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Warren Buffett: US$ 270 bi ‘parados na conta corrente’ à espera de um destino

Veja também um raio-x da carteira de ações da Berkshire, agora menos concentrada em papéis da Apple

Imagem de Warren Buffet e de uma cédula em dólar
Arte: João Brito

Se você olhar hoje debaixo do colchão da Berkshire Hathaway vai achar mais dinheiro que o Produto Interno Bruto (PIB) de 170 países. Em cima da cama, Warren Buffett segue deitado pacientemente, enquanto investidores do mundo todo tentam espiar pela janela para descobrir seu próximo passo.

A montanha de dinheiro alcança US$ 271,5 bilhões, segundo a data de referência de 30 de junho, último dado disponível. Aí está incluído o que a Berkshire tem em caixa, o chamado caixa equivalente (títulos do Tesouro americano com vencimento em até 3 meses) e também as aplicações de curto prazo em títulos do Tesouro dos EUA (vencimentos entre três meses e um ano).

Na prática, é como se esse fosse o dinheiro na “conta corrente” da Berkshire. Não está exatamente investido, só protegido da inflação, enquanto Buffett e seus sócios não encontram um investimento de fato – basicamente, ações de boas empresas a preços convidativos.

Esse dinheiro todo (que chega a R$ 1,5 trilhão, na conversão) é o triplo do valor atual de mercado da Petrobras (R$ 480 bilhões), levando em conta o total de ações da empresa brasileira de petróleo multiplicado pelo preço das ações na Bolsa. Equivale também a 19 vezes a captação líquida acumulada em 2024 de todos os fundos de investimento no Brasil (R$ 78,3 bilhões) e a 34 vezes o saldo do investimento estrangeiro na B3 no ano passado (R$ 44 bilhões).

É tanto dinheiro que, se fosse possível colocar 271,5 bilhões de notas físicas de US$ 1 uma em cima da outra, a pilha chegaria a 298,65 quilômetros, altura mais do que suficiente para chegar ao espaço sideral:

A Berkshire Hathaway registrou valor em caixa de US$ 271,5 bilhões em junho de 2024. Considerando que a espessura da cédula de dólar é de 0,11 milímetros, esse valor empilhado em notas de US$ 1 chegaria a 298,65 km de altura. Arte: Daniela Arbex

Quer mais um número? O conglomerado criado por Buffett atingiu na última quarta (28) US$ 1 trilhão em valor de mercado (número total de ações da empresa multiplicado pelo preço do papel na Bolsa), tornando-se a primeira empresa americana trilionária fora do setor de tecnologia. Se fosse um país, esse valor de mercado colocaria a Berkshire no top 20 de maiores PIBs do planeta, superando a Suíça e outras 199 nações.

Ode à paciência

“A Berkshire foi construída para durar”, escreveu Buffett, o sétimo homem mais rico do mundo, em sua carta anual aos investidores da companhia, em fevereiro. A empresa hoje colhe os frutos de quase seis décadas durante as quais Buffett seguiu a estratégia sugerida do agora falecido sócio Charlie Munger, de “comprar negócios maravilhosos a preços justos em vez de comprar negócios justos a preços maravilhosos”.

O investidor se comprometeu, numa carta de 6.112 palavras, continuar seguindo todas elas após a morte de Charlie, em novembro de 2023, aos 99 anos.

“A paciência vale a pena, e um negócio maravilhoso pode ofuscar as muitas decisões medíocres, que são inevitáveis.”

warren buffett

Essa e outras máximas da holding de Omaha, no Estado do Nebraska, são amplamente conhecidas. E genéricas o suficiente para deixar os investidores no escuro sobre para onde ele vai agora.

Ranking dos mais ricos do mundo (até 30/08/2024)
Ranking das pessoas mais ricas do mundo, segundo o Bloomberg Billionaire Index em 30 de agosto de 2024. Arte: Daniela Arbex

Embora já não seja mais o homem mais rico do mundo, ele pode se considerar o maior filantropo individual. Ao doar para diversas causas por meio de organizações não-governamentais — especialmente em ações da Berkshire — ele já se desfez do equivalente a mais de US$ 60 bilhões, segundo cálculos da Forbes:

Buffett já doou, principalmente em ações suas da Berkshire Hathaway, o equivalente a mais de US$ 60 bilhões até hoje, segundo o ranking America’s Top Givers 2024, da Forbes. Arte: Daniela Arbex

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A mordida na maçã

Desde o início de agosto, com a enorme venda de ações da Apple no segundo trimestre e de outros US$ 982 milhões em papeis do Bank of America, o mercado tenta adivinhar os próximos passos de Buffett.

O grande desembarque da Berkshire em Apple, que se tornou público em 3 de agosto (e contribuiu para a chamada “Black Monday” dois dias depois), foi o principal motor por trás da explosão recente do montante em caixa da Berkshire Hathaway, que registrou alta de 66% no primeiro semestre.

Os especialistas correram para explicar que Apple e Bank of America não são um mau negócio e que Buffett ainda mantém muitas ações em ambas.

O InvestNews analisou a composição do portfólio da Berkshire nos últimos dez semestres. A empresa da maçã e o BofA de fato seguem como as duas principais ações da carteira. Mas, entre abril e junho, a queda dessa participação foi de 52,6% para 44,8% do total investido. Juntas, as sete principais empresas do portfólio perderam espaço para as menores:

Os relatórios anuais da Berkshire também reforçam a tendência de pulverização. No fim 2023, as cinco principais ações do portfólio concentravam 79% do investimento em participações de empresas. Em junho, a proporção caiu para 72%.

