Consumidores preocupados com as tarifas prometidas pelo presidente-eleito Donald Trump estão estocando mercadorias, trocando de carro e comprando novos eletrodomésticos para se antecipar a possíveis aumentos de preços.
Um quarto dos americanos entrevistados disse que este é um bom momento para grandes compras, pois acreditam que os preços vão subir no ano que vem. Esta proporção de americanos aumentou em relação ao mês anterior – quando 10% dos entrevistados compartilhavam do mesmo sentimento – e é o valor mais alto já registrado, segundo pesquisa mensal de consumidores da Universidade de Michigan. E um terço das duas mil pessoas entrevistadas recentemente pela CreditCards.com afirmou estar comprando mais agora por temer as tarifas.
Alguns economistas alertam que, ao gastar como se a inflação estivesse chegando, as pessoas poderiam forçar um aumento. O índice de preços ao consumidor de bens e serviços cresceu 2,7% ano a ano em novembro, de acordo com o Departamento do Trabalho, ligeiramente superior ao do mês anterior. O impulso se deveu em parte a um aumento nas compras de bens duráveis, que alguns consumidores disseram estar relacionadas às ameaças do presidente eleito Donald Trump de impor tarifas sobre importações de países como Canadá, México e China.
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“As pessoas podem pensar: ‘Bem, eu achava que ia comprar uma TV nos próximos 12 meses. Talvez deva comprá-la nas próximas 12 semanas’”, disse Robert Barbera, diretor do Centro de Economia Financeira da Universidade Johns Hopkins.
Na campanha, Trump propôs tarifas de 10% a 20% sobre todos os produtos importados e 60% sobre as importações chinesas, uma tentativa de estimular a produção doméstica e reduzir o déficit comercial. Após a eleição, ele declarou que imporia uma tarifa de 25% sobre as importações do Canadá e do México e ameaçou 100% sobre os países do Brics — Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Egito, Etiópia e Emirados Árabes Unidos.
Muitos economistas acham que as tarifas, mesmo que ajudem a manufatura, provavelmente levarão ao aumento dos preços.
Para se antecipar a esses aumentos, alguns consumidores estão gastando agora. Gerard Szarek está estocando tantos pacotes de café, garrafas de azeite e toalhas de papel em seu porão quanto possível, em preparação para a posse de Trump.
“Estou acreditando na palavra dele”, disse Szarek, 66 anos, de Cape Cod, em Massachusetts, em referência a Trump e seus planos tarifários. Ele disse que também teme que o plano de deportação de migrantes do futuro presidente possa aumentar os custos trabalhistas e elevar os preços dos produtos domésticos.
Szarek, engenheiro mecânico, está planejando ir todos os fins de semana ao BJ’s Wholesale Club, supermercado de atacado, para encher carrinhos de compras com caixas do café favorito de sua esposa e pacotes de feijão. Contou que, recentemente, pagou US$ 44 mil por um híbrido Toyota RAV4 2023 para substituir o Toyota Highlander 2010 que planejava dirigir “até que as rodas caíssem”. E também gastou US$ 2.300 em uma lavadora e uma secadora de roupa novas para atualizar os aparelhos de décadas que ele temia pudessem parar de funcionar nos próximos quatro anos.
“Já fui escoteiro, e um dos lemas é estar sempre preparado”, disse ele.
Mas, ao antecipar as compras em massa por causa dos temores de inflação, os compradores, incluindo Szarek, podem estar inadvertidamente elevando os preços.
“Se a procura for grande o suficiente e a escassez for grande o suficiente”, as lojas terão que aumentar os preços, disse Harrison Hong, professor de economia da Universidade de Columbia.
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Hong menciona a proibição das exportações de arroz branco não-basmati da Índia em 2007, o que provavelmente causou aumentos de preços para os consumidores dos EUA. Os americanos estocaram sacos de arroz, exacerbando a escassez. Os produtos e as lojas com os níveis mais altos de procura tiveram maiores aumentos de preços alguns meses depois.
Além disso, as expectativas de inflação são importantes para a inflação futura. Portanto, é possível que varejistas e fabricantes estejam se preparando para as tarifas mais altas através do aumento de preços agora, na expectativa de preços de importação mais altos, disse Paul Ashworth, economista-chefe da Capital Economics para a América do Norte.
