riqueza de 2023 também mostrou que, mesmo com o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 mensais, que preservou a renda dos mais pobres durante a pandemia de covid-19, a desigualdade no país não caiu em 2020, principalmente entre a classe média.
Segundo o estudo, o grupo registrou uma queda na renda de 4,2% em termos reais, enquanto os 50% mais pobres tiveram um ganho de 0,2% e os 10% mais ricos perderam 1,5%.