Hoje, último pregão do ano, o Ibovespa terminou o dia com alta de 0,40%, aos 161.125 pontos.
Um grupo específico foi responsável por estimular – e surfar – o movimento da bolsa este ano: os estrangeiros. No finzinho do ano a entrada de recursos desse grupo até perdeu um pouco de fôlego, com saídas de R$ 390 milhões em dezembro. Mas isso nem de longe arranhou a tendência até aqui: são R$ 27 bilhões injetados nas ações brasileiras.
“Existe uma agenda muito clara de flexibilização monetária lá fora aliada ao enfraquecimento do dólar”, disse o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, em evento da bolsa no mês passado. Traduzindo: com os juros em queda nos EUA, a renda fixa em dólar fica menos atraente e o valor da moeda americana cai. Nisso, aumenta o apetite lá fora por mercados ‘alternativos’, como o nosso é visto pela ótica gringa.
Esse ciclo vai continuar? Bom, em 2024, quando o dólar subiu 27% e a bolsa caiu 10%, boa parte dos analistas acreditava que o movimento rumo ao fundo do poço continuaria em 2025. É a tendência: acreditar que a realidade atual será a do futuro próximo. Não foi.
A ver se a bonança segue em 2026.
Por que o dinheiro veio para cá?
Justiça seja feita, não é só o Brasil que vem se beneficiando dessa procura. Grandes aplicadores globais estão tentando achar papéis mais baratos em relação à bolsa americana em vários mercados emergentes, considerados mais arriscados, mas com um potencial maior de retorno.
Basta olhar para alguns indicadores de mercado para ver isso. O ETF (fundos negociados na bolsa) chamado EEM, ou iShares MSCI Emerging Markets, reúne o desempenho das ações mais importantes de mercados emergentes – e chega ao fim de 2025 com ganho acumulado de 31%. Nada mal.
Tudo isso aconteceu porque os investidores já se preparavam desde o começo do ano para os cortes de juros nos EUA, que começaram em setembro. Se no horizonte já dá para ver que os títulos de renda fixa da maior economia do mundo passariam a pagar menos, o investidor não tinha motivo para esperar. Ele se antecipa e executa a estratégia. Foi o que aconteceu.
E haja bom retorno. Se formos somar a desvalorização do dólar frente ao real com a alta do Ibovespa, temos que o principal índice no mercado brasileiro subiu nada menos do que 50% na moeda americana.
Claro que o investidor brasileiro investe em reais. Mas isso faz diferença, porque representa custo de oportunidade. Quem tirou dinheiro da bolsa brasileira e colocou na bolsa americana, em dólar, perdeu com a alta menor do S&P 500 e com a desvalorização da moeda americana.
E o gringo que sacou de lá e colocou aqui, em reais, ganhou duas vezes: com a alta do Ibovespa e a do real em moeda americana – o que na soma dá aqueles 50%.
Só que, mesmo assim, o Ibovespa ainda está bem longe da máxima em dólar.
Considerando a atual cotação, de R$ 5,49, o atual patamar do índice representa 29,4 mil pontos em dólar. O recorde anterior, de 20 de maio de 2008, foi de 44.500 pontos em dólar. Para quebrar esse recorde em moeda americana, então, o Ibovespa em reais teria de ultrapassar os 244,6 mil pontos. Nesse caso não basta dizer que “ainda falta chão”. Essa simplesmente não é uma realidade vislumbrável por ora.
De volta à bolsa americana para investidores brasileiros. O S&P 500 subiu 17,25% em 2025. Ok. Mas o brasileiro que investiu lá (via IVVB11, por exemplo, o maior ETF do país, e que replica o S&P 500) não viu esse retorno. A queda do dólar puxou para baixo o S&P500 em reais, limitando o ganho a 5,5%.
Vale o mesmo para o bitcoin. A mãe de todas as criptos sobe perto de 2% no ano – mas em dólar, a moeda na qual ele é cotado. Como as notas verder sedem 11%, temos que o bitcoin, em reais, cai 9%.
Ouro, o último refúgio
O desempenho do Ibovespa em 2025 só não foi melhor do que o ouro, que superou a histórica marca dos US$ 4.500 por onça. O ganho no ano foi de 70%. Não deu para fugir do clichê: o ouro brilhou, de fato.
