O destino ideal desse dinheiro, portanto, são os produtos que seguem a taxa Selic, a referência para a economia brasileira. Se o referencial é o mesmo, então, é natural que o retorno também seja igual, certo? Errado. Tem um componente que muda todo o jogo: o imposto de renda.
Para fazer aquele pé de meia anti-imprevistos, o investidor tem algumas opções: o título Tesouro Selic (LFTs), que pode ser comprado via plataforma do Tesouro Direto; fundos DI, que compram títulos Tesouro Selic e, dessa forma, conseguem ter um retorno que acompanha a variação do CDI; os ETFs (fundos negociados em bolsa) de LFTs; e os CDBs de liquidez diária de grandes bancos, que rendem 100% do CDI.
Existem ainda as contas remuneradas – as “caixinhas” ou “cofrinhos”– das corretoras e bancos digitais. Algumas oferecem uma rentabilidade próxima a 100% do CDI, enquanto outras rendem bem mais, como 110% ou 120% do indicador. Falaremos disso mais à frente.
O que vai tornar a rentabilidade final em cada um desses produtos não é apenas a alíquota de IR ,mas também o modo com o imposto é cobrado. Além disso, cada produto tem uma forma diferente de registrar a variação do preço do Tesouro Selic ao longo do tempo. Vamos às contas.
Premissas
Vamos considerar uma aplicação de R$ 50 mil realizada entre novembro de 2023 e novembro de 2025, quando a Selic saiu de 12,25% para 15% ao ano. A rentabilidade bruta acumulada é de 27,37%, considerando a capitalização composta do rendimento diário da taxa – que é como ela é calculada.
O IR cobrado nas aplicações financeiras de renda fixa respeita a tabela regressiva, que define as alíquotas a depender do tempo que o investidor deixa seu dinheiro aplicado. Para quem deixar o dinheiro investido por um prazo de até 180 dias, a alíquota é de 22,5% – e ela incide apenas sobre o lucro. Esse percentual vai caindo com o tempo até que, para aplicações com prazo acima de 720 dias, chega a 15%. A única exceção a essa regra são os ETFs – vamos explicar isso mais adiante.
Indo direto ao que interessa, a nossa simulação mostra que os resultados podem ser bem diferentes para cada um dos produtos de reserva de emergência.
Fundo DI, o melhor desempenho
No fundo DI, consideramos um produto sem qualquer taxa de administração, já que diversas corretoras oferecem essa alternativa. E, por lei, eles não têm taxa de performance, então também deixamos isso zerado. Qualquer cobrança adicional de taxa corrói o rendimento, portanto a simulação muda muito se o investidor escolher um produto diferente das condições que usamos.
Nos cálculos, também precisamos considerar o temido come-cotas. É um mecanismo que antecipa, de forma compulsória, a cobrança do IR: a cada seis meses, 15% do lucro do período é recolhido na fonte. Essa alíquota pode ser maior, a depender do prazo médio de vencimento dos títulos na carteira. Mas, como os fundos costumam investir em títulos de prazo mais longo, o mais comum é que a alíquota de come-cotas seja de 15% mesmo.
O come-cotas é muito negativo para o investidor porque diminui o saldo dele sem que ele sequer tenha colocado a mão no dinheiro. É menos dinheiro rendendo dali em diante. Mesmo assim, o fundo DI tem o melhor resultado porque acompanha o juro diário da Selic com mais precisão, suavizando oscilações de preços dos títulos.
ETF de LFT, um pós-fixado que oscila mais
O ETF de LFT também investe em Tesouro Selic, mas funciona de outra forma. Ele não tem come-cotas, não tem taxa de custódia e boa parte das corretoras também trabalha com taxa de corretagem zero para distribuir esse produto.
Entretanto, por ser negociado em bolsa, a cota do ETF precisa refletir o valor de mercado dos títulos públicos que compõem o índice que ele segue. Isso significa que, quando o preço das LFTs sobe ou cai, a cota do ETF sobe ou cai junto. É o efeito chamado de marcação a mercado.
Imagine duas pessoas vendendo o mesmo carro. Uma usa o valor de mercado do dia (ETF). A outra, usa uma estimativa contínua, baseada no rendimento esperado (fundo DI). O carro é o mesmo, mas o valor parece oscilar muito mais no primeiro caso. Na hora de resgatar o dinheiro, a diferença pode ser bem maior.
Um ponto importante para levar em conta antes de comprar um ETF: o IR cobrado acompanha o prazo da carteira do fundo, não do tempo da aplicação do investidor. Se a carteira do ETF é composta por títulos com vencimento acima de 720 dias, então a alíquota será de 15%. Se for menor, a alíquota sobe: 20% para títulos que vencem entre 181 e 720 dias e 25% para uma carteira com papéis que vencem em menos de 180 dias.
Tesouro Selic e CDB, na lanterna
Na prática, o rendimento bruto do Tesouro Selic (LFT) e do ETF devem ser muito parecidos. A diferença é que, no caso do título do Tesouro, existe um custo adicional: a custódia da B3, de 0,20% ao ano, cobrada para investimentos acima de R$ 10 mil.
O CDB de liquidez diária apareceu na lanterninha do levantamento, embora não haja cobrança de taxa de custódia e nem tenha come-cotas porque, no fim das contas, ele garante a variação do CDI – e o CDI tende a ficar sempre um pouco abaixo da Selic. Essa diferença pequena de rendimento diário, acumulada por dois anos, pesa mais que a taxa de custódia do Tesouro Selic.
Na simulação, a Selic acumulada no período foi de 27,37%. Já o CDI subiu 26,90%. Isso vira R$ 237 a menos a cada R$ 50 mil investidos. É que a Selic é a taxa definida pelo Copom, e é a referência para as demais taxas da economia. Já o CDI representa o custo médio das operações entre as instituições financeiras. Ele fica muito perto da Selic, mas não é idêntico a ela. Se um CDB emitido pelos bancos paga 100% do CDI, então, ele renderá um pouco menos em relação a produtos que seguem a Selic mais de perto.
A maior vantagem de se aplicar em CDBs de liquidez diária é a garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que só vale para emissões bancárias – o fundo existe justamente para dar uma camada de segurança ao sistema financeiro.
Contas remuneradas
Todas as contas remuneradas que oferecem um retorno de 100% do CDI, no geral, compram CDBs das instituições que as oferecem ou de bancos de primeira linha. É daí que vem o mote de que esses produtos são protegidos pelo FGC. As contas remuneradas podem ter títulos Tesouro Selic na carteira, mas essa parte não envolve o fundo garantidor.
O pulo do gato aqui é a qualidade de crédito dos títulos que estão dentro dessas caixinhas ofertadas ao investidor: quanto maior a remuneração oferecida pela conta, maior é o risco de crédito bancário que está ali dentro.
Em outras palavras: se o rendimento está bem acima do CDI, como alguns produtos oferecem atualmente, é certo que existem CDBs de instituições financeiras de menor porte – que pagam taxas mais altas mas também oferecem maior risco – ali dentro. Para fins de reserva de emergência, não são os produtos mais adequados, justamente porque podem sofrer algum nível de inadimplência ou impacto sistêmico em situações de crise.
Em termos de imposto, não tem segredo nesse caso: seguem a estrutura de um CDB, com tabela regressiva e tributação apenas no resgate.