Nas últimas semanas, houve intensos protestos na França contra as reformas previdenciárias do governo. No dia 24 de março, uma multidão incendiou a fachada da prefeitura de Bordeaux, o que levou o presidente francês, Emmanuel Macron, a adiar a visita de quatro dias do rei britânico Carlos III. A decisão de Macron de aumentar a idade de aposentadoria de 62 para 64 anos causou uma grande insatisfação entre a população.
Os países ricos com estados de bem-estar social enfrentam um grande desafio em relação ao aumento da expectativa de vida e a diminuição da taxa de natalidade. Esses fatores contribuem para o aumento da taxa de dependência dos idosos (proporção de pessoas com 65 anos ou mais para aquelas com idade entre 20 e 64 anos), e deverá aumentar de um em cinco em 1990 para um em dois até 2050. O tempo que as pessoas passam na aposentadoria também tem aumentado significativamente nas últimas décadas.
Em 1970, a expectativa era que os homens se aposentassem aos 66 anos e vivessem mais 12 anos. Já em 2020, a idade de aposentadoria para os homens é de 64 anos, com uma expectativa de vida de 20 anos. Os homens franceses têm uma das aposentadorias mais longas, cerca de 25 anos em média, o dobro da geração anterior. Já os homens mexicanos passam em média 16 anos na aposentadoria, embora a expectativa de vida na aposentadoria tenha dobrado no mesmo período.
Como os governos podem reformar os sistemas previdenciários sem enfrentar protestos? Cerca de 22 países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) usam “mecanismos de ajuste automático”, que vinculam a idade legal de aposentadoria à expectativa de vida ou aos benefícios previdenciários ao tamanho da população ativa. A OCDE recomenda o uso dessas ferramentas para evitar que as pensões afetem negativamente os governos e reduzir o custo político das reformas previdenciárias.
A Grã-Bretanha aumentou a idade de aposentadoria do Estado nos últimos anos com pouca repercussão. Na França, as pensões do Estado representam 60% dos ganhos finais de um indivíduo médio, enquanto na Grã-Bretanha representam apenas 20%, com pensões privadas fornecendo benefícios adicionais. Desde 1940, a idade de aposentadoria do Estado da Grã-Bretanha era de 60 anos para mulheres e 65 anos para homens, mas desde então ambos foram aumentados para 66 anos. Haverá mais dois aumentos, para 67 anos em 2027 e para 68 anos em 2046. A legislação aprovada em 2014 agora exige que o ministro das pensões publique revisões a cada seis anos, com a próxima prevista para maio.
No entanto, mesmo na Grã-Bretanha, nem tudo é fácil. O governo planeja aumentar a idade de aposentadoria para 68 anos mais cedo, mas a expectativa de vida estagnou nos últimos anos, o que pode dificultar isso. A Grã-Bretanha não está sozinha. A legislação em 20 dos 38 países da OCDE exige um aumento na idade de aposentadoria nas próximas décadas; mas a expectativa de vida vacilante pode tornar esses planos muito menos palatáveis.
Diante do desafio demográfico enfrentado por países com sistemas previdenciários insustentáveis, é importante que o Brasil fique atento às mudanças que precisará fazer em seu próprio sistema no futuro. O aumento da expectativa de vida e a diminuição da taxa de natalidade são fatores que, a longo prazo, podem afetar a viabilidade dos sistemas de previdência social, exigindo reformas impopulares para garantir a sustentabilidade financeira. Por isso, é fundamental que o país planeje e implemente medidas para evitar uma crise previdenciária no futuro.
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