Finanças

Construtoras: ações em queda, juros em alta e dados fortes; comprar ou vender?

Expectativas para as companhias do setor são positivas, mas papéis não acompanharam o ritmo. O que fazer?

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As construtoras e incorporadoras divulgaram prévias operacionais fortes referentes ao segundo trimestre de 2021. As vendas líquidas da Eztec (EZTC3), que atua no segmento de alta renda, por exemplo, atingiram R$ 285 milhões no período, alta de 132% ante o mesmo intervalo do ano passado. Já a Cury (CURY3), focada na baixa renda, registrou R$ 683 milhões em vendas, avanço de 134% na mesma análise de comparação.

No entanto, os papéis das companhias do setor acumulam fortes perdas em 2021. Analistas ouvidos pelo InvestNews explicam os motivos e apontam se é momento de comprar as ações.

De um lado, as expectativas para os resultados financeiros do segundo trimestre são bem positivas. O BTG Pactual estima aumento de 48% na receita das companhias do segmento de média e alta renda, e de 21% para as demais.

“Depois que as autoridades aliviaram as restrições da covid-19 no final de abril, as empresas conseguiram aumentar os lançamentos e as vendas, alavancando a forte demanda por imóveis”, explicaram Gustavo Cambauva e Elvis Credendio em relatório sobre o setor.

Ações de construtoras no vermelho em 2021

Veja abaixo o desempenho das ações de construção civil no acumulado de 2021*:

EMPRESA Ticker Variação no ano
Cury CURY3 -12,31%
Even EVEN3 -23,07%
MRV MRVE3 -26,14 %
Melnick MELK3 -29,71%
Tenda TEND3 -29,79%
Cyrela CYRE3 -30,87%
Eztec EZTC3 -37,42

*Até o fechamento de 05/08/21

De acordo com Renan Manda, analista do segmento de construção da XP Investimentos, o que tem segurado a boa performance dos papéis é a indefinição sobre o cenário macroeconômico em torno das variantes da covid-19 e a aceleração da vacina.

O momento incerto traz à tona o sentimento de que novas restrições de funcionamento do comércio podem ocorrer, o que levaria ao fechamento de estandes e atrasos nos lançamentos imobiliários, interferindo diretamente nas decisões dos investidores.

“O gestor de investimento se questiona se quer estar exposto às empresas que tenham essa temática cíclica doméstica, ou em companhias que estão ganhando com o alto preço das commodities, por exemplo. Por mais que os números das empresas venham positivos, a temática para o segmento de construção não é muito favorável”, explica. Para efeito de comparação, as ações da produtora de aço Usiminas (USIM5) acumulam ganhos de 46,12% no ano, enquanto EZtec tem desvalorização de 37,42%.

Além disso, o próprio aquecimento do mercado financeiro tem feito com que investidores retirem suas posições dos setores mais sensíveis ao mercado doméstico. “Tem muito IPO (oferta pública de ações) na praça, e, muitas vezes, é necessário vender papéis para comprar outros que estão chegando”, explica Bruno Lima, head de análise de ações do BTG Pactual digital.

Impacto dos juros

Bruno Lima lembra ainda que todos os ativos ligados ao mercado doméstico são mais sensíveis a juros. Na última quarta-feira (4), o Banco Central elevou mais uma vez a Selic, a taxa básica de juros, para 5,25%. O aumento, automaticamente, contribui para elevar a chamada curva de juros (expectativa do mercado sobre o que irá ocorrer com os juros num prazo mais longo). A dinâmica acaba impactando setores como a da construção, que depende de financiamentos para erguer os empreendimentos, por exemplo.

Na prática, o investidor entende que as empresas do segmento podem ser prejudicadas se as taxas aumentarem acima da expectativa, porque podem ter custos maiores para executar seus projetos, além de maior dificuldade para vender seus estoques, diante de um crédito que pode ficar mais caro.

 “Se comparar o preço da ação contra a curva longa de juros, é possível ver a ‘boca de jacaré’, ou seja, o juro subindo e a ação caindo. Todo esse movimento é porque o mercado já está tentando entender qual a trajetória final dos juros”, explica o analista do BTG.

Comprar ou vender?

Para os analistas ouvidos pelo Investnews, o momento é, sim, positivo para comprar ações de empresas do setor de construção, que ainda estejam abaixo de seu preço-justo, ou seja, aquém do potencial que ainda podem atingir.

A XP, por exemplo, estima preço-alvo de R$ 33 por ação da Cyrela, que atualmente está negociada na faixa dos R$ 19. O BTG também projeta preço-alvo de R$ 47 para a EZetec, enquanto o papel é negociado próximo aos R$ 26.   

“Entendemos que existe esse descolamento entre fundamento e preço por conta dessa discussão de juros, mas a expectativa é que as empresas continuem reportando bons resultados ao longo do segundo trimestre. De fato, as companhias reduziram dívidas ao longo dos últimos tempos e estão com o balanço mais sólido do que há dois ou três anos, com capacidade de gerar caixa maior e pagamento de dividendos interessantes”, explica Bruno Lima.

O especialista pondera que o investidor deve se atentar às empresas com o nível de estoque elevado, que terão que ser desovados no segundo semestre, quando historicamente as empresas concentram a maior parte dos lançamentos.

Outro ponto de cautela são as empresas que saíram da recuperação judicial. Ele não citou exemplos, mas esta semana a construtora Viver (VIVR3) anunciou que saiu do processo, após cinco anos, o que levou a um salto de mais de 15% das ações na segunda-feira (2).

“A reestruturação no segmento de construção é demorada, porque as empresas passaram por distratos, precisaram vender estoques a um preço baixo, até recompor sua base de capital, e renegociar dívidas. Várias estão começando a sair dessa trajetória, aproveitando os ventos favoráveis, porém é preciso analisar seus balanços”.

Destaques do setor de construção civil

Entre as empresas chamadas de top picks (as principais escolhas dos analistas por segmento) estão Cury (apontada por XP e BTG), além de Eztec (XP) e Cyrela (BTG).

De acordo com Renan Manda, da XP, a Cury tem alta rentabilidade e menor dificuldade para ganhar market share, principalmente por ser menor em relação a outras companhias do setor.  

Já sobre a Eztec, o especialista enfatizou que a empresa tem um balanço altamente líquido, com mais de R$ 1 bilhão em caixa, “além de ter exposição basicamente na região metropolitana de São Paulo, que é o maior mercado do País e tem de a se recuperar mais rápido”.

O BTG Pactual estima que a EZtec reporte um lucro de R$ 135 milhões no trimestre, um avanço de 99% ante o mesmo intervalo do ano passado.  Já a Cyrella deverá registrar lucro de R$ 250,8 milhões, alta de 270% na análise anual.

Enquanto Cury deve ter ganhos de R$ 70,1 milhões entre abril e junho, avanço de 90% na mesma análise de comparação.

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