Estados Unidos e China ditam o ritmo dos mercados globais neste mês. A preocupação com o crescimento das duas principais economias abala os ativos de risco, em especial as ações. O Brasil não ficou imune à piora do ambiente internacional, mas o mundo é muito maior e também pode haver um contágio nos negócios locais vindo da Europa.
Os indicadores econômicos recentes sobre a atividade na zona do euro e no Reino Unido pintaram um quadro preocupante sobre o crescimento na região, elevando os riscos de uma possível recessão no velho continente. Ainda mais em um momento em que os bancos centrais europeu (BCE) e da Inglaterra (BoE) não encerraram o ciclo de aperto dos juros.
O problema é que as pressões inflacionárias por lá ainda não acabaram. Ao contrário. O índice dos gerentes de compras (PMI) do setor de serviços na zona do euro mostra que a inflação de serviços segue elevada, devido ao aumento nos custos salariais. Ao mesmo tempo, o setor industrial se contrai já há alguns meses, segundo o PMI da manufatura.
“Isso faz da perspectiva de recessão um risco realista”, resume, em relatório, o economista sênior do ING para a zona do euro, Bert Colijn. Ele lembra que o foco do BCE está no efeito das pressões vindas dos salários sobre a inflação.
“Mesmo com a economia esfriando, o BCE ficará tentado em deixar a porta aberta e promover mais um aumento”
economista sênior do ING para a zona do euro, Bert Colijn
O mesmo se pode dizer em relação ao BC inglês. A diferença, no entanto, é que as últimas rodadas de PMI do Reino Unido são, na visão do ING, “inquestionavelmente más”. “E isso permite ao BoE fazer uma pausa e pensar enquanto se aproxima do fim do ciclo de alta”, comenta, em outro relatório, o economista de mercados desenvolvidos James Smith.
E o Brasil com isso?
Assim, vai se desenhando um cenário em que a inflação e os juros devem permanecer “mais altos por mais tempo” nos dois lados do Atlântico Norte. É justamente essa perspectiva em relação ao Federal Reserve (Fed) que vem promovendo uma forte correção técnica nos preços e ajuste de posições nos ativos globais ao longo de agosto.
Agora, não se pode descartar uma nova rodada de piora, desta vez, puxada pela Europa e com possíveis impactos no Brasil. Porém, diferentemente do que ocorreu com a “catástrofe de inverno” europeu, que representou uma boa oportunidade para empresas brasileiras como a WEG (WEGE3) e a Vale (VALE3), o efeito agora pode ser negativo.
Isso porque a inédita sequência de 13 quedas do Ibovespa neste mês, que entrou para o livro dos recordes da bolsa brasileira, foi um movimento que pode ser explicado justamente pelo cenário no exterior. Tanto que, no período, outros índices acionário, particularmente o S&P 500, também operou em baixa.
“Isto por si só indica que a queda do Ibovespa não é um evento local, mas algo mais amplo”, destaca o chefe de pesquisa da Guide Investimentos, Fernando Siqueira. Para ele, com os investidores assimilando a narrativa de que o mundo não vai crescer o quanto se pensava neste ano, seria “prudente” evitar empresas cíclicas.
Ou seja, neste momento, investir em nomes relacionados ao crescimento econômico global e à demanda por commodities, como Petrobras (PETR3; PETR4) e a própria Vale, pode ser arriscado. O mesmo vale para empresas endividadas, com resultados fracos e/ou revisão nas projeções de lucro para 2023, como Marfrig (MRFG3), Braskem (BRKM5) e Via (VIIA3).
Além das ações
Mas nem tudo está perdido. Não é só porque o mercado de ações acionou o sinal de alerta, diante dos receios com o ritmo de crescimento da economia global e da perspectiva para os principais bancos centrais, que os ativos domésticos deixaram de ser uma boa opção.
“O Brasil continua sendo a boa história do mundo e está se desvinculando desses sinais de desaceleração econômica”, avalia o diretor-gerente de mercados de um banco estrangeiro. Para ele, o arrefecimento da inflação ao consumidor brasileiro e as consequências disso para os cortes na taxa Selic, além do avanço das reformas, constroem uma visão positiva.
“Isso deve ser um catalisador de alívio por aqui”, prevê, acrescentando que o respiro maior deve ser no dólar e nos juros futuros. “Embora os mercados de ações estejam sendo contaminados pela deterioração das taxas dos EUA, se for verdade que o câmbio vai se manter abaixo de R$ 5,00, então o foco agora é em NTNBs”, afirma o profissional.
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