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Apesar de 73 bancos falirem nos EUA nos últimos 10 anos, número não preocupa

Avaliação é de economistas; grande volume de instituições no país justifica o cenário e ponto de atenção é regulação.

Nos últimos 10 anos, 73 bancos faliram nos Estados Unidos, segundo o Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC). Se considerar o período desde a crise de 2008, foram mais de 500 falências. Especialistas consultados pelo InvestNews explicam que os números altos se justificam pelo grande volume de bancos existentes no país, mas que não se trata, necessariamente, de algo preocupante. De acordo com eles, o ponto de atenção fica na necessidade de melhora da regulação bancária.

Somente no ano de 2023, dois bancos faliram no país: Signature Bank e Silicon Valley Bank (SVB). Já nos últimos anos desde a crise de 2008, a maioria das falências aconteceu em de 2010. Confira:

Número elevado de falências de bancos nos EUA

O economista Denis Medina, professor da FAC-SP, explica que o sistema bancário norte-americano têm uma quantidade de bancos muito maior, de mais de 4 mil instituições financeiras. Dessa forma, segundo ele, é natural que existam problemas com uma quantidade maior de bancos ao longo dos anos.

“Se considerar desde 2008, a maior parte das falências se concentraram perto dessa data, em consequência da crise do subprime. Essa quantidade de problemas se refere ao sistema regulatório, agências reguladoras, acompanhamento dos efeitos dos bancos. A forma como é organizado o sistema bancário nos Estados Unidos é diferente”, afirma ele.

“Como os bancos são mais regionais, a regulamentação é feita pela esfera regional”

Denis Medina, professor da FAC-SP

Patricia Andrade de Oliveira e Silva, professora de economia na ESPM e doutora em Desenvolvimento Econômico, defende que o que justifica esse cenário é o fator estrutural de baixa consistente na regulação das operações financeiras pelo mundo, impulsionadas pela globalização dos mercados e a hiperconectividade em redes sociais, elevando o efeito de contágio das crises rapidamente, além do surgimento de mercados bancários de nicho.

Marianna Costa, economista-chefe do TC, relembra que, antes de 2008, existia uma regulação afrouxada para os bancos nos Estados Unidos, que, posteriormente, se tornou mais forte com a criação da Lei Dodd-Frank para regulamentar o mercado de bancos. Porém, de acordo com Costa, de um tempo para cá, essas medidas foram sendo flexibilizadas, principalmente na época de governo de Donald Trump.

“O maior temor é o risco sistêmico que a instituição pode representar. Um banco acabar falindo é o quanto ele representa de risco sistêmico”

Marianna Costa, economista-chefe do TC

Na mesma linha, Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, destaca que, como a economia americana é mais aberta ao “livre mercado”, para os norte-americanos, é comum empresas e bancos abrirem e fecharem, desde que não representam um risco sistêmico para o setor ou para economia. “Então, para eles, faz parte do jogo”.

Por que os Estados Unidos têm muitos bancos?

Medina explica que o número de bancos é elevado nos Estados Unidos pela facilidade de abertura desse tipo de instituição por lá. Além disso, segundo o economista, os clientes também operam muito mais com bancos regionais por estarem mais próximos, entenderem as necessidades dos clientes, funcionando como parceiros de negócios.

Entre as vantagens de se ter uma país com muito bancos, de acordo com o professor da FAC-SP, é a diversificação e diluição do risco, além do fato de grandes bancos serem mais difíceis para operar com pequenas empresas, que precisam de uma flexibilidade maior.

Já entre as desvantagens, o economista aponta a regulação, pois, por serem muito bancos, agentes reguladores não conseguem acompanhar de perto a possibilidade de haver problemas de risco.

Costa ressalta que a presença de bancos regionais, pequenos, é boa para a economia do país, principalmente por serem facilitadores para empresas de pequeno e médio portes, com os bancos sabendo onde estão as companhias atuando, o que acaba trazendo  uma dinâmica um pouco melhor para a economia, fomentando o crescimento. “Talvez seja uma grande diferença da economia norte-americana para o restante do mundo”, acredita a economista.

Taxa de juros elevada pode estimular falências?

Sede do Federal Reserve, em Washington 16/12/2015 REUTERS/Kevin Lamarque

O Federal Reserve (Fed), o  banco central dos Estados Unidos, vem elevando a taxa básica de juros do país para conter o avanço da inflação, que chegou a atingir o maior nível em 40 anos. Esse aperto monetário chegou a ser apontado como a causa das dificuldades dos bancos.

