A B4, primeira bolsa de crédito de carbono do mundo, prevê fazer um IPO (oferta inicial de ações) na Nasdaq e na B3, disse ao InvestNews Odair Rodrigues, fundador da instituição. O executivo apontou que está no planejamento uma listagem na bolsa americana primeiro e, posteriormente, na brasileira. Não está claro se na B3 será listado ações ou BDRs (recibos de ações).
Em entrevista exclusiva, o executivo da B4 apontou que, em abril de 2024, devem ser feitos os primeiros anúncios sobre a abertura de capital, e entre maio e junho do mesmo ano, a listagem na bolsa dos Estados Unidos.
“O mercado [de carbono] está se fortalecendo. Temos um corpo jurídico forte, estamos fazendo uma custódia muito grande e, querendo ou não, o mercado vai se interessar por isso, vai ser um trabalho orgânico. Mas a gente primeiro precisa se provar, mostrar o case funcionando, antes do IPO.”
Odair Rodrigues, fundador da b4.
Criada em agosto, a bolsa de crédito de carbono (certificados emitidos para uma empresa que reduziu a sua emissão de CO2), tem pretensão de movimentar R$ 12 bilhões em 12 meses, já que a operação envolve não apenas a venda e compra de créditos, mas a custódia e serviços atrelados, a exemplo da fomentação de empresas que medem o mercado de carbono.
“É uma movimentação grande [da B4]. Se temos 1 milhão de empresas no estado de São Paulo, todas vão precisar medir sua pegada de carbono”, acrescentou Rodrigues.
Apenas 8% dos pedidos de listagem foram aprovados
De 16 a 30 de setembro, cerca de 180 empresas do mundo inteiro pediram a listagem de créditos de carbono à B4. Destas, foram analisadas 50, sendo apenas 8% aprovadas (4) para ingressas na bolsa. No entanto, estão ainda em fase de ajustes de processos, já que, segundo o fundador da B4, não estão preparadas para a comercialização dos seus créditos.
“Não listamos se a empresa não estiver 100% alinhada. Não adianta estar com uma parte “ok” e a outra, não. Temos de oferecer ao investidor e para quem vai comprar o crédito um carbono muito bom”.
Odair Rodrigues, fundador da b4.
Segundo o executivo, uma falha muito comum que gerou a desqualificação das listagens é o fato de uma empresa não ter assinado o Pacto Global da ONU ou ter dito que tinha um projeto de sustentabilidade/ESG, quando este não foi comprovado. “Isso não significa que a empresa sairá 100% da nossa lista, mas vamos orientar que ela se comprometa e que assine o pacto”.
Rodrigues apontou que as empresas com pedidos indeferidos ficam numa espécie de “luz amarela” até que se regularizem, já que há casos em que nem no estatuto dessas companhias consta qual compromisso com o Social (da sigla S, de ESG) foi assumido, quando as empresas de capital aberto são obrigadas a declarar.
Outro ponto destacado pelo executivo foi o sistema de governança, já que há casos em que existem dois sócios em uma companhia, mas sem um grupo de conselho, o que dificulta na tomada de decisão em pautas complexas.
Ainda assim, o ponto mais crítico, segundo o fundador da B4, é quando as empresas ainda não mediram sua pegada de carbono (total de emissões de gases de efeito estufa), mas apontam que originam créditos – o que acaba desqualificando a companhia.
Essa medição da pegada de carbono é também o ponto mais sensível, na visão de Rodrigues, no projeto de Lei (PL) que tramita no Senado para tratar da regulamentação do mercado de carbono. Isso porque a metodologia para a medição é diferente para cada segmento do mercado, não sendo o mais indicado fazer um recorte horizontal, como está proposto no texto.
“A medição na frota de carros é diferente dos veículos elétricos, assim como é da indústria de plásticos. O mercado precisa se educar e entender qual é a melhor metodologia para medir sua pegada, e a partir disso, podermos consolidar”, apontou.
Odair Rodrigues, fundador da b4.
As dores da B4
Segundo Rodrigues, depois de três meses em operação, as “dores” vistas neste mercado são exatamente como as imaginadas: falta de preparo, uma vez que ao passar a auditar os créditos de carbono válidos de empresas, foram verificados “problemas” nessa etapa. E isso fez aumentar a régua do compliance e auditoria, para que não fossem listados projetos com “greenwashing” (termo para maquiagem verde nos requisitos ESG).
Após auditorias nas companhias com pedido de listagem, foi constatado que o que muitas empresas diziam ter em crédito de carbono, na verdade, não existia.
Outro problema foi o da oferta de créditos em duplicidade (o que é proibido, já que resulta em usos indevidos de um crédito já debitado), percebido pela rastreabilidade via tecnologia blockchain – cadeia de dados que permite o compartilhamento de informações e bens, evitando a duplicidade dos créditos.
O que faz a bolsa de crédito de carbono
Segundo o CEO da B4, existem bolsas que vendem o título do crédito de carbono (que é o título financeiro), mas não vende o ativo (o crédito real).
“O crédito de carbono às vezes é um passivo, e não um ativo. Quando uma empresa pega uma CPR verde (um papel), registra na B3 e espera que a bolsa capte dinheiro no mercado. Na B4, só listamos o crédito de carbono existente, um ativo em escala. Uma coisa é o ativo listado que tem fluxo em tempo real, e outra coisa é a captação para começar a fazer isso”, apontou.
Diferentemente da B3, em que é necessário ter uma conta em uma corretora para negociar a compra e venda de ativos, a empresa interessada em começar a sua compensação de crédito de carbono pode se cadastrar na plataforma da B4 e criar uma conta para comprar diretamente créditos de carbono.
Para compensar as “pegadas” de forma efetiva, a companhia pode trocar os tokens (dispositivo que funciona como uma chave eletrônica) por um certificado digital armazenado na blockchain (NFT) emitida pela própria B4 que vai garantir que a compensação está sendo de fato realizada.
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