O que pesou a favor do metal foi um combo de fatores: tensões geopolíticas, aumento dos déficits públicos e o risco de inflação reforçaram o papel de ativo de proteção, enquanto compras fortes de bancos centrais ampliaram a demanda. Os BCs de vários lugares encontraram no ouro uma forma de diversificar as reservas para além do dólar, exatamente pela desvalorização que a moeda vem tendo frente a várias divisas globais.
Ao mesmo tempo, a expectativa de cortes de juros nos EUA ajudaram o metal a se tornar mais atraente, já que o ouro não paga juros e costuma se valorizar quando o custo do dinheiro cai e a moeda americana perde força. Mesmo após correções recentes, esse conjunto de fatores sustenta a visão do ouro como porto seguro, com perspectivas ainda positivas para 2026.
E do lado de dentro?
Se os estrangeiros estão comprando ações brasileiras, o mesmo não se pode dizer dos investidores locais. Os grandes aplicadores institucionais locais fizeram compras na bolsa nas últimas semanas, mas retiraram R$ 50 bilhões no ano. É, basicamente, ficar fora da festa.
Tem motivo para isso. A grande questão é que o investidor local ainda tem pouco apelo para apostar na renda variável com um juro básico em 15%, maior nível em quase duas décadas. Se o retorno de um simples CDB ou título público já garante um rendimento tão alto, por que aceitar mais risco nas ações?
Daqui para frente, o que joga a favor do cenário é justamente a expectativa de cortes de juros aqui no Brasil a partir do ano que vem. Discute-se muito quando esses cortes vão começar. Há quem diga que será logo no começo de 2026. E há quem espere mais parte o fim do primeiro trimestre.
Seja como for, a visão geral é de que a Selic será sim menor – o que tende a empurrar dinheiro para as ações, alimentando essa perspectiva que já é positiva para ativos de risco. O boletim Focus, elaborado pelo Banco Central com economistas de mercado, atesta isso: a projeção é de que a taxa básica de juros termine 2026 em 12,25%.
Só que, no meio do caminho, tem uma pedra: as eleições presidenciais. A volatilidade deve crescer substancialmente na bolsa a partir de março, quando as candidaturas começam a ficar mais claras. E aí, cada especulação e pesquisa eleitoral deve balançar os mercados. Mais um motivo para acreditar que o oba-oba com as ações nesse ano e o otimismo com novas altas ano que vem passarão por um teste de fogo.
É para comprar ou não?
Se os juros no Brasil caírem, isso tem efeito direto no custo da dívida das empresas. Significa que os resultados delas, em especial as que são mais expostas à economia doméstica – varejo, consumo e setor imobiliário –, podem apresentar uma melhora acima do esperado pelo mercado. É aí que vem o pulo do gato, porque cada surpresa positiva pode gerar uma nova rodada de valorização nesses papéis.
Na visão do Itaú BBA, os setores financeiro, utilities (energia e saneamento) e construção civil são as grandes jogadas para 2026. No caso do setor financeiro, os balanços devem continuar marcados pelo crescimento das carteiras de crédito e inadimplência controlada, enquanto as empresas de energia e saneamento, consideradas “defensivas” para qualquer portfólio, também contam com expectativa de bons retornos, em especial no segmento de distribuição.
No caso das construtoras, principalmente aquelas com maior exposição a projetos de habitação popular, como Minha Casa, Minha Vida, o período também é bastante favorável pela melhora nas atuais condições de financiamento. É o que vem permitindo que as empresas do setor acelerem nesse momento os planos de expansão.
Os resultados do terceiro trimestre do ano já foram marcados por bons retornos, na visão do banco, o que motivou o avanço de algumas empresas do ponto de vista microeconômico – quer dizer, sem contar a história de fluxos estrangeiros e justificativas macroeconômicas. Sempre que os dados vêm bons a cada divulgação, os investidores costumam revisar para cima as projeções de lucro. É o que faz com que as ações passem a ser vistas como baratas em relação ao que elas deveriam valer.
Quer dizer, motivos para começar 2026 com ações no bolso existe. O que precisa é ter sangue frio o suficiente para enfrentar os solavancos ao longo do próximo ano.