O processo brasileiro foi protocolado na 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro em 20 de outubro e inclui a Ambipar Participações e Empreendimentos S.A., a Environmental ESG e mais de 60 controladas no país e no exterior. Já a petição americana envolve apenas a Ambipar Emergency Response, subsidiária sediada nas Ilhas Cayman e registrada no Texas.
Segundo o documento entregue à Justiça, o endividamento total do grupo — considerando todas as obrigações financeiras e operacionais, nacionais e externas — chega a R$ 10,7 bilhões. Desse total, R$ 7,86 bilhões estão sujeitos à recuperação judicial no Brasil, enquanto o restante inclui dívidas com garantias fiduciárias, impostos parcelados, arrendamentos e obrigações de subsidiárias fora do país.
A origem da crise está em contratos de swap cambial firmados com o Deutsche Bank. As operações teriam gerado perdas e cláusulas de vencimento antecipado, que, por sua vez, provocaram pedidos de execução cruzada de dívidas por parte de credores.
A Ambipar alega que a situação se agravou com a renúncia abrupta do CFO João Daniel Piran de Arruda, levando à perda de confiança do mercado e à pressão para pagamento imediato de obrigações. “Os pedidos foram necessários para preservar as atividades empresariais, manter empregos e assegurar tratamento equitativo aos credores”, diz a empresa em fato relevante.
Os primeiros sinais de alerta apareceram ainda no segundo trimestre de 2025, quando a Deloitte, nova auditora da companhia, incluiu uma nota explicativa sobre a composição do caixa de R$ 4,7 bilhões da Ambipar, considerado abundante por grande parte do mercado.
Dos cerca de R$ 5 bilhões em disponibilidades, R$ 2,6 bilhões estavam em caixa ou aplicações de resgate imediato e outros R$ 2,1 bilhões em um fundo de direitos creditórios (FIDC) com prazos de resgate entre 30 e 60 dias.
Mas a suposta abundância de caixa contrastou com o pedido de tutela cautelar de proteção a credores, apresentado no fim de setembro — quase um mês antes da recuperação judicial. Assim que o pedido foi protocolado, a principal dúvida passou a ser por que uma companhia com tamanho volume de recursos buscava proteção na Justiça.
Não está claro, no entanto, onde esses recursos estavam alocados ou se eram de fato líquidos e disponíveis. No dia 12 de outubro, o colunista Lauro Jardim, de O Globo, publicou que cerca de R$ 850 milhões do caixa da Ambipar estariam aplicados em CDBs do Banco Master, instituição que enfrenta uma grave crise de liquidez. A informação acentuou as desconfianças do mercado sobre a real posição de caixa da companhia e o destino dos recursos contabilizados como disponíveis no balanço.
O caso passou a tramitar no Rio de Janeiro, e não em São Paulo, onde está a sede administrativa da Ambipar, porque a companhia alegou que o principal estabelecimento econômico do grupo — em termos de faturamento e contratos — se concentra na capital fluminense.
Segundo o pedido, a Ambipar faturou R$ 303 milhões no Rio, contra R$ 69 milhões em São Paulo e R$ 1,6 milhão em Nova Odessa (SP), onde fica o endereço registrado da holding. O tribunal aceitou a justificativa, mas bancos credores contestaram a competência da Justiça fluminense.
Entre eles, o Bradesco e o BTG Pactual Chile, que apresentaram recursos e embargos de declaração pedindo a transferência do processo. Ambos tiveram os pedidos indeferidos pelo desembargador Mauro Pereira Martins, que manteve a tutela cautelar em vigor e reconheceu o risco de colapso das operações se as dívidas fossem executadas simultaneamente.
O passivo sujeito à recuperação judicial, de R$ 7,86 bilhões, é composto majoritariamente por bonds internacionais, que somam R$ 2,93 bilhões, seguidos por debêntures domésticas, no valor de R$ 1,82 bilhão. Além disso, há R$ 1,61 bilhão em empréstimos bancários e linhas de crédito, R$ 740 milhões em dívidas com fornecedores e prestadores de serviços, e outros R$ 760 milhões relacionados a arrendamentos, contratos operacionais e derivativos, incluindo os swaps que deram origem à crise.
Apesar de o pedido judicial mencionar R$ 2,93 bilhões em bonds, o valor nominal total dessas emissões no mercado internacional é muito maior — US$ 1,065 bilhão (cerca de R$ 6 bilhões) — somando papéis com vencimento em 2027 e 2030. A diferença ocorre porque o processo judicial considera apenas o valor contábil consolidado no Brasil, enquanto o mercado calcula o valor de face global dos títulos emitidos no exterior.
Entre os bancos, o maior credor é o Santander, com R$ 663 milhões em exposição ao grupo. Em seguida aparecem o Banco do Brasil, com R$ 352 milhões; o Banco do Nordeste, com R$ 207 milhões; o Deutsche Bank, com R$ 188 milhões; o Bradesco, com R$ 165 milhões; e o Daycoval, com R$ 109 milhões. Há ainda dívidas com o banco da Scania, no valor de R$ 77 milhões, e com o ABC Brasil, de R$ 56 milhões.
Esses bancos integram o grupo de credores financeiros ao lado de investidores institucionais internacionais, detentores dos bonds emitidos pela Ambipar Lux.
Segundo a empresa, as medidas buscam preservar a operação e permitir uma reorganização ordenada e transparente, sem interrupção dos serviços ambientais prestados a entes públicos e privados.