Mas nem todos os especialistas concordam integralmente com essa análise. Para Medina, as falências de bancos nos Estados Unidos podem acontecer em um curto e médio prazo, mas não por causa dos juros, e, sim, principalmente, por pânico.

“O FDIC garante um limite de cobertura. Quem tem recursos acima disso, e se acontecer saques antecipados, os bancos terão que antecipar seus títulos. Com isso, há um deságio, gerando um prejuízo para os bancos. O problema maior está na gestão de risco das instituições financeiras que, se não feita adequadamente, pode precisar antecipar dinheiro, e o volume e a maneira de fazer geram prejuízos”,  afirma Medina.

Já para Silva, as últimas altas consecutivas da taxa básica de juros nos país contribuíram para as crises bancárias recentes e, caso a alta prossiga, é possível que outros bancos apresentem dificuldades, especialmente os que têm operações em setores nichados.

Costa também faz alerta para a taxa de juros elevadas no país. A economista-chefe do TC explica que os Estados Unidos passaram da taxa de juros de uma faixa de zero para perto de 5% ao ano, uma situação desconhecida para o próprio formulador da política monetária do país, fazendo com que o país colhesse os efeitos dessa situação.

Alves alerta que o patamar de juros atuais dos Estados Unidos não será suportado por muito tempo, em especial por empresas altamente endividadas e bancos com alto risco de crédito. Isso porque as dívidas se tornam mais custosas e, em alguns casos, impagáveis, o que obriga os bancos a fecharem ou a pedirem ajuda.

De olho na regulação

Patricia Andrade de Oliveira e Silva explica que o cenário regulatório do sistema financeiro internacional perpassa desde os anos 1970 por uma intensa desregulamentação. Segundo a economista, as tentativas de regulação através dos acordos internacionais de Basiléia (que buscavam, entre outras ações, definir coeficientes de capital em relação ao volume de operações realizadas) não conseguiram conter as diversas crises.

Isso porque tentativas regulatórias, de maneira geral, são vistas pelos envolvidos nos mercados financeiros como intervenções maléficas dos Estados, fazendo com que a maioria seja contrária a essas medidas, em especial nos momentos de alta dos mercados. 

“No entanto, nos momentos de baixa, é esse mesmo Estado, através dos seus bancos centrais, que assume as crises para que elas não gerem uma crise econômica de proporções catastróficas”, diz ela, que é doutora em desenvolvimento econômico.

“Assim, está claro, até o momento, que nos ciclos de alta do sistema financeiro os lucros são privados, mas, nas crises, os prejuízos são socializados, uma vez que os bancos centrais utilizarão os seus Tesouros Nacionais, evidenciando a urgente necessidade de novos marcos regulatórios no sistema financeiro”

Patricia Andrade de Oliveira e Silva, professora de economia na ESPM

Medina, da FAC-SP, explica que o cenário atual de regulação bancária nos Estados Unidos é melhor do que em 2008, auxiliado pela criação da Lei Dodd-Frank. O economista defende, no entanto, que são necessárias melhorias na capacidade dos reguladores do país.

“Não me parece tanto um problema de regulação, mas de acompanhamento dos reguladores. Precisa de braço, mão-de-obra, tecnologia para acompanhar isso mais de perto e entender os riscos. Precisa haver um equilíbrio de regulação e liberdade de operar dos bancos”, diz o professor.

Na mesma linha, Alves defende que a regulação americana poderia, além de um acompanhamento mais de perto, ter leis mais duras, o que poderia ajudar a evitar alguns tipos de condutas nocivas ao sistema financeiro.

Diferenças entre Brasil e Estados Unidos

Silva explica que são muitas as diferenças entre as estruturas econômicas dos Estados Unidos, detentor da moeda de referência internacional, o dólar, e as de um país subdesenvolvido, com uma moeda relativamente desvalorizada, como é o caso do Brasil. 

“Pelo aspecto positivo, a regulação do sistema financeiro brasileiro é centralizada no Banco Central do país, o que diminui as nossas chances de crise sistêmica. O Brasil tem menos bancos também por causa de maior controle via Banco Central, mas, principalmente, por sermos um país estruturalmente subdesenvolvido e que, por isso, atrai menor volume de capital”, diz Silva.

A economista Marianna Costa afirma que o Brasil está à frente dos Estados Unidos no sentido de regulação pelas muitas crises econômicas que já passou. “O nosso sistema financeiro é mais regulamentado e, consequentemente, mais ágil e líquido. Nosso sistema se adaptou às crises que aconteceram”, conclui Costa.

Este conteúdo é de cunho jornalístico e informativo e não deve ser considerado como oferta, recomendação ou orientação de compra ou venda de ativos.

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