“A noção de que os preços estão em uma trajetória específica desempenha um papel elementar em sua decisão sobre como aumentar seus preços ou quais são suas demandas salariais”, disse Barbera, da Johns Hopkins.
As famílias americanas estão cheias de produtos importados e não são apenas itens caros. Por exemplo, os EUA importaram US$ 5,77 bilhões em produtos de beleza em 2022, de acordo com o Observatório de Complexidade Econômica.
Em uma recente viagem a Milão, Tia Hrubala carregou sua mala com produtos europeus de cuidados com a pele de marcas como Caudalie, La Roche-Posay e Bioderma, que ela acha que ficarão mais caros sob Trump.
A designer de Nova York, de 25 anos, também gastou US$ 293 recentemente para substituir a bateria do carro porque estava preocupada que os preços subissem caso ela esperasse mais um mês. “Eu não queria correr esse risco”, disse Hrubala.
As empresas nos EUA, que importaram cerca de US$ 3,2 trilhões em mercadorias em 2022, fazem planos para o pior cenário. Algumas estão estocando produtos para se prevenir. Outras pedem aos consumidores que comprem agora antes que os preços subam.
O CEO da Best Buy, Corie Barry, disse em uma coletiva de imprensa em novembro que “a maior parte das tarifas provavelmente será repassada ao consumidor como aumento de preço”. Executivos do Walmart, da Lowe’s e da AutoZone também falaram sobre possíveis aumentos de preços decorrentes das tarifas.
A última vez que os EUA cobraram tarifas de todos os outros países foi em 2018, quando Trump impôs de 20% a 50% sobre todas as máquinas de lavar importadas em resposta a um pedido da Whirlpool, disse Felix Tintelnot, economista da Universidade Duke.
A ação resultou em um aumento geral de 10% nos preços das lavadoras e secadoras, de acordo com um estudo de Tintelnot e outros. Ele acredita que é muito cedo para dizer se os consumidores verão aumentos de preços desta vez, porque isso dependerá da escala, do escopo e da duração da cobrança de tarifas.
“Os detalhes importam”, disse ele.
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Christopher Foote contou que a possibilidade de tarifas o levou a “fazer de tudo” para garantir os produtos que queria. O consultor de software de 35 anos disse que gastou mais de US$ 12 mil em novos dispositivos desde o dia da eleição, incluindo uma bomba de calor Samsung de US$ 8.087, uma televisão LG de US$ 3.214, um receptor de áudio Denon de US$ 1.081 e um aspirador de pó Miele de US$ 509.
Foote disse que se lembra dos preços dos carros em suas concessionárias locais subindo durante o primeiro mandato de Trump, embora a crise na cadeia de suprimentos relacionada à pandemia possa ter influído. Ele espera que o retorno de Trump à Casa Branca tenha um impacto ainda maior nos preços.
“Espero estar errado”, disse Foote, que mora em Vacaville, na Califórnia. “Se eu estiver errado, pelo menos há boas políticas de devolução.”
Christina Liu, criadora de conteúdo em Los Angeles, monta computadores pessoais para jogos e compartilha tutoriais com seus seguidores nas redes sociais. Os chips da CPU do tamanho de uma unha que alimentam seus computadores estão no centro da guerra comercial EUA-China há anos.
Em um esforço para impulsionar a fabricação doméstica dos dispositivos que alimentam a inteligência artificial, o governo Biden disse que dobraria a tarifa sobre os semicondutores da China em 2025, de 25% para 50%. Com esses aumentos a caminho e possíveis tarifas de Trump no horizonte, Liu decidiu que era um bom momento para estocar. Ela gastou mais de US$ 1.600 em novos chips e outros equipamentos de informática recentemente.
A boa notícia, segundo ela, é que um desses chips geralmente dura pelo menos alguns anos para os jogadores.
“Se você for montar um novo PC agora, ele deve durar até o próximo ciclo eleitoral”, afirmou ela.
Escreva para Jasmine Li em [email protected] e Rachel Wolfe em [email protected]
Traduzido do inglês por InvestNews
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