Revisão de rota

Buffett começou a investir na Apple em 2016, com a compra de 61 milhões de ações. Em 2018, eram 255 milhões de ações e 907 milhões em 2020, quando a empresa diz ter gasto US$ 36 bilhões para consolidar essa posição, aproveitando dividendos médios de US$ 775 milhões por ano.

Mas, desde o fim de 2023, a Berkshire passou de 907 milhões de ações da Apple para 789 milhões em março e 400 milhões em junho. Só essa venda pode ter gerado pelo menos US$ 100 bilhões para o caixa, segundo estimativas.

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Neste ano, a Berkshire também reduziu a quantidade de empresas no portfólio. Entre julho de 2022 e setembro de 2023, a carteira tinha entre 49 e 52 empresas. No fim do ano passado, caiu para 46. Em junho, já eram 43.

O conglomerado zerou seu investimento em ações dos setores imobiliário e de transportes (com o abandono da UPS). Reduziu ainda a participação nos setores de tecnologia (que inclui Apple), saúde e finanças. Empresas nas quais a Berkshire não tem mais ações incluem TSMC, Hewlett-Packard, Johnson & Johnson, Verizon e o estúdio Paramount.

Na outra ponta, a Berkshire aumentou sua posição em empresas do setor de comunicação. E três novos papeis entraram na carteira: a seguradora Chubb, a loja de cosméticos Ulta Beauty e a fabricante de produtos aeroespaciais Heico. Juntas, elas representam apenas 3% do portfólio atual.

Warren Buffet anda de carrinho elétrico durante evento em Idaho
Warren Buffett (centro) durante evento em Idaho, em julho de 2023. Foto: David Paul Morris/Bloomberg

Predileção pelas mais velhas

O mercado tem especulado por que Buffett tem andado com tanto dinheiro “parado”. Para muitos, a cautela é sinal de temor de uma nova recessão. E Buffett tem experiência em passar praticamente ileso por elas, porque, segundo ele mesmo, está “sempre preparado para uma [crise]”.

Essa lógica ainda dá margem para possíveis bons negócios a partir da ruína alheia. Ao se resguardar e vender ações em alta, ele tem reservas para garantir as operações e ainda pode comprar novas empresas que venham a se desvalorizar em caso de turbulência.

Em maio, na reunião anual com investidores da Berkshire, Buffett foi questionado ao vivo sobre por que deixou a pilha de dólares encostada:

“Essa resposta é bem fácil de responder. Acho que ninguém nessa mesa tem qualquer ideia de como usar [esse dinheiro em caixa] de forma efetiva. Por isso, não usaremos. Não vamos usar agora, com [a taxa de juros] a 5,4%, mas não usaríamos nem se ela estivesse em 1%. Mas não contem isso para o Federal Reserve. (…) Não é que estou em uma greve de fome, ou algo assim. É só que as coisas não estão atrativas.”

Warren Buffett

O que pode atrair Buffett (além de uma boa barganha, claro)? A resposta pode estar novamente na carta de fevereiro: “A Berkshire não é muito fã de novatas”, diz ele, citando American Express e Coca-Cola como dois exemplos de investimentos de longa duração e que geraram dividendos por décadas. São negócios que começaram no século 19.

Outras apostas da Berkshire não são motivadas apenas pelo lucro. É o caso da Occidental Petrolium, que ele apoia para evitar que os EUA fiquem reféns da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). “Nosso país estaria muito – muito – nervoso hoje se a produção doméstica tivesse se mantido em 5 milhões de barris produzidos por dia [atualmente, está em 13 milhões].”

Outro caso emblemático é o da empresa ferroviária BNSF, um setor que Buffett considera “essencial para o futuro econômico da América” e, por isso, mantém a operação, ainda que seja custosa e suscetível a intempéries naturais e humanas.

Vale lembrar, é claro, que todas essas, com exceção da BNSF, são empresas que a Berkshire não controla. O carro-chefe das operações do conglomerado ainda são o lucrativo ramo de seguros, com a Geico, e, em menor escala, dezenas de empresas de setores diversos, das pilhas Duracell aos sorvetes Dairy Queen.

O que muda para o futuro

Daqui para a frente, a perfomance da Berkshire deve ser menos chamativa, como reconhece Buffett, devido ao tamanho que a empresa alcançou (6% do valor de mercado combinado das empresas de capital aberto) e à falta de perspectiva de expansão para outros países.

“Fora dos EUA, basicamente não há candidatas que sejam opções significativas para investimento de capital da Berkshire.”

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A exceção está no Japão. Desde 2019, a empresa tem posições em cinco grandes companhias japonesas, incluindo a Mitsubishi, por conta da operação diversificada da empresa, seu hábito de recompra de ações e a política de reinvestimento dos ganhos. Ajudou também o fato de que a dívida contraída pela Berkshire para comprar ações de empresas de lá seja em ienes, que tiveram desvalorização na comparação com o dólar americano no primeiro semestre.

Buffett se comprometeu a não passar de 9,9% de participação em cada uma das companhias japonesas, mas ressaltou que o investimento abre “outras oportunidades pelo mundo em parceria com cinco empresas grandes, bem geridas e respeitadas”.

Warren Buffett segura faixa em apoio a Fukushima durante visita ao Japão
Em 2011, Warren Buffett esteve na inauguração de uma fábrica em Fukushima, no Japão. Após oito anos de conversar com empresários e estudos, o bilionário começou a investir em companhias japonesas, e não parou até hoje. Foto: Tomohiro Ohsumi/Bloomberg

Infografia: Daniela Arbex / Arte: João Brito

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