As tarifas impostas pelo presidente Donald Trump estão se espalhando pela economia americana (e mundial), ainda que seus efeitos macroeconômicos demorem a aparecer nas estatísticas nacionais. Um bom estudo de caso é a instituição diária de milhões de pessoas: o café da manhã.

Neste verão, Trump aplicou uma tarifa de 50% sobre o Brasil sob a alegação de que o país estaria processando seu amigo, Jair Bolsonaro. O problema para os americanos é que o Brasil é o maior produtor de café do mundo, e seus grãos estão presentes em mais de um a cada três cafés preparados nos EUA. Em outras palavras: todo consumidor americano de café já está pagando mais — ou pagará em breve — por causa disso.

O preço de uma libra (cerca de 450 gramas) de grãos brasileiros crus subiu de US$ 4,50 para mais de US$ 6, segundo Dan Hunnewell, dono da Coffee Bros., fornecedora especializada de Nova York. Ele tenta manter seus preços estáveis “o máximo possível”, diz. “Vou até absorver parte da diferença.” Mas se as tarifas de 50% sobre o Brasil continuarem, ele prevê aumentar os preços “de forma significativa” ou buscar grãos de outros países — mesmo que isso altere o perfil de sabor.

Os EUA têm poucas regiões adequadas para cultivar café, e a produção local é pequena. Outros países pagam tarifas mais baixas, mas não conseguem competir com a oferta brasileira. E, à medida que cresce a demanda por grãos de origens alternativas, os preços do café não brasileiro também sobem, explica Albert Scalla, vice-presidente sênior da corretora de commodities StoneX.

Daí a apreensão. Keia Booker e seu marido, Martyn Leaper, são donos de uma pequena torrefação em Portland, que também opera duas cafeterias. Eles não são ricos, mas veem o negócio como extensão de seus valores.

Keia criou um esquema de preços em que clientes mais abastados podem pagar voluntariamente mais para subsidiar o café de qualidade para outros. O tamanho reduzido da empresa faz com que a Keia & Martyn’s Coffee compre no mercado à vista, em vez de firmar contratos com importadores — o que a deixa sem proteção contra a volatilidade dos preços e das tarifas.

“Nossos importadores estão falando em aumentos de 10% a 20% nas sacas que estamos comprando agora — mas também dizem que pode chegar a 40% ou 50%, dependendo do café adquirido e das tarifas”, conta Keia. Por causa da instabilidade, os importadores também estão comprando menos no mercado à vista, e “em breve vamos ficar numa sinuca de bico se não houver café extra disponível para adquirir”.

A Keia & Martyn’s Coffee já foi obrigada a aumentar em pelo menos US$ 2 o preço de cada pacote de 12 onças (cerca de 340 g), por causa das tarifas. Alguns clientes passaram a comprar café com menos frequência. O casal também havia planejado contratar um terceiro funcionário, mas a decisão está suspensa até entenderem melhor o impacto no negócio.

“Quem paga essas tarifas somos nós: o consumidor, as cafeterias, as torrefações, os importadores. Elas são, no fim das contas, um imposto”, diz Keia.

A história do café mostra que tarifas, em essência, são uma forma de transferir renda de milhões de pessoas e empresas para o governo americano. Como todo imposto, representam uma receita inesperada para os políticos. No caso do café, nem sequer existe um setor doméstico protegido: trata-se pura e simplesmente de um imposto sobre o consumo dos americanos — um imposto sobre o “homem esquecido” do eleitorado de Trump.

Traduzido do inglês por InvestNews

Presented by