Negócios
M. Officer põe luz amarela na moda e reforça alerta para o varejo inteiro
Recuperação judicial da marca de calças jeans amplia lista de próximas vítimas.
O pedido de recuperação judicial da M. Officer, tradicional marca de calça jeans nos anos 80 e 90, fez a cor amarela voltar à moda, trazendo os holofotes sobre outras empresas do segmento. Entre elas, as lojas Renner (LREN3) e Marisa (AMAR3), embora a situação das empresas seja diferente.
Porém, as dificuldades das varejistas se espalham por todo o setor, ampliando a lista de próximas vítimas. A que mais chama a atenção do mercado é a antiga Via, que mudou de nome para Grupo Casas Bahia (BHIA3), em meio a um momento financeiro difícil.
De um modo geral, o cenário macroeconômico está complicado para o varejo. “O cenário macro desafiador que se instaurou com a pandemia, como a renda apertada do consumidor, juros altos e taxas recordes de inadimplência, pioraram a situação já bastante difícil para as varejistas que viram suas vendas caírem”, resume a analista da Levante, Caroline Sanchez.
Apesar do fim oficial da pandemia da covid-19 em maio deste ano, as empresas do setor ainda sentem os efeitos do coronavírus na economia. “O varejo está sofrendo uma ressaca, do ponto de vista macro, tanto por causa da inflação dos anos anteriores, que levaram a alta dos juros, o que acabou afetando as empresas do setor nesses últimos trimestres”, acrescenta o analista de investimentos e chefe de análise da Quantzed, Vitorio Galindo.
Além do impacto operacional, com o endividamento das famílias e o menor poder de compra atingindo a demanda, o estrago maior se dá no custo financeiro. Isso porque as varejistas têm elevado endividamento.
“Nesse contexto, quando a maré está baixa é possível saber quem está nadando pelado”
analista da VG Research, Lucas Lima
Assim, as empresas que estavam mais alavancadas e pensando apenas em crescimento ao invés de rentabilidade são as que estão sofrendo mais, sendo que algumas acabaram entrando com pedido de recuperação judicial. Segundo a Serasa Experian, o primeiro semestre deste ano registrou 593 solicitações deste tipo, um salto de 50% em base anual.
Próxima vítima?
No entanto, daqui para frente, o cenário deve ser mais positivo, em meio à perspectiva de redução da taxa Selic e com a inflação mais controlada. Mas isso não significa que o pior para o varejo já passou. “Por enquanto, no curto prazo, a perspectiva continua ruim, a demanda continua fraca e o setor bem desaquecido”, prevê Galindo, da Quantzed.
Assim, empresas mais endividadas e que focam em produtos com tickets mais elevados, em especial de bens duráveis, como o Grupo Casas Bahia e a Magazine Luiza (MGLU3), estão na lista das possíveis próximas vítimas, diante das sucessivas perdas na última linha do balanço.
“O Grupo Casas Bahia (ex-Via) está no radar dos investidores em relação à possibilidade de optar por uma recuperação judicial”, afirma Lima, da VG. No entanto, ele lembra que a empresa anunciou um plano de reestruturação que, se for bem executado, pode eliminar este risco, emenda o analista. O mesmo é válido para a Marisa (AMAR3).
“Vimos ao longo deste ano, empresas que já vinham com uma série de problemas, reestruturando suas operações, como a Marisa e a ex-Via”, lembra Caroline Sanchez, da Levante. Para ele, outro fator que joga contra as varejistas é o forte aumento da concorrência com empresas asiáticas, “que caíram no gosto do consumidor brasileiro”.
Com isso, o cenário tornou-se desafiador para vários segmentos do varejo, como vestuário, eletrodomésticos, móveis e eletroeletrônicos, registrando queda nas vendas. Como resultado, “muitas outras varejistas não listadas em bolsa também fecharam diversas lojas e enxugaram suas operações, buscando reduzir custos”, emenda Sanchez.
Entre os exemplos, estão a Tok&Stok, que avalia possível fusão com a Mobly (MBLY3), e a Saraiva (SLED3), que fechou todas as livrarias e funcionará apenas como site. Já entre as empresas de capital aberto, também chama a atenção o Grupo Pão de Açúcar (PCAR3) que vem acumulando prejuízos, principalmente operacional, e desfazendo-se de patrimônio.
Quem salva?
Diante de tantos possíveis alvos, a pergunta que fica é: quem se salva? Para o BTG Pactual, uma das favoritas do setor é exatamente aquela que não costuma estar entre as “queridas” do mercado. Trata-se da Track&Field (TFCO4), devido à exposição ao varejo de alta renda, além da própria Lojas Renner, que tem uma dinâmica operacional mais favorável para aproveitar a melhor perspectiva macro do Brasil.
Além disso, é preciso estar atento às decisões de negócios das empresas. Afinal, a recuperação judicial não é a única saída. Até porque o principal objetivo dessa medida é possibilitar uma organização e reestruturação sistemática, evitando ações judiciais individuais e a dissolução do patrimônio da empresa.
Portanto, existem alternativas para as varejistas brasileiras. “Para evitar uma RJ, as companhias precisam conseguir passar por uma reestruturação bem sucedida de suas operações e dívidas, voltando a gerar caixa e estabilizando seus negócios”, explica a analista da Levante. No entanto, Sanchez lembra que os resultados de uma reestruturação não são observados da noite para o dia.
Com isso, pode levar ainda mais alguns trimestres para uma retomada do setor, talvez lá para 2025. “Voltar a ter bons resultados, promover uma estrutura de capital adequada, reduzir o endividamento e mantê-lo baixo, preservar o caixa em momentos de bonança, ao invés de sair queimando recursos, fazendo aquisições e alocando mal o capital. Talvez vender ativos e reduzir estoques em um cenário mais desaquecido”, enumera Galindo.
Em outras palavras, é voltar a ter um resultado operacional que sustente o custo financeiro e as despesas da companhia. “Por muito tempo as varejistas brasileiras pensaram apenas em crescimento do GMV (volume bruto de mercadoria) e da base de clientes, abrindo mão totalmente da rentabilidade e geração de caixa. Daqui para frente, é preciso focar em um modelo de negócio mais sustentável, em produtos-chave e que possuem melhores margens”, completa Lima.
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