Premiado com o Nobel de Economia em 2020, o americano Paul Milgrom é uma referência no estudo da teoria geral dos leilões, que mostra como esses processos podem promover mercados competitivos. Seu trabalho formatou a primeira licitação de frequências de celular dos EUA, em 1994. Milgrom mostrou a importância de se estabelecer um preço para cada faixa, o que não era comum. A iniciativa atraiu mais empresas, e o modelo foi replicado em todo o mundo.
Segundo o economista, é muito difícil atrair investidores internacionais para participar de licitações, como tem buscado o governo brasileiro. “Se fazem um compromisso de longo prazo, querem saber qual é o nível de estabilidade do governo, das leis e como será a cobrança de impostos no futuro”, diz Milgrom, que fará uma palestra na Conferência P3C, evento do setor de infraestrutura, focado em PPPs e concessões, a ser realizado na terça e na quarta-feira.
O que faz um leilão ser considerado um sucesso?
O leilão tem sucesso quando é bem adaptado para cada ocasião. Os leilões mais simples são aqueles em que há apenas um item em disputa. Nesses casos, é possível organizar um processo em que as propostas são entregues de antemão, ou optar pelo modelo tradicional ascendente (em que as empresas fazem ofertas na hora). Mas, no caso de leilões do governo, as coisas podem se complicar.
Em que sentido?
Um leilão de compras governamentais atrai diferentes fornecedores de diferentes tamanhos. Ou um vendedor para cada produto diferente. Ou o governo pode ter múltiplos itens à venda, como nos leilões de telecomunicações. A licitação pode estar dividida em diferentes frequências, cobrindo regiões distintas (do país). Em cada caso, é preciso adaptar as regras do leilão ao problema que se busca resolver. Do contrário, o leilão pode fracassar.
No último ano, ocorreram grandes leilões no Brasil. Alguns tiveram pouca concorrência ou nem chegaram a atrair interessados. Por que isso acontece?
Há duas razões. Uma delas é a dificuldade de atrair as empresas qualificadas. Não sei se esse é o caso do Brasil. Tenho pouca familiaridade com esses leilões. O segundo motivo é por uma estratégia das empresas, que podem querer que o leilão fracasse. Por exemplo: o governo pede um preço muito alto para uma frequência de rádio, para ter certeza de que vai arrecadar algum dinheiro. Os compradores podem avaliar que o governo vai ter de vender o espectro de qualquer maneira. Se a primeira tentativa falhar, o governo vai ter de vendê-lo mais barato. Essa pode ser uma estratégia.
Pode ser um problema do formato do leilão?
Sim. O formato pode colocar muitas dificuldades para as empresas darem lances, o que desestimula concorrentes menores. Há inúmeras formas de fazer um leilão fracassar.
O Brasil tem buscado atrair companhias de outros países para os leilões. Como garantir a participação de estrangeiros?
Investidores internacionais estão interessados no pacote completo. Se fazem um compromisso de longo prazo, querem saber qual é o nível de estabilidade do governo, das leis e como será a cobrança de impostos. E é preciso investigar as condições envolvidas. Falando de forma abstrata: se o governo quer privatizar um porto, o potencial comprador precisa saber quais são os contratos de trabalho e as condições das instalações. Ele vai fazer uma projeção da demanda e do tráfego. E vai querer saber sobre as regulamentações.
É um investimento que poucos se dispõem a fazer?
Sim. É preciso fazer um grande esforço para participar de um leilão desses. As empresas não vão fazer isso se não tiverem a expectativa de que vão ser bem tratadas. Não é apenas uma questão do leilão. É um pacote completo. E, mesmo quando há tudo isso, é preciso fazer as empresas tomarem conhecimento do leilão, o que exige ir ao mercado e mostrar o que está sendo planejado.
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