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Economia

Índia gera desafios econômicos ao se tornar a nação mais populosa do mundo

Avaliação é de economistas; veja os principais dados da economia do país que ultrapassou a população da China.

A Índia ultrapassou a China em tamanho populacional no final do mês de abril, se tornando o país mais populoso do mundo, de acordo com projeção da Organização das Nações Unidas (ONU). Para economistas consultados pelo InvestNews, a mudança implica em um maior desafio econômico para a Índia crescer, gerar empregos e reduzir a pobreza.

Segundo projeções da ONU, a Índia, localizada no sul do continente asiático, totaliza, atualmente, 1,428 bilhão de habitantes e a China, 1,425 bilhão. Trata-se da primeira vez em que os chineses não são a nação mais populosa do mundo.

Indianos em Pushkar, na Índia.
Indianos em Pushkar, na Índia. Crédito: Deepak ghoran/Pixabay

De acordo com o economista Vladimir Maciel, e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, essa mudança de posição gera desafios para a Índia.

“O fato da Índia assumir a liderança da população mundial é mais um desafio do que uma vantagem, pois implica a necessidade de incorporar milhões de pessoas ao mercado de trabalho e a reduzir a pobreza, que ainda é elevada, além do Produto Interno Bruto per capita ser baixo”, avalia Maciel.

China x Índia: mudança populacional

A China passa por um processo de  envelhecimento de sua população, em meio à redução do crescimento populacional por causa da política do filho único no país, implementada nos anos 1980 e flexibilizada em 2016. 

A taxa de natalidade da China em 2022 caiu de 7,52 em 2021 para 6,77, de acordo com o Escritório Nacional de Estatísticas da China. O país passa por um encolhimento demográfico. Em 2022, morreram 10,41 milhões de pessoas no país e nasceram 9,56 milhões.

Já a Índia avança em sentido oposto, com uma população mais jovem, se comparada à chinesa, apresentando uma maior taxa de fertilidade anual e um recuo na mortalidade infantil desde os anos 1990. Metade da população do país tem menos de 30 anos.

Compare a seguir a evolução e projeção das populações da Índia e da China, bem como suas respectivas taxas de natalidade e mortalidade, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).

O economista Carlos Honorato, professor da FIA Business School, aponta que o fato mais notável dessa mudança de país mais populoso do mundo é que a Índia está em uma projeção de crescimento da sua população. 

“Ambas cresceram muito, mas, nestes últimos 40 anos, a Índia não teve nenhum processo de restrição de crescimento populacional como teve a China com a política do filho único. Essa mudança é mais numérica”, diz Honorato. 

O economista explica ainda que a Índia e a China, apesar de serem grandes populações, têm características sociológicas e de formação de país completamente diferentes. Honorato destaca que a Índia:

  • É a maior democracia do mundo em termos de pessoas;
  • Foi colônia britânica com forte influência na introdução da língua e de algumas instituições britânicas;
  • Tem um regime secular e histórico de manter as castas, divisões na população muito fortes, muito estratificadas.

“O que se tem percebido na Índia nesses últimos anos é que a casta dominante, dona dos meios de produção e uma elite intelectual e empresarial, tem uma visão de avanço muito desenvolvida, projetando um futuro da Índia glorioso nos próximos anos. Na China, por outro lado, se tem uma ditadura, uma sociedade totalitária que tem um governo central planejador e que, teoricamente, não deveria ter essa diferença social”.

ECONOMISTA CARLOS HONORATO.

Para Honorato, mais do que uma grande população, a Índia tem uma cultura milenar que se ampara em valores, conceitos e crenças que são, às vezes, difíceis de serem entendidas pelos ocidentais. 

“É um país sofrido com conflitos internos e locais e um passado de provações, mas, certamente, tem e terá um espaço fortíssimo no futuro, especialmente em um cenário de mudança geopolítica como vemos hoje e o deslocamento do poder para a Ásia”, diz o economista.

Mudanças econômicas?

Maciel aponta que o avanço populacional da Índia pode chegar a redirecionar investimentos produtivos que seriam destinados à China. 

“No longo prazo, eventualmente, determinados investimentos produtivos que teriam como destino a China podem ser redirecionados à Índia. É por isso que a China está se modernizando e assumindo outro perfil, para atrair investimentos para setores mais dinâmicos e não perder a prioridade perante outros países como Índia e Vietnã”,  destaca Maciel.

Vista de mercado lotado em Délhi, Índia 11/10/2022 REUTERS/Anushree Fadnavis

Honorato, por sua vez, avalia que essa alteração de cenário populacional não traz grandes mudanças para a China, apenas o fato de que seu vizinho também é um gigante. Ele lembra que “a China e a Índia já entraram em guerra, a mais recente em 1962, por questões de fronteira”, mas hoje os dois países “têm mais a ganhar com cooperação do que com conflitos” entre si.

“Ambos os países estão alinhados em uma agenda que se chama Sul-Sul – países emergentes ou em desenvolvimento que têm mudado o eixo geopolítico dos Estados Unidos e Europa para a Ásia e países emergentes, como é o caso dos BRICs”, afirma Honorato.

