É época de mais uma Copa do Mundo e momento em que se faz presente uma das minhas teorias favoritas da economia comportamental. O Mundial é um destes eventos em que fica mais evidente aquilo que pesquisadores nas últimas décadas passaram a chamar de “a maldição do especialista”, quando até os melhores e mais experientes comentaristas esportivos erram feio os prognósticos sobre as seleções favoritas.
Hoje, Brasil, França, Argentina e Inglaterra lideram a lista, com a Seleção Brasileira, com menos desfalques importantes, despontando levemente à frente dos rivais. Não quer dizer que as quatro estarão nas semifinais. Na Rússia, em 2018, Brasil e França também estavam entre as seleções mais prováveis de disputar o título, segundo não só os comentaristas como algoritmos que projetavam o desempenho no mundial segundo o desempenho recente. Mas apenas os franceses, que acabaram campeões, ficaram entre os quatro melhores. Os demais favoritos ficaram pelo caminho.
A razão do erro, obviamente, não é a falta de conhecimento dos especialistas sobre futebol. Uma verdade sobre o esporte é que, ainda que menos do que em outras épocas, segue imprevisível, ainda mais em uma competição de curta duração como a Copa do Mundo. Mas a fria verdade, documentada por vários estudos, é que especialistas erram tanto quanto pessoas comuns. Basta lembrar de economistas tentando prever o PIB ou o dólar, advogados, gestores de fundos e comentaristas esportivos.
No caso destes últimos, um estudo bastante interessante foi feito por um time de 11 pesquisadores de diversas universidades analisando as apostas de 258 especialistas, seja jornalistas, jogadores ou juízes, com os prognósticos de atletas de futebol amadores e torcedores comuns para oito partidas da Eurocopa, o campeonato europeu de seleções.
Em apenas duas partidas os profissionais foram melhores do que os outros grupos, mas com um nível de acerto próximo dos demais. Jogadores amadores acertaram o mesmo número de resultados. Já os torcedores acertaram as quatro partidas restantes.
A razão pode ser buscada no livro “Ruído: uma falha no julgamento humano”, do Nobel de Economia Daniel Kahneman e Cass Sunstein, dois gigantes dos estudos que unem eventos econômicos e comportamento. Muitos de nossos erros, explica a dupla, são resultado de eventos aleatórios, preconceitos ou até do tempo. Se estava chovendo ou fazendo sol no dia pode afetar nossa capacidade de julgamento.
Este ruído mental faz com que, por mais familiarizados no assunto, acabemos não dando a devida atenção a determinado detalhe, que acaba sendo fatal para a previsão. Não quer dizer que todas ou mesmo a maioria das projeções dos comentaristas esportivos, assim como de qualquer especialista, estão erradas. Na real, eles acertam a maior parte delas.
Mas a maldição do especialista existe para lembrar que, mesmo entendendo de um assunto, seguem humanos e, como tais, propensos a decisões irracionais.
*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico. |
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