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Coluna do Samy

A falência da FTX e uma lição sobre a cegueira do mercado

Segundo o último cálculo, Sam Bankman-Fried perdeu quase todos os US$ 17 bilhões que possuía.

Sam Bankman-Fried, cofundador e CEO da FTX, em Hong Kong, China, na terça-feira, 11 de maio de 2021/Crédito: Bloomberg

Com suas bermudas, o cabelo grande e bagunçado e a autoproclamada fortuna de US$ 17 bilhões, Sam Bankman-Fried passou nas últimas duas semanas de um dos principais nomes do mercado de criptoativos a protagonista de uma das falências mais espetaculares dos últimos anos – da FTX, bolsa cripto que ele fundou e da qual foi o CEO até a semana passada.

A empresa foi pega numa crise de liquidez, com a corrida de clientes para sacar o dinheiro depois da descoberta de que transferia fundos secretamente para a Alameda, uma corretora-irmã. Acionistas como Gisele Bündchen, que inclusive era a líder de iniciativas ambientais e sociais da FTX, o piloto Lewis Hamilton e o comediante Larry David, perderam dinheiro. E US$ 1,7 bilhão em fundos de clientes estão desaparecidos.

Bankman-Fried transgrediu várias regras do mercado, mesmo um altamente especulativo e desregulamentado como o de criptomoedas. Está sendo investigado e dificilmente verá sua reputação se recuperar. Mas como sempre acontece nestes casos, a pergunta que fica é: como foi capaz de enganar tanta gente?

A história em vários aspectos lembra o caso de Bernie Madoff, gestor que lesou em US$ 65 bilhões não só investidores comuns como celebridades como o diretor Steven Spielberg, junto com nomes do mercado financeiro, como os bancos HSBC (H1SB34) e Santander (BCSA34), na época do estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos.

Nos dois casos, as pessoas ficaram encantadas com a personalidade dos envolvidos. Bankman-Fried de modo algum parece alguém ganancioso. Além do vestuário despojado, o agora ex-bilionário dirige um carro simples, divide uma casa com dez pessoas, apoia causas libertárias e prometia doar a fortuna, dizendo ter dinheiro demais.

Como apontou o jornal inglês The Guardian, era o típico garoto-prodígio do Vale do Silício: jovem, fissurado em tecnologia, socialmente desajeitado, mas no controle de novidades financeiras que quase ninguém entende direito. Uma imagem que agora parece criada de maneira calculada para ganhar a confiança dos outros, mas que até a semana passada parecia muito mais indicar alguém com talento para o negócio de criptoativos.

Também ajudou o fato dele ser um grande doador do Partido Democrata, mais popular no Vale do Silício, e capaz de atrair políticos como o ex-presidente americano Bill Clinton e o ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair. As amizades na elite política dos Estados Unidos, além do discurso de que estava revolucionando as finanças digitais, fizeram com que tivesse voz em Washington sobre criptomoedas..

Fora que SBF, como o ex-CEO é conhecido, tinha a fama no mercado cripto de resgatar empresas com dificuldade de caixa, ajudando a dar estabilidade ao mercado. Até poucos dias atrás, nada indicava que a FTX não era uma plataforma confiável. E, como se não bastasse, seu dinheiro também estava em jogo e está sendo perdido junto com o dos clientes. Segundo o último cálculo, ele perdeu quase todos os US$ 17 bilhões que possuía.

Ocorre que também é uma empresa com sede nas Bahamas, longe das autoridades americanas, com baixo nível de compliance, atuando em um mercado desregulamentado e, agora se descobre, sem dinheiro para cobrir os clientes. Fatores que muitos ignoraram. O fear of missing out (FOMO), sigla em inglês para o medo de ficar de fora de algo, é um forte fator de adesão a mercados altamente especulativos. Parece ter sido o caso.

Tudo somado levou ao que vem sendo considerada a maior perda da história de uma fortuna pessoal em um dia. Um escândalo espetacular que só foi possível devido a uma espécie de cegueira que figuras como SBF conseguem provocar.

*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico.

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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