Com uma atuação consagradora na Copa do Catar, Lionel Messi está de volta ao topo do mundo. Não só como campeão, mas com a confirmação – como se ainda faltasse – de que é um dos melhores jogadores da história que o título do mundial costuma trazer. Mas esse caminho, poucos sabem, foi moldado desde muito cedo pela derrocada da economia da Argentina.
Messi nasceu em 1987, ano em que a inflação no país atingiu 2.600%. Cresceu sob um período de breve recuperação da economia, dolarizada pelo governo do presidente Carlos Menem no começo dos anos 90. No entanto, no fim da década a paridade entre dólar e peso colapsou, trazendo a crise de volta. O desemprego bateu os 20%. Para as famílias de classe média, ficou bem mais difícil manter o padrão de vida.
Uma delas, como lembra episódio recente do podcast americano Planet Money, era a de Lionel Messi. Uma das participantes é a jornalista argentina Jasmine Garsd, dois anos mais velha do que o supercraque, lembra do impacto de ser adolescente na Argentina em um momento em que as más notícias econômicas vinham de todo lado. O medo do desemprego e da pobreza era constante, se infiltrando no horizonte os mais jovens.
Com o peso em crise, o governo ficou sem dinheiro para cobrir os programas sociais básicos, como a distribuição de remédios aos mais pobres. O que afetou Messi, que desde os 11 anos precisava tomar hormônios do crescimento por estar abaixo da média em relação aos outros garotos da sua idade.
Os pais dele, uma faxineira e um operário, não tinham como bancar o tratamento caro. Com nova onda de desemprego no país, as fábricas estavam fechando, pressionando ainda mais a família. Como se não bastasse, veio uma das decisões econômicas mais infelizes: o governo argentino impôs um teto aos saques das economias da população. O famoso corralito, até hoje lembrado com desgosto pelos argentinos.
Como é contado na biografia do jogador, a família começou a não ver caminho senão seguir o caminho de muitos argentinos na época, se mudando para o exterior. Calhou que algo mais ocorria. Os grandes clubes europeus iniciavam o movimento de captar futuros craques ainda muito jovens, permitindo que fossem formados com as características do futebol europeu. Hoje é comum, como na venda de Endrick do Palmeiras para o Real Madrid, mas na época o normal era a ida para o exterior só depois de alguns anos de sucesso no país de origem.
E quem mais adequado do que o garoto de apenas 13 anos que, nas categorias de base do Newell ‘s Old Boys, já mostrava um talento exuberante? Messi acabou convidado para terminar sua formação no Barcelona, que se comprometeu a pagar pelo tratamento hormonal que daria alguns centímetros fundamentais para o craque ser o que é hoje em dia.
Contam seus biógrafos que o jovem Messi foi chorando de casa ao aeroporto na despedida de Buenos Aires. Mas a tristeza maior foi dos argentinos. Não pelo pequeno gênio que deixava o país, já que pouca gente reconhecia o talento de Messi então, mas pelas consequências do colapso da economia, em 2001.
Desde então a Argentina não se recuperou daquela crise, com cada governo adicionando mais intervenções equivocadas na economia. Mas ao menos resta o consolo que a tragédia econômica eterna ao menos produziu as condições para que Messi se formasse de maneira mais adequada para deslumbrar o mundo como faz hoje.
*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico. |
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