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Economia

Uso do FGTS Futuro para financiar imóveis divide opiniões sobre impactos para o setor

Medida deve aumentar renda disponível para financiamento e elevar demanda da baixa renda, mas há dúvidas no radar.

Em meio a notícias de que o governo pretende facilitar a compra de imóveis voltados à população de baixa renda por meio do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) Futuro, o impacto da medida para as construtoras voltadas a esse nicho ainda não está claro, segundo especialistas. As principais dúvidas são a magnitude do aumento da renda disponível para financiamento e a movimentação do mercado no que diz respeito à oferta de imóveis. 

Mas essas avaliações ainda esbarram na falta de decisão final sobre a liberação. Isso porque o uso do FGTS Futuro para o financiamento de imóveis da primeira faixa do Minha Casa Minha Vida (MCMV), embora já tenha previsão em lei desde julho de 2023, ainda depende de regulamentação do Conselho Curador do FGTS, segundo o Ministério das Cidades. A Caixa informou ao InvestNews que não irá se manifestar até que isso aconteça.

Prédio do complexo “Minha Casa, Minha Vida”, em Olinda, PE, Brasil 07/05/2010. REUTERS/Bruno Domingos

A expectativa é de que a liberação comece para as famílias com renda de até R$ 2.640, para depois se estender aos beneficiários das demais faixas, até o limite de ganhos mensais de R$ 8 mil do programa. O assunto deve ser discutido pelo Conselho em março, segundo o governo.

O FGTS Futuro foi instituído pelo governo de Jair Bolsonaro em outubro de 2022, mas não entrou em vigor.

Como deve funcionar

A medida permite que o trabalhador com carteira assinada utilize os depósitos que ainda tem a receber em sua conta de FGTS como caução na hora de ter um financiamento imobiliário avaliado pela instituição financeira. Na prática, é como se a renda disponível para o trabalhador pagar o financiamento aumentasse, ampliando o acesso ao crédito. 

“Para exemplificar, uma família com renda de R$ 2.000,00 mensais conta com um depósito mensal de cerca de R$ 160 em sua conta vinculada. Caso essa família aprove junto à instituição financeira um financiamento que comprometa 22% de sua renda mensal (prestação de R$ 440), ela financiaria cerca de R$ 100 mil, considerando a menor taxa de juros oferecida pelo fundo e o prazo máximo de amortização, 420 meses”, explica o Ministério das Cidades.

“Caso essa família opte por utilizar os recursos dos depósitos futuros da sua conta pelo período de 60 meses (5 anos), seu financiamento poderia ser ampliado em cerca de 9%, chegando a cerca de R$ 108 mil.”

Impactos positivos para o setor?

Para Jonata Tribioli, especialista no mercado imobiliário e diretor de operações da Neoin, “certamente  a liberação do FGTS Futuro para financiamento de imóveis terá impacto significativo no mercado imobiliário e nas empresas do setor”, já que “estima-se que a capacidade de pagamento pode ter um aumento de 8%”. 

Na mesma linha, Sidney Lima, analista da Ouro Preto Investimentos, afirma que, “com mais pessoas capazes de financiar a compra de imóveis, é natural que exista um aumento nas vendas, impactando positivamente a demanda por imóveis e consequentemente o caixa das empresas do setor“.

Em meio a essa perspectiva, os olhares otimistas se voltam para as empresas focadas em construção de moradias populares, como comenta Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management. 

“O mercado imobiliário poderia experimentar um aumento na atividade e nos preços dos imóveis. As empresas do setor imobiliário, como construtoras e incorporadoras, poderiam se beneficiar desse aumento na demanda, vendo um aumento nas vendas e nos lucros”.

Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management. 

Mas a avaliação de que o FGTS Futuro deve aquecer o mercado de forma significativa não é unânime. Em uma leitura preliminar, Leandro Petrokas, diretor de research e sócio da Quantzed, se mostra mais cético e aponta dois motivos principais para isso: o tamanho do aumento da renda e a capacidade de oferta do mercado. 

“É uma medida que tende a beneficiar uma parcela significativa de pessoas, mas essa demanda deve ser diluída e rapidamente absorvida pela oferta de imóveis existentes.”

Leandro Petrokas, diretor de research e sócio da Quantzed

Isso significa que “esse aumento da demanda (gerado pelo aumento da renda) é suprido pela oferta atual, quando observamos o número de lançamento de moradias populares, reportado pelas construtoras de imóveis de baixo custo”, complementa o especialista. 

De olho nas empresas

Assim como as primeiras ampliações do MCMV jogaram luz sobre as perspectivas para empresas como MRV (MRVE3), Tenda (TEND3), Cury (CURY3) e Direcional (DIRR3), as especulações sobre o FGTS Futuro também acendem o radar do mercado em relação a possíveis benefícios para essas construtoras. 

“As empresas que atuam nesse segmento poderiam ver um aumento na demanda por seus produtos, impulsionando as vendas e a expansão dos negócios”, acredita Gonçalvez. 

Tribioli complementa que a habitação popular é “a bola da vez” e fala em “maré positiva”. Ele comenta que empresas que atuam neste segmento estão vendo seus lucros aumentarem de forma significativa.

Imóveis do Minha Casa Minha Vida em Santo Amaro da Purificação (BA) (Foto: Joédson Alves/Agência Brasil)
Imóveis do Minha Casa Minha Vida em Santo Amaro da Purificação (BA) (Foto: Joédson Alves/Agência Brasil)

“No ano de 2023, empresas do setor imobiliário tiveram um crescimento de 64% no valor de mercado, puxado pela queda dos juros e a volta do programa habitacional MCMV”, afirma o especialista. 

Petrokas, no entanto, ressalta que “o impacto (do FGTS Futuro no MCMV) nas empresas listadas na bolsa de valores tende a ser muito baixo”. “Eventualmente, pode ser mais relevante em construtoras menores, especialmente aquelas que precisam dos recursos das vendas de um empreendimento para investir no próximo projeto”, explica. 

No caso das construtoras pequenas, qualquer unidade vendida a mais e/ou em prazo mais curto faz diferença no contexto geral da empresa, diz Petrokas. “Isso já não ocorre nas grandes construtoras, por exemplo, que trabalham com VGVs (valor geral de venda) e empreendimentos maiores, e possuem amplo acesso a linhas de crédito, por exemplo, por meio de emissões de debêntures e CRIs”, compara. 

E o consumidor?

Mas, enquanto entre alguns analistas a divergência é no impacto para pequenas construtoras na comparação com as grandes, Marcelo Tapai, especialista em direito imobiliário e sócio da Tapai Advogados, coloca outro elemento na balança: o consumidor. 

“Todo dinheiro investido no mercado imobiliário e para financiamento de imóveis tem como beneficiário direto, além do comprador do imóvel, as incorporadoras e construtoras. Do meu ponto de vista, essa medida visa mais beneficiar as empresas do mercado imobiliário do que os compradores”, diz ele, que vê com preocupação a “alavancagem que os compradores terão”.

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