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No divórcio, quem fica com o TikTok? A valiosa disputa na divisão das contas nas redes sociais

Quando os casais que ganham a vida on-line se separam, avaliar o valor futuro das contas das redes e dividi-las de forma justa é uma tarefa árdua

Por Katherine Hamilton The wall street Journal
Publicado em
6 min
traduzido do inglês por investnews

Quando Kat e Mike Stickler decidiram pelo divórcio, seus advogados se depararam com um problema que reflete os tempos atuais.

Entre os maiores ativos do casal estava “MikeAndKat”, canal no TikTok e no YouTube no qual compartilhavam sua vida com cerca de quatro milhões de seguidores. Ninguém sabia como dividir MikeAndKat igualmente entre Mike e Kat. 

“O juiz ficou tipo, ‘Quê?’”, disse Kat no mês passado durante uma entrevista ao podcast da Northwestern Mutual. “É uma coisa totalmente nova.”

As redes sociais pagam as contas de milhões de americanos. Mas ganhar a vida on-line é mais complicado financeiramente do que trabalhar em período integral normal. Os influenciadores precisam de um público para garantir acordos de publicidade, e se mudam o que publicam podem afastar os seguidores. Casais que mostram sua vida amorosa on-line enfrentam uma ameaça existencial aos seus negócios quando se separam.  

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Para os advogados encarregados de determinar um valor em dinheiro para as contas, visando dividi-las de forma justa, a missão é muito mais difícil do que avaliar uma casa ou um carro. A situação pode mudar dependendo de qual deles tem as chaves da conta. Esse foi o argumento de Kat na luta pelo controle do canal no TikTok. 

“Se a conta do TikTok fosse deixada para mim, ela continuaria crescendo; se não, pararia”, afirmou Kat, de 29 anos, na entrevista ao podcast. 

Ela estava certa. 

Kat ficou com o TikTok, mudou o identificador para KatStickler e agora tem quase 10,5 milhões de seguidores. Além disso, tem outros três milhões no Instagram, no YouTube e no Facebook. Os canais, onde publica esquetes se passando por sua mãe e trechos de sua vida cotidiana, renderam a ela o suficiente para comprar um apartamento e investir em pequenas empresas. 

Kat Stickler, criadora de conteúdo
Kat Stickler, criadora de conteúdo (Reprodução)

Mike ficou com a conta do YouTube, que agora está extinta. Ele hoje trabalha em vendas e não quis comentar.

Existem 27 milhões de criadores de conteúdo pagos nos EUA, e 44% deles dizem que as redes sociais são seu trabalho em tempo integral, descobriu a consultoria The Keller Advisory Group. 

O dinheiro não vem de visualizações ou seguidores. As marcas pagam influenciadores para recomendar um produto ou serviço ao seu público. Os anunciantes dos Estados Unidos pagaram aos criadores de conteúdo US$ 26 bilhões em 2023, de acordo com a Statista.

Uma vez que os especialistas em divórcio calculam quanto dinheiro as contas estão arrecadando, o casal pode dividi-lo, ou um parceiro pode ficar com a parte maior e comprar a participação do outro.

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Porém, há um fator complexo no valor de um ativo digital: o potencial de a conta continuar ganhando dinheiro. Ambos os parceiros têm que defender seu papel nesse potencial. Quantas postagens cada um elaborou? Quantas horas passaram editando vídeos? 

“Normalmente, há uma pessoa no relacionamento que é apaixonada por redes sociais, e é ela que conduz os negócios”, diz Cameron Ajdari, que dirige um grupo de gerenciamento de talentos com sua esposa representando alguns dos casais mais seguidos do TikTok. 

Nem sempre está claro quem é essa pessoa quando o divórcio chega. O sucesso nas redes geralmente evolui rapidamente e os casais podem não estar preparados para controlar as finanças e o trabalho.

Reza e Puja Khan dizem que tudo o que fizeram para atrair cerca de cinco milhões de seguidores em canais compartilhados foi um esforço de equipe. Eles começaram a postar sobre a festa de casamento em 2020 e, em poucos meses, Puja conseguiu deixar seu emprego no escritório. Agora, estimam que as redes sociais gerem cerca de US$ 500 mil por ano. 

Quase tudo isso vai para uma conta bancária conjunta. Foi um pouco aflitivo ver sua renda aumentar tão rápido, muito acima do que seus pais ganhavam, dizem Reza, de 28 anos, e Puja, de 27. Eles contrataram um consultor financeiro no início deste ano, mas a ideia de dividir seu império nunca passou pela cabeça de Puja.

“Esta é a primeira vez que pensamos nisso”, diz ela. “Se eu realmente fosse a público com uma divisão hipotética, isso poderia ter seu próprio atrativo.”

A maneira como os influenciadores reconstroem suas marcas após o rompimento pode ajudar ou arruinar carreiras.

Se a pessoa se tornou popular postando memes ou tutoriais de maquiagem, provavelmente não sofrerá muito impacto financeiro com o divórcio. Mas pode haver mais danos se muitos dos vídeos mostrando o tempo passado em família.

“Um deles pode assumir o controle e eles simplesmente mudam sua marca, o que é arriscado”, diz Nina Shayan Depatie, advogada de divórcio em Los Angeles que trabalha com influenciadores. “Quando você faz uma avaliação, precisa considerar isso.”

Ayumi Lashley, de 34 anos, começou a criar vídeos para as redes com o marido em 2017. Eles fizeram disso sua ocupação em tempo integral em 2020 e seus posts pagaram pelo carro e pela casa, diz ela.

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Quando se divorciaram em 2023, ambos tentaram promover seu perfil pessoal, mas sua base de fãs ainda está ligada a um relacionamento inexistente. Ela diz que optou por não compartilhar muito sobre a separação e perdeu alguns milhares de seguidores, enquanto seu ex postou mais sobre o divórcio.

“Muitas pessoas ficaram chateadas comigo por eu não ter tocado no assunto”, diz Lashley. “A carreira dele está indo muito bem e a minha não.”

Muitos criadores de conteúdo não pretendem fazer vídeos diários das roupas que vão usar para sempre, mesmo que não seja o divórcio a encerrar suas carreiras. 

“Eu sempre brinco que somos como jogadores da NFL. Você tem cinco ou dez bons anos, mas uma lesão séria no joelho pode acabar com tudo”, diz Vivian Tu, de 30 anos, que posta sobre orientação financeira para cerca de oito milhões de seguidores. “Você não consegue controlar os algoritmos. Não consegue controlar o que é tendência e o que não é.”

Tu diz que está se preparando para uma vida longe das redes sociais, desenvolvendo outras fontes de renda, incluindo escrever um livro e produzir um podcast. 

Ela também está ciente do que o divórcio pode fazer com seus negócios. Vivian elaborou um acordo pré-nupcial que incluía todas as suas contas nas redes antes de se casar em junho. 

“Minhas redes sociais são meu currículo”, diz Vivian. “Por que eu deixaria qualquer outra pessoa colocar meu trabalho em seu currículo?”

Escreva para Katherine Hamilton em [email protected]

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