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Infiltrado na Limer

O capitalismo não será salvo (nem) pelo ESG

o capitalismo atravessa uma de suas mais profundas crises, segundo o colunista.

Alguns fatos estabelecem limitações aos objetivos do “Capitalismo Consciente”  que, de acordo com entrevista dada à Forbes por Raj Sisodia, fundador  desse  movimento pela transformação do atual modelo, os quatro pilares do capitalismo consciente são: propósito no lugar do lucro como meta principal, cultura de confiança no lugar do medo no mundo corporativo, líderes conscientes que se preocupam com as pessoas e propósitos da organização e, finalmente, os stakeholders, comunidade envolvida no consumo e produção  – em lugar de resultados apenas para acionistas.

Os pilares são desejáveis e celebráveis, mas sob a ótica do materialismo dialético e sua abordagem filosófica que se concentra na análise da realidade social, econômica e histórica a partir de uma perspectiva materialista, algumas contradições podem ser identificadas no chamado “Capitalismo Consciente”, assim como nas suas íntimas relações com as políticas de ESG (ambientais, sociais e de governança). 

Verificamos que a perpetuação das contradições de classe, a partir da visão do materialismo dialético, é inerente ao sistema capitalista e o “Capitalismo Consciente”, muitas vezes não aborda a exploração subjacente e as desigualdades de classe que surgem do próprio sistema. Em muitas situações, as políticas de ESG também falham em se concretizar a partir do reconhecimento efetivo das raízes sistêmicas das desigualdades sociais.

Ambas as abordagens se concentram em melhorias superficiais, como ações de caridade, doações e criação de fundos específicos para sanar mazelas sociais, práticas sustentáveis limitadas ou representação diversificada em níveis hierárquicos. No entanto, a partir do materialismo dialético argumentamos que a mudança real exige uma análise mais profunda das estruturas subjacentes do sistema e das forças econômicas e sociais em jogo e que medidas mais radicais são requeridas no cenário econômico mundial.

Sob o materialismo dialético, o capitalismo é visto como um sistema movido pelo lucro e pela busca de valor para os acionistas. Portanto, a tentativa de incorporar preocupações éticas e sociais pode ser vista como um mecanismo amortecedor das contradições do sistema em vez de resolvê-las.

Além disso, o “Capitalismo Consciente” e as políticas de ESG permitem que as empresas escolham quais questões abordar e como fazê-lo, muitas vezes mantendo o controle sobre a direção das mudanças. Isso pode resultar em ações seletivas que não alcançam as mudanças estruturais necessárias.

O materialismo dialético enfatiza que as mudanças na sociedade são impulsionadas pela base material, incluindo relações de produção e propriedade dos meios de produção. Abordagens centradas em ESG e “Capitalismo Consciente” não abordam adequadamente essas relações e falham em compreender (e sanar) a profunda interconexão entre a economia e a sociedade.

Um dos cenários atuais, o da precarização do trabalho e /ou diminuição e extinção de alguns postos de trabalho evidencia essas falhas e lacunas, pois não estão no escopo desse movimento de transformação. Não há políticas de ESG para quem não consegue se inserir em nenhuma cadeia produtiva por questões estruturais. Com uma indústria moribunda , até a exploração do trabalhador vai a lona, pois em muitos lugares do mundo, em diversos setores, não existe mais trabalho.

O economista Ladislau Dowbor, no livro lançado em 2022, “Resgatar a função social da Economia”, ele afirma: “Na fase anterior, o capitalista, para enriquecer, precisava pelo menos produzir e gerar empregos, e inclusive pagar impostos, o que enriquecia a sociedade. Na fase que se inaugura no final dos anos 1970, o capitalista descobre que os mecanismos financeiros podem garantir enriquecimento com muito menos esforço, e sem tantos constrangimentos. (…)”

O capitalismo segue sendo um sistema em que os interesses dos proprietários dos meios de produção estão em conflito com os interesses dos trabalhadores e de pessoas sem emprego, numa realidade que ainda leva à acumulação de riquezas por uma minoria, enquanto há exploração e desigualdade das maiorias. Como explicar que 26 bilionários possuem maior riqueza que todo o restante da população mundial? 

O cenário em que emerge a ideia de um “capitalismo consciente”, que busca equilibrar lucros com preocupações sociais e ambientais, pode ser visto como um quadro para “lavar a imagem” do sistema, mantendo essencialmente a estrutura de exploração subjacente. Quanto às políticas de ESG, essas não mudam o modo de funcionamento do capitalismo e que este é, inerentemente, orientado para o lucro – por uma questão de sobrevivência material das empresas – mesmo quando o lucro não é apontado como a principal meta destas organizações. 

Algumas propostas de novos modelos incluem economias baseadas em cooperação, propriedade coletiva dos recursos, distribuição mais equitativa da riqueza, ênfase no bem-estar humano e sustentabilidade ambiental. Diferentes teorias e movimentos, como o socialismo, o comunismo e outras formas de economia participativa, têm buscado criar alternativas ao sistema capitalista existente. Porém, a superação do capitalismo é um tópico complexo e amplamente debatido, com diversas perspectivas sobre como isso poderia ser alcançado e quais seriam os impactos sociais, econômicos e políticos de tal mudança.

Para finalizar, Ladislau Dowbor nos permite aprofundar os questionamentos: “Os rumos não são promissores. Tenho chamado isso de impotência institucional. Todos sabemos que temos de mudar, mas muito pouco acontece.

Os computadores das corporações, que definem onde serão aplicadas imensas massas de recursos financeiros, seguem os algoritmos de maximização de retorno no mais curto prazo, enquanto os departamentos de relações públicas lançam declarações sobre a importância de governança ambiental e social (ESG). É um universo de faz de conta”. Logo, as empresas, mesmo ao adotar políticas de ESG e dar publicidade estratégica a essa iniciativa, e buscando alternativas como as estabelecidas pelo “Capitalismo Consciente”, ainda estariam operando dentro de um sistema que visa maximizar os ganhos, muitas vezes à custa da classe trabalhadora e do meio ambiente.

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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