No último dia 13 de junho, de maneira discreta, os irmãos Joesley e Wesley Batista cumpriram um plano arquitetado há pelo menos uma década: listar as ações da JBS nos Estados Unidos. As ações da maior companhia de carnes do mundo estrearam no pregão da Bolsa de Valores de Nova York (NYSE) sem qualquer cerimônia de toque de sino ou roadshow com investidores.

A listagem nos Estados Unidos foi estruturada de forma a aumentar o poder de voto dos irmãos Batista na JBS — reforçando sua posição de controle. E todo esse processo representou um momento simbólico: o retorno definitivo dos irmãos Joesley e Wesley Batista ao centro das decisões da J&F Investimentos, holding que controla a JBS e outros negócios milionários da família Batista.

Em maio, os irmãos já tinham mostrado sua força quando a J&F anunciou que finalmente tinha fechado um acordo com a Paper Excellence pelo controle da produtora de celulose Eldorado Brasil. A disputa societária, de US$ 2,7 bilhões, se arrastava desde 2018.

Essas ações marcam uma mudança na postura dos irmãos, que durante anos evitaram os holofotes após se tornarem protagonistas de um dos maiores escândalos político-empresariais do país.

O escândalo começou com o que ficou conhecido como “Joesley Day” — que foi o dia em que foram divulgadas informações sobre a delação premiada que os irmãos estavam fechando e que envolvia uma série de políticos, incluindo o então presidente Michel Temer. A notícia foi veiculada em 17 de maio de 2017 e, depois de muitas idas e vindas, o acordo de delação premiada dos irmãos foi homologado em 2020. 

No fim, a delação envolveu um pagamento de uma multa de um bilhão de reais e o cumprimento de dez meses de prisão domiciliar. Além disso, em 2023, a Comissão de Valores Mobiliários absolveu os irmãos da acusação de manipulação de mercado por conta dessa crise. 

O movimento de retorno dos irmãos aos negócios começou em 2024, quando os dois reassumiram cadeiras no conselho de administração da JBS e passaram a aparecer com frequência em eventos públicos. Recentemente, Joesley e Wesley também criaram perfis nas redes sociais para se aproximar do público.

A holding J&F e a família Batista

Os negócios dos irmãos Batista cresceu para além da JBS e estão consolidados dentro da J&F. A holding administra oito empresas com presença em mais de 20 países e patrimônio líquido de R$ 55 bilhões. Além da gigante JBS, seu portfólio inclui: Banco Original, PicPay, Canal Rural, Flora Cosméticos, Âmbar Energia, LHG Mining e Fluxus.

A tese da J&F atualmente é encontrar ativos com preços atrativos para reestruturar as operações, reduzir custos, construir marcas fortes e expandir geograficamente. Foi essa estratégia que impulsionou a entrada da holding no setor de mineração em 2022, com a compra de minas da Vale, e no segmento de óleo e gás, com a aquisição da Fluxus em 2023.

A JBS segue como o principal negócio do grupo. Com faturamento de R$ 417 bilhões, a empresa aposta agora em alimentos processados, pescados e produtos de marca própria para reduzir a dependência de commodities. 

No começo do ano, a JBS também comprou 50% da produtora de ovos Mantiqueira por R$ 920 milhões. O movimento reforça a estratégia de diversificação, sem perder de vista sua origem como gigante da proteína animal.

O império da família Batista começou com um açougue fundado em 1953 pelo pai de Joesley e Wesley, José Batista Sobrinho — o Zé Mineiro —, cujas iniciais dão o nome à companhia. O primeiro passo para a expansão foi dado em 1970, quando o Zé conseguiu comprar seu primeiro frigorífico em Goiás. 

Na década de 1980, os três filhos — Júnior, Wesley e Joesley — assumiram diferentes frentes do negócio e iniciaram a diversificação, com a entrada no setor de sabão com a marca Flora.

O grande salto da JBS veio nos anos 1990, com o Plano Real. Enquanto outros frigoríficos exportadores enfrentavam dificuldades, a JBS cresceu vendendo no mercado interno. Com acesso a crédito, a empresa passou a adquirir concorrentes em crise.

Os recursos do BNDES destravaram novas compras por parte da JBS a partir dos anos 2000. Entre 2003 e 2017, a J&F obteve R$ 17,6 bilhões em apoio do banco estatal — R$ 9,5 bilhões em financiamentos e R$ 8,1 bilhões em participações acionárias via BNDESPar. 

De acordo com os depoimentos dos irmãos Batista para a delação premiada, a JBS pagava uma propina equivalente a 4% do valor dos contratos com o BNDES para garantir os empréstimos.

Boa parte dos recursos aportados pelo banco foi utilizada em aquisições internacionais, como a compra da Swift nos Estados Unidos em 2007. Essa aquisição também levou a JBS à Bolsa brasileira no mesmo ano. 

O Zé Mineiro sempre deu liberdade aos três filhos para comandarem a expansão dos negócios. O Júnior saiu de cena em 2013, vendendo suas ações da J&F para concorrer ao governo de Goiás. Sem conseguir se eleger ao cargo, ele montou sua própria holding, a JBJ Investimentos, que também reúne negócios na agropecuária.  

Como Joesley e Wesley comandavam 100% do império da J&F em 2017, muitos apostaram que o grupo seria desmanchado depois do Josley Day.

Na época, de fato, o grupo se desfez de alguns negócios como a Alpargatas — dona da Havaianas — e a Vigor Alimentos. Mas, contrariando as expectativas, a J&F manteve a maior parte de suas empresas e ainda expandiu sua atuação para novos setores

Hoje, a nova fase dos negócios também abriu espaço para a terceira geração da família Batista. Wesley Batista Filho, de 33 anos, é o atual CEO da JBS nos Estados Unidos e tido como favorito à sucessão de Gilberto Tomazoni, primeiro presidente global da empresa fora da família. 

O irmão de Wesley Filho, Henrique, atualmente comanda a operação de salmão da JBS na Austrália. Já Aguinaldo Ramos Filho, sobrinho de Joesley e Wesley, é presidente da holding J&F, enquanto outro sobrinho, José Antônio Batista Costa, lidera o conselho do PicPay.

O InvestNews procurou a J&F Investimentos, mas os sócios não concederam entrevistas.