Comparativo

Compare o desempenho nos últimos dez anos do Produto Interno Bruto (PIB) da Índia e da China, a sétima e a segunda maiores economias do mundo, respectivamente:

Em 2022, o PIB per capta da Índia era de US$ 1.936, segundo o Trading Economics. Já o da China, de US$ 11.188.

A Fitch Ratings estima que a Índia registrará uma das mais altas taxas de expansão do PIB este ano, em 6% no ano fiscal de 2024, que se encerra em março do ano que vem.

“Ainda assim, os ventos contrários da inflação elevada, altas taxas de juros e demanda global moderada, juntamente com o enfraquecimento da demanda reprimida induzida pela pandemia, desacelerarão o crescimento de nossa estimativa de 7% no ano fiscal de 2023, antes de se recuperar para 6,7% no ano fiscal de 2025”, disse a agência em relatório no último dia 8. 

Para Maciel, a Índia tem se tornado um ator cada vez mais relevante na economia mundial, disputando mercados e atração de investimentos privados. Já observando especificamente o bloco dos países emergentes, do qual a Índia faz parte, o professor explica que o destaque é reflexo de peculiaridades como ter maior população, um PIB crescente e bomba atômica.

Mercado de trabalho

Na Índia, embora seja grande a população jovem e qualificada do país, o desemprego é elevado. Em dezembro de 2022, a taxa de desemprego urbana do país era de 10,1%. No entanto, a desocupação tem recuado em 2023 e, em março deste ano, era de 7,8%.

Já na China, ao final de 2022, a taxa de desemprego era de 5,5%. Embora lenta, a recuperação econômica do país após o fim das restrições impostas para o combate à pandemia de covid-19 já começa a se refletir no mercado de trabalho. A taxa de desemprego urbano do China recuou para 5,3% em março de 2023, ficando abaixo dos 5,6% registrados em fevereiro e dos 5,8% de março de 2022.

Compare a evolução da taxa de desemprego dos dois países:

(Não há dados disponíveis para a Índica ates de 2019)

Inflação

Além do desemprego, a inflação segue como uma das principais discussões com a proximidade das eleições gerais da Índia, previstas para maio de 2024. Nesse cenário, Honorato avalia a maior dificuldade do país está em alimentar e tirar milhões de pessoas da situação de extrema pobreza. Na Índia, a inflação encerrou 2022 em 5,5%.

Já na China, a inflação terminou o ano passado em 2%, ficando abaixo do teto de 3% que foi determinado como meta oficial para 2022. Veja a seguir o comparativo da inflação nos dois países:

Taxa de juros

O Banco de Reserva da Índia, depois de uma sequência de aumento da taxa de juros, optou, em abril deste ano, pela manutenção dos juros do país em 6,5% ao ano, diferentemente da maioria das expectativas, que era de alta de 0,25 ponto percentual.

Na China, em abril de 2023, o Banco do Povo da China (PBoC, o BC chinês) também deixou suas principais taxas de juros inalteradas por mais um mês, ou seja, a taxa de juros de referência para empréstimos de 1 ano ficou em 3,65% e a taxa para empréstimos de 5 anos, em 4,30%. Já a taxa de linha de crédito de médio prazo, de um ano, ficou em 2,75%.

Veja a seguir o comparativo das taxas de juros da Índia e da China:

Importações da Índia

Segundo os dados mais recentes, de 2021, China, Emirados Árabes e Estados Unidos foram os principais países de onde a Índia importou, totalizando US$ 87,5 bilhões, US$ 43,1 bilhões e US$ 41,3 bilhões, respectivamente. Confira:

Combustíveis minerais, óleos e produtos de destilação foi a categoria de produtos mais importada pela Índia em 2021, representando 30% do total. Veja:

Compare o desempenho das importações da Índia e da China nos últimos dez anos:

Exportações da Índia

Em relação às exportações, Estados Unidos, Emirados Árabes e China estão entre os principais destinos dos embarques indianos, com US$ 71,5 bilhões, US$ 25,4 e US$ 23 bilhões, respectivamente. Confira:

A categoria combustíveis minerais, óleos e produtos de destilação lidera as exportações da Índia, com 14% do total. Veja:

Compare o desempenho das exportações da Índia e da China nos últimos dez anos:

Em dezembro de 2022, a balança comercial da Índia registrou déficit de US$ 23,76 bilhões, segundo o Trading Economics. Já a da China teve superávit de US$ 77,63 bilhões.

Protagonismo econômico?

Na avaliação de Honorato, ao se falar economicamente de atenção mundial e protagonismo, a Índia ainda não ocupará o mesmo destaque que a China, até pela dificuldade de gerenciar um país democrático, mas sua posição de destino de investimentos é inegável.

“Assim como a China, a Índia é um mercado de bilhões de pessoas e qualquer aumento de renda e consumo criam maiores e grandes oportunidades para quem conseguir entrar nesse mercado. Apesar de incertezas políticas e sociais, o investimento só deve crescer”, estima Honorato.

Já Maciel alerta que a Índia já atrai muitas multinacionais de serviços, mas, para conseguir se valer ainda mais do bônus demográfico, precisará melhorar muito a sua infraestrutura, principalmente de logística, de forma a conseguir, de fato, aumentar a produção, a circulação e a exportação de mercadorias.

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